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Albergue dos danados

Blog de maus e mal-dizer 

2004-12-31


Votos. Que o senhor dr. Santana Lopes seja o próximo primeiro-ministro indigitado pelo senhor presidente da República. Pois a política é uma paródia que ninguém pode deve parar. Nicky Florentino.

Referência



Canção de amanhã. All is quiet on New Year's Day.
A world in white gets underway.
I want to be with you, be with you night and day.
Nothing changes on New Year's Day.
On New Year's Day.

I... will be with you again.
I... will be with you again.

Under a blood-red sky
A crowd has gathered in black and white
Arms entwined, the chosen few
The newspaper says, says
Say it's true, it's true...
And we can break through
Though torn in two
We can be one.

I... I will begin again
I... I will begin again.

Oh, oh. Oh, oh. Oh, oh.
Oh, maybe the time is right.
Oh, maybe tonight.
I will be with you again.
I will be with you again.

And so we are told this is the golden age
And gold is the reason for the wars we wage
Though I want to be with you
Be with you night and day
Nothing changes
On New Year's Day
On New Year's Day
On New Year's Day
. Segismundo.

Referência



Reveillon. É uma ilusão recomeçar o princípio. Segismundo.

Referência



Trajecto. Faz-se pelo corpo, mão na mão, a tranquilidade que ela lhe empresta e descobre. Segismundo.

Referência



Promessa. E, tranquilo, quase sete da aurora, ele foi dormir. Segismundo.

Referência



Crescer. Corpo nenhum cresce como a fome, sem nada. Segismundo.

Referência



Hoje é dia de. Entregar o corpo ao seu domicílio, a morte que o acorda. Segismundo.

Referência



Dores. Dores de ontem que são também as de amanhã e sempre. E nelas a felicidade de, brutamente pelos outros, revelar o mundo. O Marquês.

Referência

2004-12-30


E caridade. (Espaço de publicidade gratuita) Pela ilusão e pela verdade, desde o sertão até à cidade, vote PSD, para que ganhe vossemecê! Nicky Florentino.

Referência



Esperança. É certeza de todos os dias que o chão não mexe. Mas, ainda assim, o chão mexe - consta, por exemplo, que, em consequência do maremoto recentemente acontecido, a ilha de Sumatra deslocou-se coisa como vinte metros para sudoeste. Ora, se assim é, iupi!, iupi!, lá!, lá!, lá!, surge admissível admitir a vitória do PSD nas próximas eleições legislativas. Nicky Florentino.

Referência



. O senhor dr. Santana Lopes, enquanto senhor primeiro-ministro, há-de ser capaz de fazer pior do que fez nos últimos meses. Motivo pelo qual, no próximo dia vinte de Fevereiro, é imperioso votar no PSD. Não há outra forma de a pátria, essa reunião imaginada do colégio dos gentios, se redimir da própria miséria. Nicky Florentino.

Referência



Para além de Vinicius. Que, enquanto longue, seja o amor eterno. E não mais. Segismundo.

Referência



Rodin & Munch. Do Sítio da Catraia, como que roubados, leva ele os gritos, para chegar mais longe, em silêncio, quase tudo dizendo. Segismundo.

Referência



Missão. Aprender a respeitar a raiva, a seiva dos bravos. Segismundo.

Referência



Until the end of the world. Estender as mãos para longe, até se ultrapassar o corpo de que se é dependente. Segismundo.

Referência



O mundo a crescer. Há flores de aço com pétalas maiores do que as outras que ele conhecia. Segismundo.

Referência

2004-12-29


Dúvida e agenda. Veneno? ou liberdade? Segismundo.

Referência



Vida. É falar com a morte, antes de a conhecer. Segismundo.

Referência



Contar estórias. É mostrar as mãos abertas, para dar a fingida inocência aos olhos, sem mostrar a felicidade de enganar. Segismundo.

Referência



Cavalos de corrida. Apostar num único cavalo, como se apenas um corresse, é ser cobarde? Segismundo.

Referência



Uma lição. Ontem, frente a um canto do Atlântico, ele foi beijado por uma desconhecida que lhe leu lágrimas nos olhos enxutos. Foste traído?, perguntou-lhe ela. Não sei, julgava apenas o mundo mais certo, respondeu ele. Mas se o mundo é tão grande..., tentou ela emprestar-lhe ânimo. Eu sei isso, disse ele, mas agora estou a aprendê-lo com o corpo e parece diferente. Segismundo.

Referência



Where is my mind? A sensação morta. Parar e não suspender os passos. Escutar e não ouvir. Olhar e não ver. E o comboio que não passa. Segismundo.

Referência



Vontade. De ser justo. Sempre. Porque é também pela justiça que ele se liberta. Segismundo.

Referência



O amante. Ele olhou para dentro de si. Percebeu aí um vulto. Como é que te chamas?, perguntou ele ao vulto. Chamo-me amor, respondeu-lhe o vulto. É por isso que te vou matar, informou ele, antes de meter as mãos no seu próprio corpo e rasgar-se, tentando libertar a dor, livrando-se do vulto. Mas a dor não se liberta assim. O Marquês.

Referência

2004-12-28


As comunidades imaginadas dos mortos. Por qual raio é que interessa saber a nacionalidade das vítimas que pereceram em consequência do maremoto? O objectivo é diferenciar o quê?, os mortos? Se o objectivo é esse, então, que tivesse sido utilizada a tradicional e convencional escala de quatro categorias, velhos, mulheres, crianças e outros. Embora preferível, mesmo, fosse que a comunicação social se limitasse a anunciar a dimensão absoluta dos mortos. Pois assim, a granel, é provavelmente como deus, para quem todos são seus filhos e merecem semelhante simpatia, os veria, se tivesse olhos de ver. Nicky Florentino.

Referência



Addicted to fortune. Segurem-na! Segismundo.

Referência



Ó mãe! O Filipe não devia ter saído da casa da senhora sua mamã. Porque crescer é mau prenúncio. E, ao mesmo tempo, porque essa forma de crescer adultera a dieta de batatas fritas, no sentido em que, por cedência à circunstância da distância à mãezinha, elas, as batatas fritas, para além de aparecem lá em casa dentro de um pacote, perdem o típico tempêro maternal que permite aos rapazes, mesmo mais velhos, permanecerem PeterPans. Segismundo.

Referência



Outro como eu. Porque repetir não cansa. Segismundo.

Referência



Autopoiesis. Sequer se pode dizer de deus putaqueopariu, tentando chegar-lhe a ofensa por via de terceiros e ascendentes. Pela circunstância que deus não tem mãe. Segundo a lenda, concebeu e gerou-se a si mesmo. Segismundo.

