2003-07-31
O senhor dr. Pedro Mexia, quanto à Telefonia Sem Fios, parece pouco atinado. Sem querer suscitar picardia ou outra qualquer outra forma de subtil afecto, atrevo-me a apostar dobrado contra singelo em como a Telefonia Sem Fios, em Lisboa - creio que não é necessário utilizar o itálico na expressão «em Lisboa» -, está à direita. É claro que também está à esquerda, mas é para ele. A esquerda é a dele, não é a do espectro hertziano. É, enfim, um problema de coordenadas, não de juízo, nada de grande monta, portanto, que mereça a proposta do divã terapêutico. Segismundo.
A propósito da remessa de um destacamento da GNR para auxiliar no exercício de reordenamento do Iraque, o senhor dr. ministro da Administração Interna disse que "o ideal é chegar lá e ser visto como um amigo (...). Eu quero que eles distingam os portugueses, que se lembrem do Figo, porque gostam de futuebol". Ó homem!, mas se isso é assim mesmo, por qual raio é que insiste em despachar cento e vinte e quatro soldados, vinte blindados IVECO, seis jipes Land Rover e sete pickups Nissan? Não lhe parece estranho? É que, para além da comitiva ser excessiva na dimensão, não consta que na trouxa sigam botas para os homens jogarem futebol. O que eles levam é umas coisas chamadas gê-trinta e seis, para substituir as célebres e vetustas gê-três, indicadas para o tiro ao alvo, não para marcar golos. Nicky Florentino.
Lembro-me daquela cena, horrível, do senhor dr. secretário-geral do PS a exibir o seu miserável telemóvel e a declarar, ipsis verbis, em tom de vítima auto-proposta, "continuarei a falar neste telefone como se ele não estivesse sob escuta, utilizando a minha liberdade de poder exprimir-me com os meus camaradas, a minha família e os meus amigos". Isto passou-se no dia vinte e um de Julho. Mas, antes, no dia vinte e nove de Junho, dizia a mesma personagem pelo seu nokiazeco, "ó pá, não achas melhor ter esta conversa noutro telefone?". Este sinal de fraqueza, em clara contradição com a coragem anteriormente conhecida, terá certamente um efeito negativo sobre a avaliação do senhor dr. secretário-geral do PS que os gentios têm a mania de ensaiar. É que eles, os gentios, gostam de políticos empinados, com bons telemóveis, que não necessitem de recorrer a outros telefones para manter um diálogo sobre o bigode do senhor dr. procurador-geral da República. Quando não é assim e quando não se sabe vigilar o segredo da própria fraqueza, os gentios tornam-se potenciais e incómodos sujeitos de suspeita. O que é meio caminho andado para a desgraça daqueles que são objecto de suspeita. O raio da democracia é isto. Nicky Florentino.
Dia vinte de nove de Junho, pela dezoito horas e trinta e seis minutos, alvo vinte e um mil trezentos e setenta e nove, sessão mil oitocentos e noventa e dois. O senhor dr. secretário-geral do PS para o senhor dr. presidente da bancada parlamentar do PS: "Ó pá!, não achas melhor ter esta conversa noutro telefone?". Vice-versa: "Tá bem! Então liga-me!". E o que era preciso escutar-se, não se escutou. Parece que ninguém sabia qual seria o outro telefone, alguma cabine manhosa, concerteza, sabe-se lá. Nicky Florentino.
Segundo pia fonte, a Congregação da Doutrina e da Fé, da madre e santa Igreja Católica Apostólica Romana, preparou um documento que será apresentado na próxima semana no Vaticano. Entretanto, segundo a dita pia fonte, sabe-se que "esta reflexão prática para políticos católicos e não-católicos e a opinião pública em geral, sugere e solicita formalmente que o reconhecimento jurídico e legal atribuído no mundo a uniões civis e religiosas entre homens e mulheres não possa ser alargado a uniões entre pessoas do mesmo sexo". É, como está bem de ver, enquanto reflexão prática - seja lá isso o que for -, obra de autêntico espírito santo ou de delírio de propriedades semelhantes. Por acaso alguém já se lembrou de esboçar, assim, uma reflexão prática do género, para curas e bispos católicos e não católicos e arraia em geral, a sugerir e a solicitar formalmente a obrigatoriadade do matrimónio desses evangelizadores com meretrizes, a fim de conseguir a redenção da alma das desgraçadas filhas de Maria Madalena? Estes beatos andam a pedi-las, ai andam, andam. O Marquês.
O senhor dr. deputado Manuel Alegre revelou um voluntarismo excessivo ao meter-se a indignado por o senhor subsecretário da Defesa dos EUA, Paul Wolfowitz, ter considerado infeliz a denominação da Guarda Nacional Republicana, por se assemelhar à graça da desmantelada guarda pretoriana do sacana do Saddam. É que o americano tem mesmo razão. E com a vantagem de ter dito o que disse sem sequer conhecer a farda da rapaziada, essa, sim, atentatória da dignidade da GNR e de Portugal. Seja em poesia ou seja em prosa. Nicky Florentino.
A fulgurante imaginação que concebeu o projecto da «bolsa de valores do terrorismo» deve ser laureada com o Nobel da economia do próximo ano, tem que ser. E se os norte-americanos podem desprezar o seu próprio arrojo, os portugueses, esse, não se podem dar ao luxo de os imitar, seria escandaloso. Daí que as instâncias judiciárias portuguesas devam tomar a iniciativa de patrocinar uma bolsa do género, por exemplo, para identificar a próxima vítima de abuso sexual da Casa Pia. Ou, então, numa versão mais soft, para identificar o próximo, notável ou não, suspeito de abuso sexual de menores. Como é óbvio, não vale a utilização, em proveito próprio, de inside information. Isso é batota. Nicky Florentino.
Não se compreende o que levou os senhores d'The Pentagon a retraírem-se relativamente ao projecto de criação de uma «bolsa de valores do terrorismo». A ideia, para além de supimpa, tinha o prodígio de, pelo entretenimento, chocalhar a imaginação dos mansos, convidando-os a antecipar cenários sobre a evolução futura da situação política do extenso rol de Estados párias e maus que complicam o mundo ou a arriscar qual expectavam que fosse o próximo alvo de uma ofensiva terrorista. Concebida sem pecado, esta novel bolsa operaria como um instrumento de registo e recenseamento de devaneios, loucuras e ideias tontas que permitiria aos serviços inteligentes norte-americanos perceber melhor o limite da capacidade de confabulação do mal, despistando-se, assim, antecipadamente, as suas hipóteses de materialização futura. Porém, porque os responsáveis pelo projecto se acobardaram - e nem sequer os casino se revelaram interessados em tal jogo de advinhação -, o futuro do mundo continuará a acontecer surpresa e incerto, um autêntico bazar, mais do que um mercado. Um pasto, claro, para os incivilizados que cavalgam as bestas do apocalipse, bestas que não ruminam, apenas, PUM!, implodem. Temos, portanto, de nos prevenir e, se necessário e à força for, de prevenir os outros, pois eles, os maus, andam aí. Nicky Florentino.
Alguma sucelência, de preferência membro do décimo quinto governo constitucional, é capaz de explicar por qual raio chamam carta de conforto a uma carta de amparo ou engano? E, já agora, por qual raio também insistem em subvencionar publicamente uma oficina de avionetas chamada Indústria Aeronática de Portugal, SA? Não seria preferível criar, de alicerce, uma indústria e um estaleiro de reparação de submarinos?, daqueles cor de icterícia, lindos, que voam e tudo, como na canção. Parece-me bem que sim, mas, enfim... Nicky Florentino.
Gosto de agitações, é uma fraqueza minha. Porém, por infortúnio, não senti puto da suposta movimentação das placas tectónicas de que para aí se fala. Será que alguém sofreu com ela? Confesso alguma curiosidade relativamente ao facto, pois apetece-me fazer sofrer alguém. É só isso. O Marquês.
2003-07-30
Se a noção que tenho do assunto não padece de lapso, o senhor dr. Pedro Mexia quando sintoniza a Telefonia Sem Fios, em Lisboa, fá-lo à direita do espectro do éter. É nessa banda que está domiciliado o corredor da emissão da dita telefonia, precisamente nos oitenta e nove ponto cinco. E não consta que a estereofonia seja suficiente para a arrastar para a esquerda da frequência modelada, pois não? À esquerda estará, sim, se o senhor dr. Pedro Mexia se mexer pelo mapa português além. Por exemplo, se for orientado pelo norte e for pela áum, pouco depois da saída para Aveiras, encontrará a Telefonia Sem Fios mais nítida domiciliada no outro extremo da banda, nos cento e sete ponto quatro. Portanto, em rigor, a Telefonia Sem Fios tanto está à direita quanto está à esquerda. Depende do local onde for sintonizada. É, como está bem de ver, um problema de grau ou latitude. E não de propriedade ou identidade. Tunga! e dito. Nicky Florentino.