Referência



O mundo, inteiro, em título. Página trintaeoito do suplemento Local – Lisboa da edição de hoje do Público, “A felicidade, dois homens e vinteequatro couves”. Mais, sabe-se para além do título da crónica, da quinta da felicidade, dos dois homens e das vinteequatro couves vê-se o ICdezanove. Segismundo.

Referência



Fim do episódio. ... Ela, e, esqueci dizer-te,
Kenpä toi tämän valehen, toi tämän valehen
pani miule pahan mielen, miule pahan mielen
sulhon tyhjin tulleheksi, tyhjin tulleheksi
aivan jouten joukseneeksi, jouten joukseneeksi
En mie syyllistä syliä, syyllistä syliä
vouta vierelleni, vouta vierelleni
syyllistä syliä, syyllistä syliä
oota omakseni, oota omakseni

também porque já não sentes a necessidade de adormecer nos meus braços. Segismundo.

Referência



A different kind of blue. Como deve ser triste amar e não acreditar no que o amor pode, porque pode, mais, o medo. Segismundo.

Referência



Sequência. Quando se ergueu, confessada a ressaca e acondicionada a dor no corpo,
if every angels terrible
then why do you welcome them

caiu ele, quase peso rendido, morto, na memória do sorriso
i once fell in love with you
just because the sky turned from gray into blue

a que a paixão simultaneamente o obrigou e traiu. Segismundo.

Referência



Porque o sono de pavio curto. Vive-se mais quando se dorme menos, esta é uma ilusão cronométrica recorrente. A questão é, quantas horas de sono, duas?, três?, são suficientes para se viver mais? Segismundo.

Referência



La maison de mon rêve. Veio-lhe da paisagem onírica, da vigília rem, a vontade de nascer do tempo, ser filho do que passa. Segismundo.

Referência



Heart of stone. Envolver o coração que pulsa com uma caixa de pedra tosca, depositá-lo na casa das coisas perdidas e não resgatar o que foi, porque o futuro acontece depois. Segismundo.

Referência



Peregrinação aos lugares da redenção. Domingo, jardim das flores de aço. Segunda-feira, varanda sobre o Tejo, primeiro, e traço de asfalto, em aproximação a Santo Amaro, de onde se lê o soberano castelo dele, depois. Terça-feira, varanda sobre o Tejo (escala) e farol do cabo de São Vicente. Segismundo.

Referência



Asas do desejo. À noite, madrugada a crescer, voar baixinho, a velocidade proibida, para o lugar chamado distância. Aconteceu ontem. Acontecerá hoje. Segismundo.

Referência

2004-12-27


O único dos caminhos para a salvação. Há motivos políticos, maiores do que todos, para, nas próximas eleições legislativas, votar no PSD. Sabe-se que, caso vença, o senhor primeiro-ministro indigitado será o senhor dr. Santana Lopes. E isso é o que, neste momento, a pátria necessita. O senhor dr. Santana Lopes é um homem sério e íntegro. Dispôs-se, como um valente estóico, à honra de senhor primeiro-ministro quando o senhor dr. Durão Barroso entendeu, por conveniência ou o raio que o parta, pôr-se à trasumância para melhor pasto, lá para a presidência da Comissão Europeia. E, para além disso, desempenhou, o senhor dr. Santana Lopes, as respectivas funções o melhor que conseguiu e pôde. Seja como for, é injusto admitir que ele não consegue e pode fazer pior. Consegue e pode. E é justamente isso que é urgente. A pátria necessita de ir ao fundo. Só nesse instante o desassossego difuso pode desassossegar e obrigar à acção. E só sob essa condição as criaturas salvíficas, como o senhor Prof. Doutor Cavaco Silva, o senhor Doutor António Borges, o senhor dr. Mário Soares ou o senhor dr. António Vitorino, se darão ao incómodo de, como obrigação, se sentirem tentados a pôr as manápulas nas rédeas pelas quais julgam conseguir e poder orientar a pátria. Depois, surge como cenário plausível, constatar-se-á que os desgraçados salvadores também pouco ou nada conseguem e podem fazer. Mas isso é só depois. E o depois é depois, não antes. Até lá permanece a ilusão de que apenas o senhor dr. Santana Lopes é mau e culpado. E essa ilusão é que, no momento, é vital preservar. Pois qualquer outro sentido de voto é um subsídio para a desilusão. Seja a encarnação dessa desilusão o senhor eng.º Sócrates, seja outro. Nicky Florentino.

Referência



Um, dois, três, experiência. A branco, apagam-se as vozes e o corpo segue o silêncio, cresce. E, porque cresce, renasce da dor. Segismundo.

Referência



Tranquilidade. É a condição de não morrer agora. Segismundo.

Referência



Amar. É um acto, como um golpe, contra as coisas, os estorvos espectrais e os demónios íntimos que seguram a distância e cessam a reciprocidade. Segismundo.

Referência



Alta traição. Nenhuma traição é superior à traição de si próprio. Ele suspeita que se traiu. Antes, auto-traído, caiu. Segismundo.

Referência



A theory of justice. Ser justo é ver para além do que se vê e ouvir para além do que se ouve, não ser-se cego e surdo. Por isso ele suspeita que se traiu na cegueira e na surdez. Segismundo.

Referência

2004-12-26


Os passos em volta. O veneno estende o corpo. E capta a consciência necessária ao tempo. Inclinam-se já os passos para o conforto que ele permite. Pois é desse conforto que se renasce. Segismundo.

Referência



Etnometodologia do limite. Percebe-se o limite quando se sente que os nomes não reportam a realidade e os adjectivos disponíveis, por defeito, não a qualificam lealmente. Segismundo.

Referência



Judas. De entre todos os gestos de traição, o mais ominoso é o beijo. Segismundo.

Referência

2004-12-25


Liber. Qualquer criatura que se esforça por ser liberal em acto tende a admitir o princípio da suspeita, porquanto, como Nietzsche escreveu em Der Antichrist, “a força e a liberdade, provenientes do vigor e da exuberância do espírito, demonstram-se através do cepticismo”. Segismundo.

Referência

2004-12-24


Tu. Ele viu-a bonita, menina de beleza inteira. E disse o único eco que ele sabe eterno e certo. Amo-te. Segismundo.

Referência



Nocturno. Não há estrelas no céu. Mas ele sabe que essa é uma ilusão que não é de todas as noites. E não é por esta ser o que dizem noite de consoada. Segismundo.

Referência



Zeitgeist. A ele apetece-lhe eviscerar. Deu-lhe para a simpatia, é o que é. Segismundo.

Referência



Apelo. As ameias do castelo chamam-no e dizem-lhe que ele pode voar. Mas hoje ele sabe que isso é um engano. Segismundo.

Referência



The day after. Quando se acorda e a primeira mulher que se vê é a mãe isso significa que a ressaca já está domiciliada no corpo. E que ainda falta a maior de todas as emancipações. Crescer. Segismundo.

Referência

2004-12-23


O presépio voodu. Algo, um impulso de vontade e raiva, a obrigou a arrancar a cabeça à figura do pai do menino Jesus. O José carpinteiro que mais próximo estava do lugar onde foi montado o presépio apareceu subitamente decapitado. Corpo para um lado, cabeça para o outro, como se houvesse sido esta arrancada por uma força bruta. Inexplicável, é o que julgam os incrédulos de causas misteriosas. O Marquês.

Referência



Cerrar fileiras!, era antes. Há um senhor chamado Rui Valada, senhor professor, advogado, que é militante do PSD e, u-lá-lá!, pertence à ala reformadora. Abram alas!, abram alas!, deixem-no passar. Ele vem de longe, de muito longe. E para lá há-de voltar. Nicky Florentino.

Referência



Leve, levemente. O frio é bom companheiro. Porque não engana. E corresponde. Segismundo.

Referência



Açucena. Sabe-se a irmandade quando se continua a reconhecer o parentesco inventado, por nenhum outro modo dizer o sangue como ele foi e é. Segismundo.

Referência



Encontro com o fantasma que vem no Natal. Ela, olhando-o nos olhos, e se?... Ele, isso não interessa, isso já não interessa. Ela, como é que sabemos isso?, como é que sabemos que isso não interessa? Ele, pousando a chávena de café, não sabemos, mas é tanto o que não sabemos. Ela, mas não tens curiosidade?, não te inquieta saber o que podia, talvez pudesse, ter sido diferente? Ele, não, basta-me saber o que foi, os cenários que me interessam são aqueles que são plausíveis. Ela, sabes?, às vezes ainda penso o que poderia ter sido. Levou a chávena, segura entre as mãos, aos lábios, bebeu o café que ainda havia para beber e, depois, continuou a conversa, estás bem?, estás mais magro, não estás? Ele, sim, estou. Ela, também estou bem, comigo está tudo bem.... Ele, eu disse que estava mais magro... Ela, á, percebi que tinhas dito que estavas bem... Ele, estou mais ou menos... e tu?, como é que disseste que te ia a vida? Ela, eu também estou mais ou menos, disse em surdina, desviando os olhos, para baixo, como se carregasse a culpa. Ele, continuas bonita. Ela, corada, depois de um segmento de silêncio, e tu?, continuas leal ao princípio que nos afectos a marcha-atrás é uma manobra perigosa?, uma manobra a evitar? Ele, continuo, embora não tanto quanto devia. Ela, porquê? Ele, porque sou fraco. Ela, e isso é mau? Ele, bom não é. Ela, mas pelo menos segues o teu coração..., não? Ele, não sei. Ela, mas devias saber. Ele, eu sei. Segismundo.

Referência



Mehr Licht! Um tal Ralph E. Morris tem a seu crédito a concepção da primeira iluminação de Natal. O que significa que o iluminismo, a expressão máxima do espírito secularizado e pagão, também se emprestou, útil, à celebração da lenda e da superstição. Na prática a hipótese ecuménica funda-se sobre o entretenimento, a acção onde se sintetizam todas as razões. E, claro está, o espírito santo. Segismundo.

Referência



Ferrero Rocher®. Porque a puta da vida lhes é amarga, os gentios, no Natal, apenas no Natal, habituaram-se a permutar chocolates entre si. É uma forma de solidariedade. E de ilusão. Tão estúpidas quanto quaisquer outras. Mas mais económicas, muito mais, do que outras formas de solidariedade. E de ilusão. Segismundo.

Referência

2004-12-22


Quanto pode a política e o engano. Em artigo estampado na edição de hoje do Público, o senhor Prof. Doutor Fernando Rosas propôs um pacote de medidas para uma missão governamental canhota, guiadoras de mudança. O fulano atendeu sobretudo aos estandartes – prioridades, diz ele –, que supostamente não carecem de superior atenção orçamental. Quanto ao hard da política, o que é sentido pelos gentios nos bolsos, nada disse. Isso vem depois. Do voto arrebanhado. Nicky Florentino.

Referência



Antes da sobremesa. Na mesa ao lado eles eram dois. Entre o oi-aí-mermão e o é-madiê correu tudo ao contrário. Tudo excepto a cerveja. Muita. Segismundo.

Referência



O híbrido inventado pelas estouvadas. Inventaram, uma sobrinha dele, a Aninhas, a Rita e a Inês, uma extraordinária criatura, o camursário, cocktail genético cujos ingredientes são camelo, urso e otário. Como retaliação, tunga!, o pai Natal não vai visitar a Sara Francisca este ano. Segismundo.

Referência

2004-12-21


When the Saints Go Marching in. Voltar a acreditar é o lema da propaganda socialista para as próximas eleições legislativas. Como se a política fosse um carrocel, divertimento típico de feira nova... Nicky Florentino.

Referência



Sentido de Estado. Alguém do Governo decidiu adiar uma cerimónia de homenagem ao Futebol Clube do Porto. É isto a reverência. Nicky Florentino.

Referência



Pornoferência. Sobre a conferência de imprensa governamental de hoje, onde foram agitados recortes de respeitáveis periódicos de fora, nada a acrescentar. O acontecimento foi suficientemente harcore. Tudo, o que à miséria respeita, foi mostrado. Nicky Florentino.

Referência



Vitalógica. A puta da vida, como é, é um novelo de enganos, fio de uma ponta só, que, por isso, não permite orientar a saída do labirinto. O que, fatal, faz de qualquer gente paciente. E paciente não por ter paciência. Mas por não ser agência. Segismundo.

Referência



Divã. Tarda a consulta. Tarda para além do admissível. É um jogo, um teste a quem sofre a espera e a padece. Se reclamar, revela-se incapaz de dominar e controlar a ansiedade. Se calar, revela-se sem o mínimo de auto-estima. Daí que, qualquer que seja a reacção, o jogo, o teste seja sempre a perder. E se confirme a necessidade da terapia. Segismundo.

Referência



Se preferir. Ele estava a ouvir Müller no hotel Hessischer Hof. Não era o momento ideal, portanto, para lhe ser perguntado se hesitava entre o ó-i-ó-ai e o ó-la-ri-ló-lé. Mesmo assim, foi-lhe perguntado. Quero é que te vás foder foi, na circunstância, emprestada, a resposta que conseguiu. Segismundo.