Na última etapa do seu périplo por terras beirãs, o senhor dr. primeiro-ministro, com os pés assentes no distrito de Leiria, disse que “faz bem sair das intrigas políticas de Lisboa e falar com o país que trabalha e confia”. Ó homem!, olhe que não, olhe que não. O povo do país que trabalha é aquele menos atreito a confiar em gente como vocelência, vulgo políticos. E olhe também que a intriga não é entretenimento apenas nos corredores e nos sótãos da capital. Também há, e não pouca, intriga sob a sombra dos campanários da província. Se vocelência soubesse os apodos que, não em surdina, lhe reserva o povo do país que trabalha e confia... Ó homem!, os gentios já foram gente de maior vergonha e recato – recorda-se, concereza, da tocaia de apupos e outros mimos que lhe montaram na Covilhã, ou não? Agora no que eles são bons não é a trabalhar ou a confiar. São bons, isso sim, é no exercício do vitupério. Mestres mesmo, os sacanas. Nicky Florentino.
Um dos factos que me anima desmesuradamente é a ingenuidade dessa mole de gentios chamada povo. Julga todos os governos maus e expecta, esperançado, que o próximo seja melhor. Nunca é, pelo menos passado algum tempo. Mas a ilusão persiste, concedendo hipótese ao jogo da perfídia, da adulação e do engano. Nicky Florentino.
2003-07-29
É tão ternurento o afecto que José nutre por Pedro. E como eu o compreendo, o José. Um diabo não pode ser manso. Nem mesmo com aqueles que conseguem o supino feito de saber contar um, dois, três, quatro, cinco. Pois a partir deste limite, porque se acabam os dedos da mão, começa o incomensurável infinito. O Marquês.
2003-07-28
Na Malásia, um juiz de um tribunal islâmico declarou válido um divórcio anunciado por shortmessageservice assim, "se não deixares a casa dos teus pais, considera-te divorciada". Três vezes remetida a mesma prosa e o casamento está derradeiramente fulminado. Ora, isto está mal, muito mal. Pois um dos maiores prazeres em qualquer divórico é a mágoa que se inflinge à outra parte. Por sms - e ao abrigo desta jurisprudência -, como está bem de ver, não se pode gozar essa hipótese. O que, chiça!, começa a perder a piada. É que as instituições são para respeitar. E o divórcio, em dorido modo, também. O Marquês.
Iupi, iupi, lá, lá, lá! No festim do Chão da Lagoa o senhor dr. presidente do governo regional da Madeira sentenciou e prometeu, "acabou a tolerância com aqueles indivíduos que andam lá fora a dizer mal da Madeira. Vão ser castigados". Quero ver. E pago, se necessário for, para o efeito. Parece que o correspondente insular do Público é um dos melhores colocados para merecer o castigo. Então não é que o moçoilo confundiu a Carmen de Bizet com o Bolero de Ravel. Zás!, é de assentar chibata nele, o filisteu. O Marquês.
Segundo o senhor dr. presidente do PSD/M, o também insigne senhor dr. presidente do governo regional da Madeira, Portugal é "o país da Europa em maior percentagem por cabeça de comunistas dentro do aparelho de Estado". Porque esta informação estatística não é plausível, a recomendação aqui lavrada é uma terapia de divã, pois claro. O mistério certamente que se esclarecerá. Todo. Segismundo.
Confidenciou o senhor dr. secretário-geral do PCP, depois do discurso de encerramento da Festa da Alegria, em relação ao sossego do seu partido, "não dou para esse peditório. Não contribuo nem para a especulação nem para a intriga". Que ele não era de dar contributos já se suspeitava. Ele é, isso sim, um dos autores da trama e do drama. Que não lhe roubem, pois, os devidos créditos. Nicky Florentino.
Ainda no discurso que realizou no jantar de comemoração do vigésimo nono aniversário do CDS, um dia já distante sufixado com PP, o senhor dr. presidente de tal causa disse que "o que o país quer de um partido é que seja estável, confiável e previsível". Equívoco, claro está. O país não quer nada, nadinha, pois o país não tem querer. E os portugueses, esses, querem é que um partido seja um partido que exista, portanto, que seja instável, não confiável e imprevisível. Aliás, melhor do que isso só mesmo sopa fria, tipo vichychoisse. Nicky Florentino.
No jantar de celebração do vigésimo nono aniversário do CDS, de há uns tempos para cá com o atrelado PP, o senhor dr. presidente do dito partido disse que as hostes daquela confraria eram actualmente "o penhor e a garantia de estabilidade política em Portugal". Pode ser que sim, mas parece-me que não, parece-me que essa malta é mais a penhora do Estado. E, suspeito, se forem a leilão provavelmente a licitação mais alta a ser dada por eles não dará sequer para pagar o baixar do martelo do mestre da cerimónia. Quanto à garantia, garantia por garantia é preferível uma garantia bancária. As outras raramente vão para além dos doze meses ou, no caso de viaturas, de um determinado número de quilómetros, nunca muitos. Nicky Florentino.
Disse o senhor dr. primeiro-ministro, "não é possível no futuro que as auto-estradas que vamos construir sejam asseguradas neste regime [de portagens virtuais]. Se assim fosse, tínhamos que deixar de construir mais estradas". Mas, ó homem!, quem é que quer mais estradas? Querem-se são auto-estradas, com quatro faixas em cada sentido. Por isso, não tema, insista no futuro na construção de auto-estradas nesse regime de portagem intangível. Passar-se-á bem sem a construção de mais estradas. Para além disso, as auto-estradas como portagem virtual são muito mais amigas da mobilidade, que é o que interessa. Nicky Florentino.
Um engenheiro mecânico cismou um dia mudar os números do boletim do totoloto sobre os quais desenhava um xis, uma cruz. Assim pensou, assim fez. E o resultado foi que conseguiu um prémio de quase quinhentos e cinquenta euros. Não é maquia de desprezar, mesmo para um engenheiro mecânico. Ora, lampeiro, foi ele depositar o respectivo cheque a uma agência do Finibanco. Mas sucedeu que, dias depois, recebeu uma carta registada, emitida pelo seu banco, a informar que o dito cheque havia sido devolvido na compensação em Lisboa, em virtude de a conta bancária da Santa Casa da Misericórida de Lisboa não ter o provimento necessário. É cabala, concerteza, só pode ser. Este país anda a ser tecido com cabalas, pelo que este fenómeno é certamente mais uma. Daí que o melhor, mesmo, seja seguir para bingo. Aí, pelo menos, os prémios são pagos em dinheiro vivo. Nicky Florentino.
2003-07-27
Ela, a menina, a pedido de sua mãe, foi visitar a sua avózinha, acometida de doença leve, segundo o diagnóstico da pessoa com competência mais próxima de clínico que por ali, aldeia, havia perto. Toc, toc, a menina, educada, bateu à porta da casa da sua avózinha. Avisada, porém, entrou sem esperar que lhe franqueassem a porta, pois a velha, em covalescença, estava retida no seu leito de viúva. A menina, entrada, pousou o pequeno cabaz com bolinhos e chá, que trazia de recado, sobre a mesa da sala. E foi no encalce da sua avózinha. Haveria de lhe doer, e doeu, o cerrar das mandíbulas do lobo na sua tenra carne de menina. Por isso, chorou e não pouco. A avózinha, essa, há muito que tinha sido deglutida e digerida pela cânida besta. Restavam apenas os ossos. Como é que o lobo lá entrou, para aquele domícilio, é pormenor que ninguém sabe, embora a estória há muito assim seja contada. O Marquês.
Confessa, hoje, no Público, o senhor dr. presidente da Câmara Municipal Gaia, "em 12 anos de vida pública, já vivi várias vezes o mesmo ciclo: reconhecimento do mérito - sempre baseado em muito trabalho e nos seus frutos; pequeno erro de omissão (verdadeiro ou quase sempre fabricado) -, campanha violenta e orquestrada de descredibilização de imagem e recomeço de um novo longo período de reabilitação, sempre baseado no trabalho e na capacidade de resistência física e psicológica com que Deus me quis generosamente dotar". É tipicamente de ingénuo. Mas quem é que lhe disse que eram o árduo trabalho e a muita paciência de santo que originavam o reconhecimento do seu mérito? Ó homem!, não é nada disso. É a pouca paciência dos outros para acompanhar a sua acçãozinha autárquica é que lhe garante uma imagem simpática. Por isso, ó homem!, não se iluda com essa das cabalas ou do excesso de atenções canalhas à sua pessoa. Tente passar é despercebido. É disso que os gentios gostam, que não os incomodem. E certamente assim também é na banda baixa da foz do Douro. Pelo menos até tudo acabar. É que nada dura para sempre. Menos ainda a paciência ou a generosidade divina. Nicky Florentino.