Referência

2004-12-20


O mundo ao contrário. O José manifestou estranheza, uma estranheza manhosa, por o seu nome, junto com o de George Walker Bush, constar mais vezes no índice remissivo do livro do Barnabé do que o nome de outros, supostamente mais próximos do André, do Celso, do Daniel, do Pedro e do Rui. Não se percebe a estranheza, se se percebe que é sendo contra que também se calibra quem se é. Pois acontece que, em muitas circunstâncias, a melhor referência da identidade é a alteridade. Não o cerco. E menos ainda o cerco que os outros, por mania, conveniência ou dissonância cognitiva, imaginam. Segismundo.

Referência



Para o infinito e mais além. Disse o senhor secretário-geral da seita comunista, “o PS é que tem que mudar, porque nós estamos no caminho certo. E um partido de esquerda não pode pedir ao PCP para abdicar da sua política”. Em política, as convicções, como a fé, tendem a ser um caminho para a solidão. É por isso bonito perceber que para uns quantos, raros, como os comunistas, mais vale estarem sós do que mal acompanhados. E no poder. Curioso é que, é essa a sua tragédia, não são os únicos a julgar assim. Nicky Florentino.

Referência



Sobre a poética socrática. Disse o senhor eng.º Sócrates, “nesta campanha não falaremos muito deste Governo pela simples razão que não se deve disparar sobre uma ambulância”. As tentativas de poesia em política são quase sempre assim, más ou uma autêntica merda. Nicky Florentino.

Referência



A política é a continuação da guerra por outros meios. Uma das vantagens do jogo político reside no facto de, aí, se poderem inventar os inimigos. Aproveitando-se de tal vantagem, disse o senhor secretário-geral da cambada socialista, “o PS parte para esta campanha com um adversário principal. Esse adversário é a apatia, é o desinteresse. O nosso adversário é a abstenção e é ela que nós queremos vencer”. Em termos retóricos, de propaganda, o enunciado é bonito. Porém, bem analisado o dito, o que sucede é que, em última instância, o senhor eng.º José Sócrates definiu como adversário do PS o próprio PS. O que é gesto decorrente de um de dois possíveis complexos. Ou do complexo do desamor próprio, pelo qual o PS deseja ultrapassar-se a si-mesmo. Ou do complexo da megalomania, pelo qual o PS pretende ser mais do que é, batendo-se com gigantes maior do que ele. O que quer que seja, não obstante a boa vontade aparente, é um sinal de pequenez. E, porque dito, como dito, faz do senhor eng.º Sócrates um empertigado, um empavoado. Que quer ser senhor primeiro-ministro. É esta uma das desgraças da pátria. Maior, muito maior, do que a abstenção eleitoral. Nicky Florentino.

Referência



Dorso. Disse o senhor dr. Santana Lopes, “tenho as costas cheias de cicatrizes das facadas que levei”. Incrédulos, Tomés que são, os gentios gritam mostra!, mostra! Mas ele não mostrará. Não pode. Não que não tenha as cicatrizes. Se ele diz que as tem, tem-nas. O problema é outro, muito mais grave. Caso mostrasse as costas, constatar-se-ia que lá não está alojada a cervical, condição do espaldar recto, da verticalidade. E essa revelação, sim, seria fatal, no sentido em que tornaria evidente a plasticina política de que a critura é feita. E ninguém se presta a confiar em bonecos a quem, quando mentem, o nariz não cresce. Pois esses, como é sobejamente sabido, são de pau. Não de plasticina. Nicky Florentino.

Referência

2004-12-19


A selva. Isto é o que se chama a selva. Também na selva não é necessário enunciar fontes ou sedes de inspiração. É tudo assim. Natural. Como a estupidez franca, au naturel. Para além disso, lá, na selva, não existem cartazes. Apenas bichos. Segismundo.

Referência



Chuva. Não há melhor tempero da vida, melhor do que o Black Label, do que a chuva. É lágrimas. De tudo. Segismundo.

Referência



Desenhar o horizonte. Tudo, não vale tudo. Mas quase. É por isso que, apesar do reencontro, ele não quer conversar sobre os ses. As bifurcações do passado, as estranhas opções, os erros, as oportunidades perdidas, aconteceram. Tornarão a acontecer, provavelmente em versões diferentes, pois isso, continuar, é também a vida. Mas o que aconteceu aconteceu. O que faz do futuro a única porta aberta. Pelo que o que se quiser, há-de querer-se no futuro. É isso o que ele espera das outras vozes. Que não sejam espelho do passado. Mas horizonte. Segismundo.

Referência



Re: E tu corpo. Prometo-te, num dia da próxima semana olharei o rio da tua varanda. Agora descansa. Boa noite. Um beijo para ti. Escreveu ele, em resposta. Segismundo.

Referência



E tu corpo. Não suplico. A liberdade, a minha liberdade, não me permite súplicas. Pergunto apenas pelo teu paradeiro. É isso que indago. Estás longe, é aí que te guardas, eu sei. Preferia que não estivesses guardado nessa gaveta, aí, afastado de mim, do meu corpo, onde não sei as tuas mãos. Sinto a tua falta. Não digo, não quero dizer, mas sinto a tua falta. Sinto muito. Sinto a falta dos teus olhos traiçoeiros, dos teus silêncios que me dizem o engano. Sinto a falta do teu corpo na minha órbita e em mim. Gostava de te ouvir a falar sobre Moacyr Scliar. Ou sobre Gabriela Llansol. Ou sobre e. e. cummings. Porém, estás longe, no teu abandono, afastado do que os meus olhos alcançam. Mesmo os meus lugares, onde sou íntima para mim, sinto-os cada vez mais vazios. Refugio-me em casa. Mas já raro suporto olhar os espaços onde ainda vejo o teu espectro, onde ainda cheiro o teu perfume, onde ainda quase tacteio o teu corpo, onde não estás. Voltas? Demoras? Pergunto por arder-me a espera. Faz-me falta, sinto-o, a proximidade dos teus braços, das tuas mãos. Espero por ti. Continuo a esperar por ti. Entretanto vou dormir. Boa noite. Escreveu-lhe ela. Segismundo.

Referência



Limite. Há na loucura um prenúncio, a consciência, que jamais permite fingir a própria identidade. Segismundo.

Referência



Interior slide. De dentro dele já não vem o eco cavado que vinha. Feito o sossego em si, sabe agora ele que não o rasga aquilo que não lhe foi, por não poder ser, prometido. Segismundo.

Referência



Treino. Ele ensaiou o excesso, que tem a virtude, sabe ele de muitas, tantas, experiências anteriores, de permitir alcançar mais. O seu corpo, porém, absorveu o que era suposto induzir esse excesso. Em consequência, a nitidez das coisas, nos seus contornos, nas suas cores, nos seus sons, e dos gestos permaneceu a nitidez ordinária, próxima, cercada. O que significa que o seu corpo ainda está treinado para os venenos fracos. Por isso, crescer, também nos venenos ingeridos, é necessário. Porquanto a metanoia de si não se atinge antes dessa ultrapassagem. Segismundo.