2003-07-26
Sou O Marquês mas não tenho marquesado, assim como não tenho rei. E o que para aí anda, a brincar a rei, não é posto, é imposto. O que, como faço em relação a qualquer outro, recuso. Do que eu gosto são de dores. Dores sentidas pelos outros. Esse é o meu reino. O Marquês.
Antes profeta do cinismo pagão, desesperado ateu e ter uma filha que ande com o umbigo ao léu do que, em juízo, julgar que a contracultura não é cultura, usar gravata adequada e pregar o cavalheirismo chamando-lhe, à la manière, gentlemanship. Pior do que isso só mesmo um gajo chamar-se, por cristão e abençoado baptismo - pode mesmo ser protestante, não faz muito mal -, John Charles Sword. Não é ser antes de tempo, é ser apenas vítima do irónico destino conservador liberal, como antes se foi leal da esquerda liberal. Aliás, nisto, mais do que ser-se liberal, o importante mesmo é ser-se cata-vento, ir com o tempo, como a sensação superior de que se vai antes dele, embora nem se vá e se esteja apenas out, knock-out. Tudo pormenores que qualquer divã esclarecerá devidamente. Segismundo.
Cabeçalho da entrevista de uma moçoila do espesso Expresso ao senhor Prof. Eng.º José Veiga Simão, "«Este país mais parece uma Junta de Freguesia»". Mas o que o senhor entrevistado disse, segundo a transcrição, foi "«Este país até parece uma Junta de Freguesia»". Seja como for, é bonito o instinto criativo, o arranjo poético da substituição de «mais» por «até». E, para além disso, como em tantas outras coisas da vida, o que conta é a intenção. Segismundo.
Pergunta uma das moçoilas do espesso Expresso, "Ana Gomes é boa política?". Responde o senhor dr. ministro dos Negócios Estrangeiros, "Ana Gomes, como diplomata, era uma militante; e, como militante, não é uma diplomata". Não se sabe bem o que é mais ternurento, se a pergunta, se a resposta. Cá por mim, gosto de ambas. Sobretudo do denodado português em que foram feitas. Nicky Florentino.
Diz o senhor dr. ministro dos Negócios Estrangeiros, "ninguém está nunca definitivamente afastado de lugar nenhum, mas não sei porque se cola o lugar de Londres a Seixas da Costa". É mau, muito mau, quando o maior das diplomacias se mete a poesias ou a lirismos. Dizer "ninguém está nunca definitivamente afastado de lugar nenhum" pode ser bonito, mas não é, concerteza, de homem rijo. E isso das colagens é de deixar para os garotos. Assim como os picotados. Nicky Florentino.
Eita!, eita!, o espesso Expresso estampa na sua capa "Juiz entrega declaração de homossexualidade". E isto é notícia porquê?, ó senhores do código de conduta. Acaso o senhor dr. juiz do Tribunal da Relação de Lisboa entregasse uma declaração de heterossexualidade isso daria notícia de primeira página? Há gente no espesso Expresso, desde o senhor arq.º director até ao resto da cambada de amuenses da redacção, a necessitar de ir ao divã, é o que me parece. Pois talvez que só no recôndito id dessa malta se encontre a explicação para tão sôfrega atenção à declaração do senhor dr. juiz. Segismundo.
Os sofridos, se não sofrem sofridamente, tendem a ser injustos. Raramente estão dispostos, os cobardes onanistas, a deixar que os outros gozem o prazer da dor que lhes dá identidade. Deviam sofrer por isso. Mais, muito mais, ainda mais. O Marquês.
Udai e Qusai, filhos do sacana do Saddam, são os mais recentes mártires da causa perdida da seita mau-mau iraquiana. Ao que parece, foram traiçoeiramente denunciados pelo primo Zaidan. Até aqui está tudo muito bem e claro. Mas por qual raio foram os malogrados manos, já em figura de cadáver, submetidos a uma cirurgia facial, de forma a reconstruir-lhes o rosto? Para ficarem mais bonitinhos na polaroid da morte ou quê? Francamente, honrados seriam os manos maus se, como sugeriu o engenheiro Muhammad de Bagdad, os atrelassem a um veículo e os arrastassem pelas ruas. Isso é que era de esteta!, de verdadeiro artista! E, assim, talvez até o incrédulo barbeiro da capital, chamado Alla Khalifa, pudesse, como Tomé, constatar o facto da morte deles com os seus próprios olhos. Os americanos, porém, só sabem ser filisteus. E o Alla Khalifa vai mesmo ter de satisfazer a sua ânsia de certeza com as medíocres fotografias dos manos mortos posta a circular por aí, pelo mundo. Não há outras mais fashion. Segismundo.
A notícia é fresca. O senhor dr. chefe do Estado-Maior do Exército apresentou a sua demissão ao senhor dr. presidente da República. Razão para o facto, disse, perdeu a confiança no senhor dr. ministro de Estado e da Defesa. Pode parecer estranho, mas é uma benção - tardia, porém benção - perder algo que nunca se deveria ter tido. É quase como uma cura milagrosa, que resgata para a vida julgada já perdida. Ou o livramento de uma praga moderna, como quem bate portas. Leve, levemente. Nicky Florentino.
2003-07-25
Eita! A Charlotte, para além de ter colocado, à direita do seu blog, uma armadilha que remete os mais incautos para este cadafalso de honras, assomou-se a magnânima senhora e pôs-se de bem com o desculpado Carlos. Não é um final feliz, mas é um apeadeiro que serve. Afinal, a consciência existe-lhes, pelo que o divã, por ora, está dispensado. É pena, concedo, mas tanto a Charlotte quanto o Carlos parecem gente com acertado siso. Segismundo.
2003-07-24
Reporto uma estória verídica e breve, com duas personagens apenas, comigo como narrador homodiegético.
Ele, amanhã vou a Lisboa, disse.
Ela, vais?, a que horas?, perguntou.
Ele, em princípio depois de almoço, respondeu.
Ela, olha!, se é assim, se calhar ia contigo, sugeriu.
Ele não reagiu.
Ela, e levas o Golf? ou o outro carro que também tem ar condicionado?, inquiriu.
Ele, não sei ainda, respondeu vago.
Pelo que conheço dele, amanhã ele é rapaz para arrancar para Lisboa ainda antes do almoço. Ou, então, levar um daqueles carros que a incomodam, sem ar condicionado. A escolha está apenas dependente do que ele ajuizar gerar nela maior mágoa e desconforto. Gosto dele, o danado. É simpático. O Marquês.
Se o contingente da GNR que irá para o Iraque, ao contrário do que foi inicialmente equacionado, não vai levar os seus cães, o que é que para lá vai fazer? Pastores, sobejamente credenciados, já por lá há muitos. Nicky Florentino.
O senhor secretário-geral do PS não é mais ou menos do que qualquer ordinário português. Se têm andado a fazer sentinela ao parlapiê que ele debita ao telemóvel, o homem que não exceda o entono, pois o seu telemóvel não passa de um indiferenciado número, alvo vinte e um mil trezentos e setenta e nove. Ou ele julgava que o seu telemóvel era (re)conhecido nos meandros da investigação judicial em curso como o telemóvel do Ferro Rodrigues? Como deve ser triste ter um aparelho assim só tão coisa e tal. Nicky Florentino.
O Emídio do berbequim voltou a fazer das suas na minha rádio, a Telefonia Sem Fios, a tal que se sintoniza aos oitenta e nove ponto cinco, em frequência modelada e estereofonia. Foi-se o Andrade, o Alves e o Teixeira veio o Fragoso. Não sei se é boa troca. E, para todos os efeitos, incomoda-me que mexam no que é meu. Nicky Florentino.
2003-07-23
O vala comum, por simpatia reconhecida para com o nosso mui e sempre leal O Marquês, reconsiderou e voltou a colocar um postigo de acesso a este tugúrio de mal-dizer. Por os danados não serem de graças dar, considerámos e anotámos no esquecimento a descortesia anterior, esperando que, no futuro, não se reeditem aqui razões para retaliação semelhante. Danadamente, Nicky Florentino e Segismundo.
Carlos, simpático, alternativo em si mesmo, convidou a bonita Charlotte a visitar o seu blog. Charlotte assim fez. Apreciou e julgou tímido, que é como quem diz frouxo simpaticamente, o que viu. Tratou de o dizer ao Carlos, por e-mail. Carlos, com pouca cortesia, não cuidou reserva à intimidade da mensagem e apostou no seu blog o juízo de Charlotte. Ela, com razão, detonou de indignação. E disse o que tinha a dizer. Afinal, ela é a bomba ego. Ele é apenas o outro, inteligente. Mas ambos trataram de caracterizar personalidades alheias sem as remeter sequer ao divã. Ora, isso não está correcto. Nem é bonito. Embora, concerteza, O Marquês daqui tenha apreciado. Segismundo.
Confesso, hoje estou com a disposição indiponível para a suposição de sadismos. O que me inquieta. Mas certamente que hoje ainda alguém irá sofrer, apenas para me aplacar a ânsia de gozo por dor alheia. Eu sou assim. O Marquês.
Pode ser apenas preconceito, mas as sentinelas do telefone do senhor Prof. Doutor secretário-geral do PS devem ser umas criaturas muito meditabundas. Ouvir, no mínimo, mil oitocentos e noventa e dois telefonemas, feitos ou recebidos pelo dito, é missão de merecer comenda. É que o homem, como homem de Estado que é, deve ter conversas pouco próprias para serem ouvidas, sei lá. Nicky Florentino.
A prosa é elucidativa, não carece, não, de considerandos mais. Assim, na página vinte e seis da Pública número trezentos e setenta e três, parte do domingueiro Público número quatro mil oitocentos e oitenta e oito, de vinte de Julho de dois mil e três. "Nas últimas eleições legislativas, o PS local organizou um petisco na freguesia de apoio à candidatura socialista. Tio Rui garante lá ter estado, não porque simpatizasse com o partido (que considera dar «demasiada liberdade»), mas porque o jantar era grátis e sempre podia ver os amigos, coisa verdadeiramente excepcional na sua pacata vida. Em matéria política, aliás, o velho pastor prefere o PSD, partido que, segundo ele, conserva mais o respeito. E, de Salazar, guarda a memória de um país ordenado, embora a polícia de então lhe faça franzir as duas rugas que traz na testa". É a isto que se pode chamar povo ilustrado. Nicky Florentino.
2003-07-22
É do normal ser conforme a norma. Pois assim deve ser também o suplício. A dor a inflingir à vítima deve ser gradual, mas sem jamais ultrapassar o limiar em que deixa de ser sentida pela vítima. Por exemplo, uma grosa de chibatadas, seja em nádegas de virgem ou não, deve ser administrada dúzia a dúzia, sendo que, após cada série de doze vergastadas, se deve guardar um minuto de intervalo antes do início de nova sequência. Se a isso, claro está, a paciência e o gozo tomado permitirem. Mas se tal cerimónia e método forem de impressionar, então que os eventuais interessados se dediquem a outra arte. Que experimentem o circo. Ou a política. É normal que assim seja. O Marquês.
Um canadiano, domiciliado na província de Vancouver, é suspeito de ter assassinado entre 15 e 65 mulheres. Chama-se Robert Pickton, é suinicultor e co-proprietário de um bar, com o irmão, o Piggy's Palace, situado junto à sua exploração pecuária, paradeiro de prostitutas e outra escória de semelhante estofo. A reserva da polícia não deixou transparecer grandes evidências sobre o caso, mas é provável que o treino a matar porcos tenha qualificado as competências do presumível homicida. Entretanto, numa província vizinha, em Alberta, foi detido um fulano, pequeno concorrente do tal Robert Pickton, com Robert Poole como nome de baptismo, suspeito de haver assassinado cinco prostitutas. Nada se sabe da sua profissão. Pode ser suinicultor ou não. O Marquês.
Numa iniciativa no mínimo macabra, um conjunto de académicos e de músicos britânicos e norte-americanos - gente de pouca ocupação, portanto - decidiu animar o projecto Iraq Body Count, com o objectivo de permitir que, com rigor, se tome conhecimento de quantos civis pereceram em virtude da ofensiva anglo-americana no Iraque. Não se percebe qual é a utilidade desta empreitada. E, não obstante todo o rigor afirmado, há muitas e fundadas dúvidas. É que, segundo os dados entretanto apurados no âmbito do referido projecto, estima-se que o número real de vítimas civis oscile entre o seis mil e setenta e um e o sete mil setencentos e oitenta. Ora, se isto é que é ser rigoroso, vou ali e já venho. Para além disso, essa de que numa guerra existem vítimas e civis... é mesmo de quem ainda algum dia se vai lembrar de falar em crimes de guerra. Nicky Florentino.
2003-07-21
Homem que é homem de Estado jamais exibe ostensivamente o seu telemóvel aos embaixadores da canalha, chamados jornalistas. Para além de indecoroso, é sinal de chã miséria. Homem que é homem de Estado tem uma telefonista. No mínimo. Nicky Florentino.
Segundo o Diário de Notícias, o senhor secretário de Estado da Administração Local defende uma regionalização tranquila. Ninguém notou ainda. O senhor secretário de Estado, para além de ter andado a congeminar legislação medonha, como essa sobre as grandes áreas metropolitanas, as comunidades urbanas, as comunidades intermuncipais e o raio etcetera que o parta, tem debitado tanto dislate que já justifica o sanitário acto da sua demissão. Obviamente. Nicky Florentino.
Segundo um artigo estampado hoje no Diário de Notícias, o senhor Prof. Doutor João César das Neves entende que "os portugueses só mudam sob pressão. É nos momentos de dificuldade e exigência que os lusitanos se excedem e brilham". Como a prosa do senhor Prof. Doutor não foi excessiva ou brilhante, talvez que ele devesse ser metido dentro de uma panela de pressão. Nessas circunstâncias, certamente lhe brotariam melhores e mais iluminadas prosas. E do caldo sobrante talvez que se pudessem servir algumas sopas grátis aos pobres. Ou aos famintos Nicky Florentino.
Perguntou-me uma afectada personagem, daquelas que se estiram no divã, por que é que o Mancha Negra e os manos Metralhas, no fim, dão-se sempre mal com o rato Mickey, o coronel Cintra, o Morcego Vermelho ou até com o saloio do Ortigão?, as estorietas da Disney onde isso sucede, sempre, não constituem uma dissimulada forma de promover a incompetência permanente de determinados segmentos sociais?, ou é mesmo verdade que ser-se vencido uma vez é ser-se vencido para toda a vida? Já não recordo o que lhe respondi. Lembro-me apenas que, em consequência, o Mandrake ficou com ciúmes do Surfista Prateado, que era amigo do Tarzan, que se tinha suicidado por a Mónica bater no Cebolinha com um coelho de peluche, embora a culpa, toda, fosse do Bolinha, que tinha um clube onde não deixava entrar meninas, e, por isso mesmo, o Batman jamais se conseguiu encontrar com o Hulk, apesar de a namorada do Roger Rabitt poder cantar, em dueto, com o Tom Waits e de ninguém gostar mais do Ruferto do que o Groo. Segismundo.
Está escrito no encarte estúpido considerado no post anterior do Nicky Florentino que "a violência doméstica é crime". Pode ser que seja. Mas será que, por vezes, não é também prazer? O Marquês.
Essa besta chamada Estado padece, entre outros, do vício da intromissão no espaço doméstico. Exemplo flagrante disso mesmo é o estúpido encarte que os senhores do XV Governo constitucional fizerem distribuir com a última edição do espesso Expresso, onde se apregoa e propagandeia a igualdade entre homens e mulheres. Começa assim a prosa, rabiscada pelo senhor dr. ministro da Presidência, ex-boxeur e ex-droga-adicto, "ao contrário do que muitas vezes se afirma, a igualdade entre as mulheres e os homens não é uma questão ultrapassada". Pois não. Por isso, ó homem, cale-se! É que ainda ninguém, com excepção de algumas raras luminárias, havia percebido isso. Nicky Florentino.
Escreveu Ambrose Bierce no dicionário do mestre, "PAIN, n. An uncomfortable frame of mind that may have a physical basis in something that is being done to the body, or may be purely mental, caused by the good fortune of another". Simpatizo com esta definição. Exacta. O Marquês.
O que é a verdade?, a verdade é a aparência de que o erro está ausente. Nicky Florentino.