Referência

2004-12-18


Recheio de si. Se é dentro de si que ele tem que procurar e encontrar deus, não merece insistir no equívoco. Dentro de si sabe ele que existe um único estranho, ele-mesmo, ninguém mais. E deus, o deus que existe, se existir, há-de ser outro que não ele. Segismundo.

Referência



O homem trigre, uma legenda natalícia. Poderia escrever-se In Cold Blood. Era mais exacto. Foi essa, de facto, uma das compras dele, ontem. Mas, por motivos estéticos, de pronúncia, prefere escrever-se Fuck Christmas, I've Got the Blues. É o espírito da época a apelar. Segismundo.

Referência

2004-12-17


Pêndulo da inveja, ii. Mensagens.
Escrever mensagens.
Lemony Snicket’s – A Series of Unfortunate Events, Monumental. Visto.
Enviar.
Número de telefone:
91…
Ok.
Um mensagem recebida.
Cão!
Remetente:
+35191...
Transmitida:
dezassete-Dez-doismilequatro
zerodois:vinteetrês:quarentaeoito. Segismundo.

Referência

2004-12-16


Pêndulo da inveja, i. Um mensagem recebida.
Bolo rei da pastelaria que tu sabes, nham!
Remetente:
+35191...
Transmitida:
dezasseis-Dez-doismilequatro
dezoito:dez:zerodois
Responder
Gosma!, que te engasgues.
Enviar.
Número de telefone:
91…
Ok. Segismundo.

Referência



Ameaça maternal. A mãe telefonou-lhe três vezes. Ele não atendeu. À quarta vez a mãe deixou um recado. Domingo, para o almoço, não peças batatas fritas, às rodelas, finas. Segismundo.

Referência



Fauna. Parece que há rinocerontes na Madeira. Ou que eles lá dormem. Qualquer coisa assim. Disseram na Assembleia Legislativa insular. Eles lá sabem. Nicky Florentino.

Referência



Europe, mon amour. A fábula faz assim a estória, a menina Turquia levantou os olhos e foi bater, noc, noc, à porta da abastada e cerimoniosa vizinha, a senhora Europa. A senhora Europa, senhora de si, espreitou pelo postigo e disse, menina, se queres entrar, vai lavar as mãos e a cara e retira esse véu da cabeça, pois está fora das tendências ditadas pela mãe do bom gosto, a cidade chamada Paris. A senhora Europa, embora astuta, não engana. Como percebeu o preclaro Nietzsche em Jeinseits von Gut Böse, “a democratização da Europa é, ao mesmo tempo, uma involuntária organização para a criação de tiranos, entendida a palavra em todos os seus sentidos, incluindo o espiritual”. Nicky Florentino.

Referência



Natividade. A anunciação segundo M., o segundo escrivão dos factos. Havia José, filho de Jacob, exímio manipulador de pau e madeira, caído em amores por Maria. Falaram-se e, por lhes arder um incêndio que não é de ver, prometeram-se aos esponsais. Antes de o matrimónio acontecer, continuou José nas suas artes de amanho do pau, a tratar do que um carpinteiro trata. E também Maria continuou nos seus rengorrengos da vida, a ser cachopa. Um dia, porém, por mistérios que não são da natureza, achou-se ela prenha. Conta-se que a nenhum homem consentiu ela o desfrute de si, pois que, pia e casta, se guardava para na ocasião das núpcias ser estreada por José. Mas, mesmo assim, sem trucatruca, maneira pela qual até os bichos do mato se estendem feitos outros para o futuro, certo é que se pôs a germinar no útero de Maria uma flor que haveria fazer-se fruto gente. A nova incomodou, como é de incomodar homem que se preze de homem ser, José. Mas, bom que era, embora se imaginasse traído e apenas isso, cuidou ele, por amor e justiça de jeito, nada publicitar e afastar-se sem estrépito, poupando, assim, Maria, que não era diamante, à lapidação. Combalido, ao juízo de José assomaram mil e mais congeminações e ideias, sem que ele conseguisse alcançar como podia estar de esperanças Maria. Como era possível inchar-lhe no ventre uma vida nova?, se ninguém lhe injectou com frémito o seu branco sangue, o seminal sangue com que se fazem os herdeiros. Nada dizem as crónicas se, nesta sequência de factos e desatino, José vacilou, encharcando-se em vinho ou mastigando ervas que alucinam. Contado é que um fantasma lhe apareceu, embrulhado estava ele em sonhos, e lhe confidenciou que aquela a quem o afecto o obrigava, mas a quem ainda não experimentara a carne e o molho, carregava já no ventre fruto de alheio, sim, mas não de alheio qualquer. O outro, o autor do serviço, era maior do que todas as gentes e coisas e todos os tempos, pai de tudo, e, por isso, sem convocar o acto da vergonha, apenas pela ideia, ideia santa, tão feita de nada quanto o vento, logrou ele semear varonil vida dentro de Maria. E mais disse o fantasma a José, que devia ele sentir-se honrado com o feito e acolher Maria, cachopa ainda por inaugurar, pois aquele que por ela seria parido viria agraciado com a faculdade de redimir os pecados de quantas gentes no mundo houvesse. Aurora mal feita, ainda estremunhado, ergueu-se José do leito e, fazendo fé na memória do sonho, procurou Maria, para que viesse ela para o lar, consentindo ele, com tal gesto e a estipêndio da própria honra, que o que brotasse dela, embora inocente ele fosse no caso, seu filho seria sem ser. O Marquês.

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2004-12-15


O jogo. Provavelmente não há sensação mais filhadaputa do que a dos derrotados antes do jogo acontecer. Dessa sensação, espécie de miséria interiorizada, parecem padecer umas quantas criaturas, como o senhor dr. Nuno Melo, soba da tribo popular parlamentar, que insistem em saber o que fará a malta do PS caso vença as próximas eleições legislativas sem maioria absoluta. Que logo se vê é a resposta óbvia. Porém, os sôfregos, os fulanos do CDS/PP e do PSD querem saber já como é que será. Eles, em Março de doismiledois, podiam não saber como é que seria, mas agora, para Fevereiro de doismilecinco, já sabem. E sabem já isso porque não há melhor cimento para as conveniências do que o poder. É essa uma das regras do jogo. Jogo que ganha quem fingir ter mais vergonha. Nicky Florentino.

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Roubar é. Acontece-lhe a ele utilizar frequentemente o corredor chamado Áum para correr para a capital da pátria e para dela fugir. Ultimamente, porém, a corrida tem que ser mais lenta, havendo em alguns dias, mesmo, a necessidade de serpentear, em slalom, uma parte do circuito. Até aqui tudo bem. O exercício faz bem. Também aos automóveis. O que o incomoda é, quando chega ao destino, a cotação do recibo. Se o serviço prestado pela Brisa, SA é pior, por qual raio o preço a pagar é o mesmo? Bandidos!, exclama ele. Apenas porque não lhe ocorre chamar-lhes filhos da puta, aos da sociedade anónima. Segismundo.

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Incêndio d’alma. Mau, maumaria. Na mão direita, a mão exacta, ele segura um livro. Scliar, Moacyr (milnovecentosenoventaenove), A Mulher que Escreveu a Bíblia, São Paulo, Companhia das Letras. Na mão esquerda ele segura um outro livro. Penrose, Valentine (milnovecentosesessentaedois, milnovecentoseoitentaequatro), Erzsébet Báthory. La Contesse Sanglante, Paris, Éditions Gallimard. Para reler. O que significa que os demónios, lestos, lhe vão entrar no domicílio do juízo. Mau, maumaria. Outra vez. Segismundo.

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Natividade. A anunciação segundo L., o terceiro escrivão dos factos. Ela chamava-se Maria. Ele chamava-se José e de arte e ofício era marçano. Um dia, era a Primavera ainda breve, estugados começavam a ser os dias, quando, depois da jornada na carpintaria, chegado à casa do matrimónio, soube o José, que ainda não havia ousado afundar a sua virilidade na carne de Maria, que no bucho dela raiava uma esperança de gente. O José, homem sabedor a olho de quanto solho é necessário para cobrir o chão de uma cabana, estranhou o facto. Porque não adivinhava o que era isso da ficção científica, conhecia ele que à gente não acontece o que acontece às papoilas, geração espontânea. E que era então ainda ditada ordem da natureza que para encher o ventre de uma mulher necessário era que, antes, um homem se lhe chegasse e mais. Quis ele, pois, e por compreensível motivo, esclarecer o mistério e saber a causa do facto. Contou-lhe Maria, então, que uma libélula, com grandes asas, lhe havia falado. Que se chamava Gabriel, a dita libélula. E que lhe havia calhado a ela, imaculada, ainda não dada a qualquer homem, a graça de nutrir no seu seio uma semente de vida soprada para dentro de si por divina e superior vontade. Também a ela lhe pareceu estranho o facto. Mas persuasiva foi a libélula, informando Maria que alguém há que tudo pode e que incrédula ela não devia estar, pois Isabel, sua parente e esposa do sacerdote Zacarias, apesar de infértil como chão de cinza e velha, ia já no sexto mês de graças, por atendida haver sido a súplica do respectivo marido, desejoso de prole. Não esboçou Maria a intenção de ouvir Zacarias sobre o caso. Sabia ela que o velho andava mudo desde um dia em que, em funções de ordem à turma, queimara incenso no altar do santuário. Por isso, sem poder falar, nada ele lhe poderia dizer ou confirmar. (O desgraçado do velho Zacarias recuperou a fala apenas depois de Isabel ter parido um varão, quando foi necessário confirmar o rótulo de identidade, João, que, contra a ordem da firme tradição, a sua consorte determinara ao filho). Perante tais circunstâncias e sem fontes outras de socorro, dispôs-se Maria a acreditar na mensagem que a libélula lhe transmitira. Até porque, se se confirmasse o dito, por não ser estimada faculdade de qualquer espectral força emprenhar mulheres, especial e santificada devia essa força ser. E nisto o crédulo e pio José acreditou também. Assim se fazendo pai de um filho que não era seu. O Marquês.

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2004-12-14


Tempo(s). Uma das desgraças da modernidade tardia é o facto de o futuro não poder acontecer. Antes o futuro podia acontecer, acontecia. Agora já não. Ou seja, como costuma dizer-se, o futuro já não é o que era. Prova disso é que o PSD e o CDS/PP conseguem acordar um consórcio partidário pós-eleitoral, mas não ante-eleitoral. O que, aliás, não parece manobra atinada. Pois, como é sabido por qualquer gentio, não se deve guardar para amanhã o que pode fazer hoje. Nicky Florentino.

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Alguidar. Eita!, eita!, há novela. A Charlotte, pum!, embirrou com o Paradoxo. E, antes, vice-versa. Segismundo.

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Fraqueza. É compreensível que a preguiça vença. A preguiça é uma força extraordinária, síntese do mundo, sensação plena e prazenteira. Incompreensível é que vença a falta de paciência, essa miséria civilizada, acartada para dentro, para o corpo, para a disposição, pela puta da vida. Segismundo.

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Espera. Aconteceu-lhe uma tarde diferente das outras. Porque esperou, ouviu ele quatro estórias, inteiras, sobejamente bordadas a caralhos e foda-ses, sobre o corte de barba a mortos. Segismundo.

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2004-12-13


Do (des)governo que se anuncia. Disse o senhor eng.º Sócrates, “sem triunfalismos, nem arrogância, não queremos a maioria absoluta para desprezar a oposição, nem para deixar de ouvir os outros, nem para não ligarmos ao parlamento. Queremos a maioria absoluta para que Portugal possa ter um Governo preocupado apenas com a governação e possa aplicar um projecto coerente e capaz para que o país possa vir a ter um Governo estável”. Ou seja, sumariando, o senhor secretário-geral da trupe socialista pretende a maioria absoluta para que Portugal possa ter um governo preocupado apenas com a governação, para que o país possa vir a ter um governo estável. Como é óbvio, o trambelho não bate assim. Ou isso ou, então, o senhor eng.º, com a fronha sisuda, quando disse o que disse, estava a gozar com o pagode. O que quer que seja, pudor é que não é. E isso devia ser, ser sempre, franquia, conditio sine qua non, para assomar ao Governo. Nicky Florentino.

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Maternidade. Talvez ninguém seja mais perigoso dos que as mães, as verdadeiras mãezinhas, as que insistem em reinaugurar o mundo com os seus filhos e que os julgam intrinsecamente virtuosos. Segismundo.

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Fogo guardado. Se pertencesse a uma tribo de índios, eu seria a gaja que faz fogo, disse-lhe ela, com empinado orgulho, orgulho incendiário, enquanto, junto à lareira, com a tenaz, manipulava a lenha e a entregava às chamas. Segismundo.

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2004-12-12


Ícones. Consta do catálogo do museu da Presidência da República um boneco de peluche. Está bem. Os catraios têm o direito a brincar com a República. Mas não são apenas os putos que têm esse direito. Também os maduros o têm. E não apenas os do costume, os senhores. Por isso, pergunta-se, para quando uma boneca insuflada?, com os seios desnudos, que celebre convenientemente a intrépida Marianne. Nicky Florentino.