2003-07-20
A capa do espesso Expresso de hoje é pungente, como quase todas as capas do espesso Expresso. Uma única nota decente, em dez envergonhadas linhas: o que sobra do chassi de carbono de Marcuse foi trasladado de New Haven para um túmulo de honra do cemitério de Dorothennstadt, de Berlim, cidade que o viu vir ao mundo. Vinte e quatro anos após se ter finado, resquiescat in pace. Nicky Florentino.
O sangue preferido não é aquele que se verte voluntariamente, mas aquele outro, escasso, que, sem anunciar martírio, o suplício convida. O Marquês.
2003-07-19
Abrupto de espírito é aquele que à noite se deleita ou embevece com a lua de manga, suspensa, e de manhã, early morning, denuncia com implacável sentido as misérias pequenas que os outros, aqueles que a gravidade obriga ao chão, são e fazem. Segismundo.
2003-07-18
A senhora drª. Inês Serra Lopes, directora desse cadáver adiado alimentado por inocentes eucaliptos chamado O Independente, afirmou que nenhuma pessoa de bem se devia filiar num partido político. Sendo os partidos políticos consabidas escolas e instrumentos de virtude, não se compreende o sentido e o alcance do dito da senhora drª. directora d'O Independente. Aliás, isso nem é muito importante. Importante, importante, assim como agradável, é saber se, em lares alheios, pessoas de bem devem esquecer-se de fotografias de sósias de indiciados de que o papá, por acaso, é advogado de defesa. Concerteza que sim! é, concerteza, a resposta certa. E, por ela, ainda alguém há-de levar a bota Botilde. Nicky Florentino.
O P do Guerra e Pas incomoda-se, e não pouco, por os outros elogiarem os falecidos. Por assim ser, desde já lhe endereço as devidas, merecidas e sentidas condolências. Não vai gostar ou apreciar, eventualmente nem terá razão para isso, mas a mim satisfaz-me. Pouco, mas satisfaz-me. Pois que, no dia em que a criatura se finar, o mais provável é que eu nem tome conhecimento da ocorrência. E, mesmo que tal conhecimento tivesse, plausível também é que nenhum motivo para o elogio fúnebre sentisse. O que não me traz qualquer gozo. Por isso, reitero, desde já os meus mais sinceros pêsames ao fulano. O Marquês.
Quem, superior criatura entre as demais, pretender atenção da grei sem a obrigada contingência de lhe a rogar tem a hipótese de se vitimizar, anunciando os perigos a que está exposto o grupo a que qualquer natureza o faz pertencer. Como a senhora drª. Maria Barroso, pode dizer que querem fazer desaparecer a sua família ou, então, aquele rebanho de fervorosos acólitos que se juntam no templo dos adventistas do sétimo dia todos os domingos, à tarde. E, como o senhor dr. Mário Soares, pode dizer que o querem silenciar, sobretudo se o anúncio for feito em sessão de apresentação ou de lançamento de um opúsculo ou coisa maior de que seja autor. Impressiona. E os gentios são impressionáveis. Ainda que possam não ser confiantes. Nicky Florentino.
2003-07-16
Os lamuriosos não sabem sofrer. Fingem apenas que sabem. Por isso, dispenso-os liminarmente das minhas atenções ou paixões. A dor que me exalta é a que os outros conhecem intimamente. E poder sublimá-la é a única das sensações em que confio. O Marquês.
2003-07-15
Deploro os que se anunciam vigilantes da virtude alheia. Porque das duas uma. Ou isso é sinal de fraqueza transmitida pela ingenuidade. E os ingénuos são um das maiores pragas para qualquer ordem política, no sentido em que têm a consistência incerta da gelatina. Ou é sinal de negação da própria natureza humana, apenas com propósitos demagógicos, típica manha do armar ao pingarelho. Por isso, é confrangedor tomar conhecimento que o senhor Amine Saad, presidente da União para a Mudança, afirmou que não tolerará manigâncias da parte de Kumba Ialá, o presidente da Guiné-Bissau, cujo único defeito é usar aquele ridículo barrete à Saci. Nicky Florentino
Não é no matar, se acto de instante breve, que está o gozo, mas, sim, no suplício duradouro que obriga ainda à vida, canal e condutor de toda a dor. A dor que serve o prazer é a dor que as vítimas sentem. O que quase sempre justifica a demorada atenção que lhes é prestada. O Marquês.
"Amas-me?", perguntou. "Não", foi a resposta. E, mesmo assim, esboçou um sorriso idiota, suportado pela impressão de que aquela resposta não era verdadeira. Mas era. O amor é uma traição que não se sente. O Marquês.
2003-07-14
Ordinariamente a indignação é coisa da miúda gente. Mas, por ocasião esta ou aquela outra, justifica-se que homem que é homem se sinta também indignado e se ponha a conjecturas. Ora, sucedeu comigo. Será que se pode bater com justa causa nos senhores, drs. ou não, vereadores? Interessa-me em particular saber se se pode arrear umas valentes arrochadas no senhor, dr. ou não, vereador que, em doze de Maio último, despachou aquele Alvará de Obras de Construção número duzentos e quarenta e dois? Talvez que eu, assim, fosse capaz de descongestionar esta indignação que me não é nada própria e que nem sequer me assenta bem. Nicky Florentino.
A senhora Filomena Pinto da Costa, ainda esposa do insigne senhor Jorge Nuno que lhe deu o apelido, foi ao divino divã do espesso Expresso. E, da-se!, destilou todos os demónios e dores d'alma que o sujeito lhe causou muito para além do até se dizer chega. Agora, é como se tivesse renascido, é como se tivesse resgatado para vida. E o estigma de no futuro vir a ser (re)conhecida como a ex-mulher do já dito senhor não a deve perturbar muito. Para todos os efeitos, o sempre leal Bobi permaneceu, foi, ao seu lado. E a outra é a outra, coitada, apenas com um cão de imitação, não com o autêntico Bobi, que até tem um boneco no Contra-Informação com nome próprio. Segismundo.
Gosto de vacas, mas não as sei ordenhar. O que não constitui qualquer problema. Há máquinas para o efeito. Segismundo.
2003-07-12
"Estás a sofrer? dói-te?", perguntou o torcionário. A vítima, agonizante, não conseguia responder, por, com o choque, haver cerrado os maxilares e mutilado a língua. O sangue corria infrene da sua boca. O algoz, então, sentou-se calmamente, assentou os cotovelos sobre a mesa, suportou a cabeça nas palmas das mãos e atendeu-o com o olhar. A imagem pareceu-lhe aprazível. Por isso, "gosto do que vejo", disse. Depois furou-lhe as mãos com um berbequim, para que, em mais algum pormenor, o supliciado se parecesse com Cristo. Chamava-se Jesus. E vertia sangue das chagas. O Marquês.
2003-07-10
Sou de inquebrantável fleuma. Não de celeuma. Ou raiva. E porque a quota de atenção se esgota neste instante - em virtude de a avença não dar para mais -, reitero nesta derradeira oportunidade, à criatura com residência na vala comum de uma só desalma, a disponibilidade do sofá analítico para fins terapêuticos. Senão lhe for de agrado, que se guarde no seu confortável desgosto. Pode ser que a cisma e o fraco paladar para as coisas da música em concerto ainda lhe valham franquia no acesso aos etéreos reinos reservados aos boaventuras.
Entretanto, outros atormentados de espírito, sei lá se com mais atinada competência estética, me ocuparão os trabalhos e as atenções. Segismundo.
A autoridade da república impõe-se pelo temor, não pela complacência. Por isso, aqui, regista-se a informação de alguns postos de vigilância do tráfego motorizado em Portugal.
A GNR adquiriu viatura novas, insistindo nos Subaru Impreza WRX. Os oito novos carros da GNR para controlar a velocidade na auto-estrada têm as seguintes matrículas: 01 - 63 – RZ; 01 - 64 - RZ; 01 - 65 - RZ; 01 - 66 - RZ; 01 - 67 - RZ; 01 - 68 - RZ; 01 - 69 - RZ; 01 - 70 - RZ. Claro está que os BMW 330d, com matrícula PE, continuam a oferecer suporte móvel a radares da GNR.
Outra informação relevante e a saber é que foram recentemente instalados ao longo do percurso da A1 radares electrónicos fixos para controlo da velocidade, com capacidade de registo em polaroid dos veículos cujos a pressa dos respectivos condutores ultrapasse os cento e quarenta quilómentos por hora. As localizações de tais equipamentos são as seguintes: entre o quilómetro zero vírgula cinco e o quilómetro dez, em ambos os sentidos; entre o quilómetro quarenta e cinco e o quilómetro cinquenta, em ambos os sentidos; entre o quilómetro oitenta e cinco e o quilómetro noventa e cinco, no sentido sul-norte; entre o quilómetro cento e vinte e o quilómetro cento e trinta, em ambos os sentidos; entre o quilómetro duzentos e quarenta e cinco e o quilómetro duzentos e cinquenta, em ambos os sentidos; entre o quilómetro duzentos e oitenta e o quilómetro duzentos e oitenta e sete, em ambos os sentidos.
Com a lavragem deste elenco de novidades, espera-se também que se tenham tornado mais transparentes o património e os activos da república. Que é de todos nós. Por todos nós a sermos. Nicky Florentino.
Tempos houve em que se dizia dare nemo potest quod non habet neque plus quam habet. Com o juízo, estético mas não só, é exactamente e também assim, mesmo para quem, cadáver ressuscitado concerteza, vê o mundo de uma valeta comunitária e utiliza o primeiro volume do dicionário da Academia das Ciências de Lisboa. Por muito que muitos insistam que de gustibus non dispuntandum est, insisto no divã. Alguma coisa, aí, haverá de revelar-se. Para além, claro está, do desfalcado gosto da criatura. Segismundo.
2003-07-09
O vala comum deve ser habitado por algum hermafrodita ou coisa do género, que não é bem género, apenas coisa. Então não é que o blog nos promete o lado negro da coisa... e, vá lá saber-se porquê – se é mesmo que há porquês nisto –, para além de se afirmar in love pelo crooner Antony, a caridosa alma por lá domiciliada debita améns que nunca mais acabam ao concerto de Lou Reed acontecido no final da última semana em Coimbra. Pobre e atormentado espírito, cujos recalcamentos civilizacionais transmutam o frouxo em algo que tange o sublime. É caso, seguro, para o divã, oráculo onde todos os mistérios encontram resposta. Ou, pelo menos, a plausível narrativa exacta. Segismundo.
Um novo colaborador, danado, deu entrada neste tugúrio. Mas a ordem das coisas permance. A república e a virtude cívica são competência do Nicky Florentino. Os prazeres e as dores são competência d’O Marquês. Apenas uma província não atribuída antes, os insondáveis mistérios da psique, é agora competência desse quase Mandrake ao contrário chamado Segismundo. Contratado, claro está, em regime de avença. Nicky Florentino e O Marquês.
Adolfo, já rapazote, afirmou a intenção de usar bigode. Não uma bigodaça. Nem uma barba desgrenhada, como a dos judeus. Mas um bigode. Mais pequeno e certo. Que não parecesse ridículo. E veio-lhe esta ideia da lembrança da sua primeira vítima. Foi um rato. De bigodes compridos. E brancos. Por eles, quase que o rato pareceu a Adolfo uma criatura de Deus. Coisa que ele, desalmadamente, queria ser. O Marquês.
2003-07-08
O Adolfo era miúdo para não ter mais de quatro anos. Vinha de uma cidade qualquer da Áustria, era órfão e tinha uns olhos escuros, quase lindos. Deus, por certo, elegera-o. Talvez não pela destreza ou pela beleza. Mas, concerteza, marcara-o para mil ou mais grandes feitos. O destino é isso mesmo. A primeira vítima que sucumbiu às suas mãos foi um pequeno rato, estimação de um primo seu. Tinha um nome qualquer. Parece que judeu. O Marquês.
Um masoq é o resultado de um triste e aberrante equívoco. A pobre criatura chegou a aprender parte da lição, que a dor dá prazer. Mas não assimilou o necessário complemento dessa mesma lição, que a dor que dá prazer é aquela que é infligida. O Marquês.
Os suínos são animais javardos e, como o Orwell nos ensinou, alguns têm até a mania de mandar. Alheios a tudo, empanturram-se que nem porcos, defecam que nem porcos e servem apenas para ser presuntos, febras, costoletas, chouriços, leitões ou, então, para andar de bicicleta. Por isso, são um problema de proporções quase calamitosas. Ou apocalípticas. Até poluem praias, veja-se lá, na Vieira. Daí que razão, toda a razão, tenha o senhor dr. secretário de Estado do Ambiente quando diz que "algumas soluções carecem que os senhores suinicultores falem com os seus associados". É que, até este momento, os suínos, essas criaturas que evacuam dejectos em quantidades taquepariu, não colaboraram. Nada. Nadinha, mesmo. Pelo que, se o diálogo se vier a revelar infrutífero, ainda se vai ter que mandar algum para o espeto. Para servir de exemplo. Olha os cagões! Nicky Florentino.
Isso de ir à bola é trabalho. Só não vê a quem a miopia ou o astigmatismo turva, e não pouco, os olhos. Por isso, nesses exactos termos, foi assim que o senhor dr. deputado Alberto Martins justificou a falta ao plenário da Assembleia da República no dia da final da Taça UEFA. Parece-me bem e adequado. Assim como me parece bem e adequada a resposta que o mesmo senhor dr. deputado deu quando foi instado a justificar a justificação que apresentou referente ao facto de ter estado ausente da caserna parlamentar para ir a Sevilha, "Eu não dou satisfação do enquadramento político das minhas justificações". É claramente compreensível. Aliás, não por acaso, o senhor dr. deputado Manuel Alegre, fraterno e sabido camarada do dito outro, colocou tudo em pratos limpos, se é que dúvidas subsitiam, assim "A justificação de trabalho político é critério do próprio, ninguém tem legitimidade para colocar isso em causa". Seja a justificação, seja o trabalho político, seja o critério. Ele há coisas que são da reserva íntima de cada um. Respeitá-las é o mínimo que se pode exigir. Quem assim não faz ou é escumalha ou não é bem de cá. Nicky Florentino.
Nutro particular admiração pelas promessas, sobretudo pelos boys de hoje, que, como se sabe, serão os homens de Estado de amanhã. Mais admiração nutro por essa rapaziada quando, na eminência de perderem a sinecura, até nos seus próprio correlegionários treinam o cravar do punhal em espaldar alheio. A república precisa de sujeitos assim, exactos, com o verdadeiro sentido das coisas, sem o jeito cativo de manias da honra ou subtilezas próprias de gado manso. Como disse esse tamanho invertido chamado Foucault, invertendo uma proposição de von Clausewitz, "a política é a continuação da guerra por outros meios". Por isso é que a malta nova tem, desde cedo, aprender a torcer o pepino, a comportar-se como um homem de barba rija. Triste, insolitamente triste, pela figura que fez, é o senhor dr. vereador da Câmara Municipal de Lisboa implicado, Pedro Feist, reconhecer publicamente a sua fraca capacidade pedagógica. Disse ele, em tom quase de condolências, "Quando quis ensinar estes jovens o que é ser autarca, eles responderam com traição. Isso aborrece-me sobremaneira pela injustiça, até porque sabiam desde o início que a empresa ia ser extinta. Mas, ao mesmo tempo, já recebi da oposição manifestações de solidariedade". E tudo isto, afinal, porque há quem tenha metido no espírito que a Câmara Municipal de Lisboa não necessita de uma empresa para gerir piscinas. Mas é claro que necessita! Os espaços para o exercício da influência e do poder nunca são demais. E uma empresa para garantir a gestão de tanques é uma coisa que faz sempre alguma falta. Certamente. Senão por qual raio é que as inventaram?, não é? Nicky Florentino.
2003-07-07
Disse o senhor dr. eurodeputado e ex não sei quantos cargos, Mário Soares, que o fulano que por ora está em ministro de Estado e da Defesa é "uma pessoa que não tem carácter e que não tem maneiras. E isso é grave". Porque o dito foi revelação, ainda ninguém se tinha apercebido de tal facto. Mas, já agora, ó senhor dr. eurodeputado, elucide-nos, esse grave será mesmo assim tão grave? Mas, porquê? Ele meteu-se com a mulher de alguém? Estranho..., não é? Nicky Florentino.
Estacionou o seu Cavalino Rampante, cor de Benfica. Elas, duas, estremeceram, tocou-as de súbito modo um certo fulgor. Quem seria ele?, que faria ali?, naquele lugar, interrogaram-se a si mesmas, em silêncio, sem o denunciarem uma à outra. Foram elegantes a perseguir os movimentos do rapaz. Ele, embora não as conhecesse, cumprimentou-as. "Bom dia", disse, quando passou. Acabou por sentar-se próximo delas para beber o café. Elas, moças desinibidas, insinuaram a sua presença e apresentaram-se. Ele acedeu. Conversaram. Entretanto, ele informou-as que tinha em projecto, em seguida, ir ali perto, a uma conhecida quinta, fazer a observação de um potro seu e, cavalheiro, convidou-as. Elas parlamentaram por uns instantes e decidiram corresponder ao convite. Acompanharam-no no carro. Deslumbraram-se com a propriedade rústica onde foram conduzidas. Mas o primeiro momento em que expressaram verdadeira estupefacção foi quando, já no interior do estábulo, perceberam que o potro jamais viria a ser cavalo. O ecúleo, afinal, era de madeira. E a lição haveria de lhes ficar vincada no corpo. O Marquês.