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Puerilidade. Há fatalidades assim, como o destino. O Pedro, primeiro chegado ao Mestre André para jantar, já antecipara que, de todos os motivos de embirração com ele que a Catarina (o)usava enunciar, apenas um – és infantil – o atordoava e obrigava a um combalido silêncio. Entretanto a Catarina chegou. Provavelmente, antes, lá fora, beijou a Helena. Beijou o Pedro. Beijou o Domingos. Estendeu a mão ao outro. Estendeu a mão à outra. Sentou-se. Pôs-se à conversa. E, como um pêndulo em oscilação exacta, após tantos sorrisos, lá acusou a suposta infantilidade do Pedro. Os restantes comensais testemunharam. Ele há rapazes, como o Pedro, que conseguem antecipar o futuro. Pois desgraçadamente acontece que o futuro lhes vem do passado. A puta da vida, às vezes, parece perseguição. É o que é. Segismundo.

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Salubridade pública. Ontem. Gentios, aos molhos, agregados em família ou soltos, deambulavam abundantemente pelo Chiado. Incomodando. Irritando. O povo quando sai à rua, porque é grande e feito de muitas parcelas, é assim, sempre, um estorvo para o trânsito e para o estacionamento. Para além disso, sequer disfarçam a miséria. De tal modo que se percebe que o máximo de dignidade possível que conseguem é serem consumidores. Talvez o maior de todos os desvastadores problemas ecológicos. Segismundo.

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Amortanásia. Á não ama bê. Bê ama á. Que fazer? Bê deve esforçar-se por deixar de amar á. Se o esforço não surtir efeito, há uma única solução. Insistir no esforço. Até alguém, á ou bê, morrer. Morrer de qualquer forma. Porque, quando se é desamado, insistir no amor é uma forma de adiar a morte do que está condenado. E, quando se é desamado, adiar a morte do que está condenado é uma forma estúpida de morrer. Talvez a mais estúpida. Pois ninguém merece deve ser mortalha de si-mesmo. Segismundo.

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2004-12-11


Diálogo sobre estética. Ela, por que é que não gostas de falar sobre os filmes e as peças que viste?, sobre os discos e os concertos que ouviste? ou sobre os livros que leste? Ele, porque o que me interessa é a experiência da visão ou da audição, não a reflexão sobre o que motivou essa experiência. Ela, em tom de voz a evoluir para a indignação, não acreditas na estética?, achas desnecessário o juízo estético? Ele, alguém escreveu, não recordo quem, a estética mais não é do que uma fisiologia aplicada... Ela, Nietzsche, foi Nietzsche quem escreveu isso. Ele, ... e eu tendo a concordar. Ela, isso parece-me uma atitude selvagem, de besta, de saqueador, que se aproveita das coisas e não as partilha com os outros, de egoísta. Ele, talvez seja, mas, sem esforço, estou convencido que, mais do que o egoísmo, o que sustenta tal atitude é a falta de paciência. Ela, pois... isso ou a incompetência estética. Segismundo.

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2004-12-10


Da (r)existência. Esta, “Das Nicht ist das Nicht des Seienden und so das vom Seienden her erfahrene Sein”, é provavelmente a frase que mais vezes ele se atreveu a ler em alta voz. Manias. Assim como repetir ad nauseumDas Subjekt existiert nie zuvor als »Subjekt«, um dann, falls gar Objekte vorhanden sind, auch zu transzendieren, sondern Subjektsein heiβt: in und als Transzendenz Seiendes sein”. Segismundo.

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O circo democrático. O senhor presidente da República, antes de consultar os partidos políticos que têm afectos seus abancados no parlamento ou de ouvir as personagens que compõem o Conselho de Estado, entendeu que, com a actual paisagem parlamentar, se tinham esgotado as hipóteses de regeneração governamental. Entendeu ele e, antes dele, entenderam um ror de almas que assim podia ser. É por isso que o mandato dos senhores deputados é temporalmente limitado. E se realizam periodicamente eleições legislativas. Ora acontece que o senhor dr. Jorge Sampaio não esteve para esperas. E decidiu antecipar as eleições. Como se fosse preciso animar a malta. Está mal. Mas está bem. Pois, na pátria, a (des)ordem política a que se tem a mania de chamar democracia é um festival. Circense. Não, chiça! – e ainda bem –, uma forma de governo. Nicky Florentino.

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O grande eleitor. O episódio da dissolução da Assembleia da República suscita perplexidade, no sentido em que, por ele, foi revelado algo que surge contrário a uma concepção serena – e, por isso mesmo, cínica – do que é a democracia. A democracia é uma ordem política escorada num conjunto de princípios, um dos quais a soberania popular. Se o senhor presidente da República foi eleito, também a Assembleia da República, ainda que a granel, foi eleita. Não faz sentido, pois, que uma entidade eleitoralmente constituída possa sobrepor-se a outra também eleitoralmente constituída. A não ser, claro, que, no caso vertente, se considere o senhor presidente da República um, o único, grande eleitor da pátria. Mas, se assim for, que não se chame democracia à pátria «democracia». Pois o grande eleitor não é – e tão pouco substitui – o colégio de gentios chamado povo. É, antes, um xis, uma incógnita qualquer. Tipo bola de flippers. Que, depois de lançada, é difícil em controlar. Nicky Florentino.

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Código. O senhor presidente da República não logrou impressionar a embaixada do CDS/PP que o visitou ontem. É que, segundo o senhor dr. Pires de Lima, porta-voz da dita cuja seita, permanecem por descodificar as “razões ambientais e subjectivas” a pretexto das quais vai ser assinado o decreto de dissolução do parlamento. É isto um exemplo de marrar contra o comboio. Ou seja, é uma forma, entre outras, de confirmar com a cabeça a rijeza do aço. Nicky Florentino.

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O senhor silêncio. Prometido, o senhor presidente da República vai discursar hoje. Para informar os gentios do que eles já sabem. Que, olha a novidade!, vai dissolver o parlamento. Preferível, pois, era que estivesse caladinho. Nicky Florentino.

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2004-12-09


Escanção, política e sulfato. Em política o problema, o verdadeiro problema, nunca é um problema a jusante, de output, de safras. É, antes, um problema a montante, de input, de castas. Porquanto é um problema que vem da cepa. Nicky Florentino.

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Filho da mãe. Ele foi ao baú resgatar Show no Mercy, dos Slayer, e Master of Puppets, dos Metallica, para ouvir no carro, durante a viagem para a capital. No curso de uma curta boleia, ao ver os compactdiscs, a mãe dele impressionou-se e não conteve a surpresa. Voltaste a ouvir isto?, perguntou-lhe. Ele não respondeu. Ao mesmo tempo que se reservou no silêncio, aumentou o volume do som debitado. Para ela a viagem seria curta, mas seria a doer. Mãe é também para isto, sofrer, quando os filhos recapitulam a adolescência. Se recapitulam. Pois é próprio dos filhos, pelo menos aos olhos das progenitoras, das mãezinhas, estarem sempre a crescer. Por isso, ser filho é não ser crescido. Segismundo.