Houve arraial de mulheres comunistas em Vila Nova de Cerveira e o secretário-geral da confraria apareceu por lá. Vi no televisor. Subiu a um palco que, ao fundo, tinha uma lona onde se podia ler "Conviver também é lutar!". Como a dialéctica não sossega, lançou-se concerteza nova doutrina, subsidiada (agora e também) pelos contributos de Dionísio. Já os estou mesmo a ver, em pleno Comité Central, de punho esquerdo cerrado e erguido contra a atmosfera, a clamar, com esforço sobre o diafragma, "força! camaradas pândegos, à estroinice! Pandegar é fazer a revolução!". Ou não fosse a festa propriedade do povo. Nicky Florentino.
Ontem, antes do jantar, no cabeçalho do écran do televisor, sintonizado na Televisão Independente - vulgo TVI -, corria "Aveiro em estado de choque. Septuagenário mata mulher grávida de caçadeira". Suspeito que o pai seja um revólver de avantajado calibre. Ou, então, um bacamarte com coronha de madeira exótica. Não sei. Não esperei pelo desfiar do destaque no telejornal das 20.00. Nem pelo senhor professor doutor. Não gosto de dores. O Marquês.
2003-07-05
Se uma casca de banana no chão faz escorregar, colocada entre os lençóis é um substituto funcional e doloroso da vaselina. Por isso, certo é, o Garzón tem um andrologista interessante. Ele é que ainda não sabe. O Marquês.
Baltasar Gárzon, essa espécie de Torquemada recauchutado, foi entrevistado por duas moçoilas do espesso Expresso, em Madrid. E, às tantas, interpretou o facto de lhe terem deixado uma casca de banana entre os lençóis do seu conjugal leito como um recado mafioso. O homem sofre concerteza de dissonância cognitiva. Então não é evidente que ao deixarem a casca da banana entre os lençóis e não no chão, perto do tapete onde Garzón arruma os chinelos coçados, houve o cuidado de velar pela sua integridade física? Será que o homem não percebeu que uma casca de banana na cama faz escorregar muito menos do que uma casca de banana no soalho encerado? Ou é incompreensão. Ou é ingratidão. Talvez esta última. Os juízes, com a soberba da soberania, tendem à ingratidão. Nicky Florentino.
O Lou Reed, que se deita com a Laurie Anderson, deixa o Fernando Sauders cantar nos seus concertos. Não há compreensão fenomenológica disponível para o caso. Nem eu sou assim tão maquiavélico. Nem O Marquês é assim tão sádico. Para além deste alcance mais prosaico, a única explicação possível é a da paixoneta. O Lou deve andar caído de paixões pelo Nando. Tanto que nem o ouve. O coitado. Nicky Florentino.
Há fulanos que não deviam ser autorizados a cantar fora da sua própria casa-de-banho. Fernando Saunders, o homem que tece os ritmos nos concertos de Lou Reed, é um deles. A sua voz pertence ao mesmo segmento a que pertencem as vozes de Lionel Richie, George Michael ou outros do mesmo calibre. A evitar, portanto. Ou a afogar. Na latrina. Nicky Florentino.
Antes do início do concerto de Lou Reed, ontem à noite, no Jardim da Sereia, em Coimbra, uma voz anónima, a soar a estúpido, informou que tal iniciativa resultava de um consórcio de imaginação e vontade do pelouro de Juventude da Câmara Municipal. Ora, é mais do que questionável que o cartel proposto fosse o mais adequado. O Lou Reed é rapaz para quase sessenta anos. E, para além disso, ele encerrou o concerto, no segundo encore, cantando Heroin. A juventude agradece. Mas reclama por não ter sido brindada com Vicious. Daí que, neste momento, exista quem esteja a ponderar lavrar tamanho desconforto no livro amarelo lá da edil casa. Há falhas que mesmo as juvenis almas não perdoam. Nicky Florentino.
2003-07-04
"Amas-me?", perguntou-lhe ela. "Não!", respondeu ele. Com a resposta feriu-a. Ela sofreu. E ele, percebendo tal mágoa, por estranho motivo, experimentou volúpia. O sádico. O Marquês.
Os comuns, pobres coitados, têm o hábito de celebrar, com pompa e circunstância, um conjunto diverso de efemérides que, pelo raio de uma razão ou outra, atingem determinada dimensão ou envergadura. Aqui não há dessas indecorosas manias de patrocinar celebrações ordinárias. Aliás, nem sequer nos apercebemos que já foram ultrapassadas as cem visitas a este blog. Não temos números fetiche. Nem o sete da cabalística, nem o dezaove do IVA, nem o trinta e três da farinha e dos senhores drs., nem o trezentos das lojas, nem o seiscentos e sessenta e seis do demónio, nem mesmo essa variável incerta que é o défice do Orçamento do Estado. De nós dois, só O Marquês concede alguma atenção às aritémicas. Ocasiões há em que, just for fun, convém contar o número de chibatadas dadas nalgum corpo. Tudo o resto são as danações do costume. Nicky Florentino e O Marquês.
Paul Wolfwitz foi recentemente vítima de uma torpe cabala armada por um rol de infames escroques. Andaram para aí, e não pouca canalha, a dizer que ele disse à Vanity Fair o que não disse. Porca miséria! E não foi já sem prejuízo que alguns, preclaros espíritos, colocaram tudo em pratos limpos, ilustrando, sem conceder espaço à dúvida, o que raio era isso das tais beaurocratic reasons de que Wolfwitz havia falado. Por isso, tomado o ensinamento desse caso, reporta-se no Jornal Oficial do Parlamento Europeu, na íntegra e no original, o que o senhor turisti della democrazia Martin Schulz disse ao Cavalieri Silvio Berlusconi. O que este replicou a aquele. E o que este aquele treplicou a aquele este. Tão claro quanto em Babel. Nicky Florentino.
2003-07-03
Muita insídia e perfídia foi investida pelos teutónicos e por toda a galé de canhotos e canhestros contra o elegante Cavalieri, Silvio. Mas uma evidência ninguém conseguiu negar até agora: o anafado senhor Schulz, por quem Silvio se dispôs a interceder junto do tal produtor de cinema, tem, de facto - é insofismável! -, uma estampa perfeita para representar o papel de kapo de um campo de concentração nazi em qualquer filme. E isso é que ninguém disse! Avaros dum caraças! Nicky Florentino.
Havia muito que ele não a frequentava. Deitava-se ao seu lado, cumpria o seu papel de costumado marido, mas eximía-se a ser homem, nunca mais a tendo procurado para nela afundar a sua viril disposição. Comentou ela com as amigas o caso. E a sugestão foi que investisse no suborno, na sedução, coisa que, antes, também ela já havia pensado.
Experimentou a receita. No dia seguinte, preparou uma aprimorada refeição. Espalhou velas, acesas, pela casa. Deixou escorrer do sistema hi-fi a música deles, Caetano Veloso. Voltou ao perfume de quando eram namorados. E, mas não se via, vestiu uma lingerie ousada, nova. Ele chegou e revelou-se ostensivamente indiferente. Nem mesmo quando, no quarto, ela se despiu e insinuou ele reagiu. Adormeceu. Lacrimosa, possessa, ela investiu sobre ele. Agrediu-o. Sentiu prazer nisso. Continuou, em crescendo, a agressão. Até ao limite de o sufocar com uma peça da provocadora lingerie que havia comprado nesse mesmo dia. Foi um orgasmo diferente. O Marquês.
Naquele tempo, era moda os amantes gravarem tatuagens, estampando no corpo um ícone que representasse, para durar, o alvo da respectiva paixão. Nisto, um dia, a Miquelina foi na onda. Ordenou que, no peito, no exacto lugar onde sentia o tiquetaquear do coração, lhe tatuassem um alvo, por o Gervásio, rapaz por quem jurara eviterno amor, ser artista de circo, manipulador de espadas, facas e etcetera, outros objectos de afiado gume.
Estretanto, Gervásio, esperava-a na roulote. Ansiava, cativo de ciúmes, mesmo que fossem infundados. Por onde andaria a sua amada? Com quem andaria ela? Com algum homem? A dúvida atormentava-o. Para sossegar, decidiu ir treinar o número dos punhais. Foi quando Miquelina chegou. E, logo ali, para anunciar a surpresa que trazia gravada no corpo, ela lhe expôs o peito nu. "Este alvo é para ti, é teu", disse ela. Depois, ouviu-se um silvo breve. Um punhal cravou-se-lhe no peito, exactamente na mouche. A pontaria do Gervásio estava afinada. O treino, afinal, não era necessário. O Marquês.
Por ominoso processo, indecifráveis contingências da vida remeteram para assento de réu um rosário de gente ilustre e de bem. Isto é, em poucas palavras, o que resume o caso-escândalo da Universidade Moderna. Por isso, é com incontida emoção que se sabe que o recto homem, de cervical invejável, senhor doutor ex-reitor da dita universidade, denunciou em audiência recente ter sido vítima de "forças oblíquas". Há maldades que, não obstante a orientação oblíqua que tenham, não se fazem a um homem bom. Tão bom que até um funcionário de uma sucursal lá da casa mereceu um Jaguar para se passear aí pela cidade, à la manière. Nicky Florentino.
É impossível não nutrir simpatia pelo mestre Silvio, o maior do Governo de Roma. Ir a Strasbourg, à casa onde o senhor Schulz se senta, e dizer-lhe, ali, na fronha, diante de todos os outros eurodeputados, em pronunciada, mas discreta, ironia que ele era o tipo indicado para representar a figura de kapo num filme que está a ser rodado em Itália é d'homem com estofo. E o facto de a irónica provocação necessitar de tradução de italiano para alemão, então, essa, é mesmo de grande danado. O sisudo e tanso do senhor Schulz, por pura e acintosa nolontade, armou-se em vítima. Ficou a perder na brincadeira. Mas o Silvio, esse, calculado manhoso, há-de ir longe. Muito longe, mesmo. O danado. Nicky Florentino.
Ele há por aí danados maiores do que... sei lá, uma qualquer coisa da proporção do Gulliver em Liliput. O senhor dr. presidente do Governo da Região Autónoma da Madeira é um deles. Para além de ser remunerado, a estipêndio do erário público, o que ele disse sobre o discurso de uma tal Pestana, deputada regional do PS, é prova sobeja disso mesmo. Ipsis verbis, o homem sentenciou o produto dito da palestrante como "uma peixeirada, intelectualmente desonesto, piroso e ranhoso". O homem é um senhor! E confrange que neste tugúrio chamado continente ninguém esteja ao nível dele. Shame on you!, obnóxia cambada de indolentes desgraçados. Nicky Florentino.
2003-07-02
Ela estava deitada na cama. Exposta. Em sedução. Com as mãos escondidas, a segurar um azorrague, pequeno, ele aproximou-se. E com uma voz timbrada em confiança, sincero, anunciou-lhe "vou polear-te!". A inocente cachopa, sem perceber o flagelo que lhe havia sido prometido, confiante, dada na paixão, disse "sim, vem, faz-me isso". Ele não foi de demoras. Nem o sangue. O Marquês.
O povo, em estado de gente, brame e exulta quando entende serem vitórias suas. E na celebração desse júbilo, os gentios são de comer, beber, mandar foguetório, ouvir estampidos, pum!, pum!, pum!, ver o fogo de artifício, apanhar as canas, bailar e vivar, tudo à fartazana. Assim foi, na passada noite, em Canas de Senhorim e em Fátima, em razão dos indígenas, por lhes haver sido anunciado um município lá para a terra, se começarem a sentir donos do seu destino. Porque a pobre ralé está em festa, por ora, não convém desiludi-la. As ilusões não matam. Apenas acabam. Nicky Florentino.
Uma inominável criatura, chamada Alex, assomou-se num programa televisivo com esta tirada: "Bispos irritam gays por concorrência desleal". Ai é?, pergunto, com ingenuidade tamanha, eu. E o que é que isso quer dizer? O Marquês.
2003-07-01
Silvio, o impunível Cavaliere, o maior do Governo de Roma, assumiu hoje a presidência da União Europeia, aquela que roda semestre após semestre. Grande herói! Só espero que não seja vítima de nenhuma manigância perpetrada por alguma alma mais atreita à mania das virtudes republicanas. Nicky Florentino.
Segundo a agenda da Assembleia da República, hoje, por lá, é dia de apresentação dos resultados do concurso raro «foi vocelência que rogou um município?». Para participar, aos interessados bastou que, com a devida antecedência, se tivessem disposto a berrar e a importunar com frequência os senhores deputados. Nisto, como em tudo na vida, a perseverança da demanda é condição para o congestionamento da paciência dos senhores que têm de tomar a decisão. Sabe-se que, para além de determinado limiar, não há pachorra que aguente e, portanto, em consequência, apenas para se livrarem do efeito desconfortante provocado pelo zumbido dos paroquiais pedintes, é expectável que os mui e sempre leais procuradores da nação cedam e acedam a dar provimento ao demandado, gerando, assim, o gáudio dessas miúdas e provincianas arraias com a mania de se auto-administrarem. Achtung!, altercações e remessa de vernáculos apodos ao senhor Presidente da República parece que também lubrificam consistentemente o congestionamento da paciência dos senhores representantes da nação. Nicky Florentino.
Post-scriptum. Ai!, as saudades que eu tenho dos autênticos e genuínos jacobinos, de infinita e sempre tonificada paciência. Esses, sim, sabiam arrumar e ordenar as periferias e os recônditos lugares do chão em que a pátria assenta.
A ansiedade é má conselheira. Mas arrisco - e voto em honra - que tanto o título mister simpatia, quanto o título mister fotogenia, da época, devem ser atribuídos a este moço, de boa extracção e pedigree distinto, capturado numa polaroid arquivada por essa veneranda instituição norte-americana chamada The Smoking Gun. Nicky Florentino.
O danado d'O Quarto do Pulha apostou-nos, em palavra passada, aí pela blogosfera além. Por isso, tementes e reconhecidos, dizemos que o inferno também será dele. Sem custo. Sem juros. E sem entrada inicial.
Danadamente agradecidos, Nicky Florentino e O Marquês.
Como O Marquês apostou imediatamente antes, o secretário-geral do PS confiou ao espesso Expresso: "há pessoas que continuam a achar que vale tudo. Eu acho que vale tudo menos a facada nas costas". Está, pois, encontrado o elo mais fraco. Do momento. E arredores. O homem não tem arcabouço de costas suficiente para o jogo. Por isso, agora, siga para bingo, que se faz tarde. Nicky Florentino.
Confessou o secretário-geral do PS ao espesso Expresso: "há pessoas que continuam a achar que vale tudo. Eu acho que vale tudo menos a facada nas costas". Coitado, mal sabe ele que, se experimentasse tamanho prazer, abjuraria tão fracos achamentos. Em nome da liberdade. Ou de qualquer outra superlativa forma de emancipação. O Marquês.
Olhou-o com incredulidade e perguntou "mas isso não é um chicote?". Ele, terno, voz de rádio, para mitigar e tornar macios temores indesejados, respondeu "não!, é um kit mãos livres". Por instantes, o sossego instalou-se. Até ao momento em que o pingalim serviu o primeiro açoite. O Marquês.
"Mas tu magoas-me tanto...", lamuria-se e repreende-o ela. "É porque gosto de ti, mor", confessa, genuinamente convencido, ele. O Marquês.
Eles, ela e ele, compraram um candeeiro. Assustador. Capaz mesmo de matar velhotas de gosto mais bem amparado, coitadas. Arrumá-lo na bagageira do automóvel, isso, é que foi obra do caraças, manobra que exigiu engenho e destreza de rapaz habituado a carregar uma mochila Coronel Tapioca e a manipular canivetes suíços. Para além de peça medonha, o candeeiro não era instrumento de arrumo fácil. Mas conseguiram compô-lo no compartimento sem lhe infligirem flagelo ou estrago.
Entretanto, ao cabo desta missão, ela, com cândida fronha e em cuidados com a integridade da aquisição, virou-se para ele e impôs: "eu é que levo o carro!". Ele, indiferente, soberano, homem, fechou o porta-bagagens, entrou no carro, sentou-se, colocou a chave na ignição, com uma mão segurou o volante e com a outra despertou o motor do carro. E ela, cá fora, em pleno parque de estacionamento do Continente, a espernear que nem uma azougada cabrita do monte, insistia: "mas tu estás a ouvir?, eu é que levo o carro!, eu é que conduzo!". Pelo que se viu, só se for em casa. Algum lego da Noruega que por lá exista. Ora, olha a gaja!, a manienta!... Nicky Florentino.
2003/2024 - danados (personagens compostas e sofridas por © Sérgio Faria).