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2004-12-08


O povo miúdo à solta. Como o Francisco ilustrou, o povo é assim mesmo, fodido. E desde pequenino. Nada a fazer. O povo reproduz-se como as papoilas. Tipo geração espontânea, geração após geração. Nicky Florentino.

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O outro lado da força. Segundo Dewey, amén!, “a democracia é uma forma de governo apenas porque é uma forma de associação moral e espiritual”. Ou seja, democracia também é sinónimo de seita. Nicky Florentino.

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Vox populi. Disse a senhora, uma popular de um lugar qualquer do mapa português onde ocorreu um homicídio presumivelmente mandado, "não é assim que se mata uma pessoa". Segismundo.

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Suave veneno. Hoje, se há um destino, a aproximação será feita a ouvir The Mind Is a Terrible Thing to Taste - a canção Burning inside várias vezes, porque é daí o refrão que lhe troa na cabeça - e a velocidade superior à permitida por lei, decidiu ele. Segismundo.

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Causa de amante errante. Não se pode lutar contra o desamor, se o amor, nada prometido, não é isso, gesto visível, pequeno ou pronunciado, mas distância, feita em quietude e silêncio. Segismundo.

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Bolsa dos amantes. O amor não é uma obrigação. É uma acção. Sem cotação. Segismundo.

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E vuele di’ e llà, chello che vo’la femmena fa! As mulheres merecem a liberdade de serem livres. Os homens também. Está frio lá fora. O meu corpo arrefeceu. Estás longe, fugiste, eu sei. E o incêndio da espera por ti esmorece. Sabes?, há dias que quase não noto a tua ausência. Sinto a aproximar-se o tempo do adeus, do adeus indolor, sem remorso. Sinto que se aproxima a partida, a ida sem retorno. Sinto que se aproxima... E falta-me a vontade de gritar, de esperar mais. Faltam-me as palavras também. Por isso calo-me, faço-me silêncio. Sinto que estou a ir para longe, como tu já foste. E não sei se, quando for, vou tornar, tornar à espera, tornar a esperar. Agora vou dormir. Até amanhã. Escreveu-lhe ela. Segismundo.

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Para além da inocência. Rodolfo era tido como tantos outros, rapaz de costumes certos e bons, exemplar, um inocente. Ninguém jamais suspeitou da besta, besta brava, que ocasionalmente despertava nele e lhe convocava os gestos para o mal. A descoberta do seu outro lado, bestial e perigoso, aconteceu num sábado, à noite. Nessa ocasião, estava ele soturno, sentado na taberna, soou-lhe com estranha nitidez, dentro da cabeça, Dies iræ do Requiem de Dvořák. Era a senha necessária para dele sair a sanha bruta. Logo ali sovou dois convivas até à morte. E depois, como se divinamente mandatado, prosseguiu a missão. O Marquês.

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2004-12-07


Cábum! Não é apenas sobre a cabecita dos gentios que, ocasiões assim há, o céu se precipita com estrépito. Ocasionalmente acontece o mesmo sobre a cabeça dos senhores. Foi o que aconteceu com as criaturas em deputação e que são parte do consórcio partidário que escora o Governo. Andavam convencidas que a ordem política era parlamentar e, agora, súbito, sem prévia sinaléctica, o senhor presidente da República fez constar que, afinal, a ordem é semi-presidencial. A pátria é dada a estas indefinições. E a consciência delas só brota quando tais bizarrias são recuperadas e tornadas evidentes. Nicky Florentino.

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Expiação do nome da coisa. Disse o senhor dr. Durão Barroso, “a palavra identidade é uma palavra perigosa”. A palavra Europa, essa, soa-lhe bem. E melhor ainda lhe soa, por mais simpática ser, a expressão presidente da Comissão Europeia. A palavra identidade é que, abrenúncio!, convém banir do léxico. Vá lá saber-se por que atinado motivo. Nicky Florentino.

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Captações, xxii. Em Los Siete Locos. “Quando se encolerizava, os seus rugidos sobressaltavam a canalha que o temia. Manobrava-a utilizando uma violência surda. Um perdulário fazia mais escândalo do que o tacitamente tolerado, e de repente o dono da taberna aproximava-se, o agitador já sabia que o outro lhe bateria, mas aguardava em silêncio, e então o gigante descarregava com o fio do punho terríveis golpes no crânio do culpado.
Um silêncio divertido acompanhava o castigo, o desgraçado era lançado à rua a pontapés, e as vozes renovavam-se injuriosas e ressonantes, despejando nuvens de fumo na direcção do envidraçado quadrilátero da porta. Por vezes entravam nesse antro músicos ambulantes, normalmente um bandoneão e uma guitarra.
Afinavam os instrumentos e um silêncio expectante encurralava cada fera no seu canto, enquanto uma tristeza movia a sua invisível ondulação naquela atmosfera de aquário.
O tango do cárcere erguia-se plangente e os miseráveis acompanhavam inconscientemente os seus rancores e as suas infelicidades. O silêncio parecia um monstro de muitas mãos que levantava uma cúpula de sons sobre as cabeças tombadas no mármore. Quem sabe o que pensariam! E essa cúpula terrível e alta, que invadia todos os peitos, multiplicava o langor da guitarra e do bandoneão, divinizando o sofrimento da puta e o horrível aborrecimento da prisão que belisca o coração quando se pensa nos amigos que estão fora, apostando até a própria vida.
Nessa altura, nas almas de latrina, nos focinhos mais porcos, explodia um tremor ignorado; depois, tudo passava e não havia uma mão que se estendesse para deixar cair uma moeda no chapéu dos músicos”. Segismundo.

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Labor. Trabalho, trabalho... A vida dele começa a atrasar-se. Não são mãos ou braços que lhe faltam. Também não são os tempos, dias ou horas. Falta-lhe a paciência. Puta de vida. Segismundo.

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Elizabete. Eram da cor do sol os cabelos de Elizabete, dourados, como se fossem fios de ouro, um tesouro. Eram eles, com o seu brilho, que lhe iluminavam a face, alva, alvíssima, pálida como toda a demais pele do seu corpo. Com manias de brasonada e convicta da sua beleza, Elizabete dedicava meticulosos cuidados a si e, em particular, aos seus cabelos, fosse na lavagem, com essências e extractos vegetais que lhes emprestavam perfume e aveludada maciez, fosse na escovagem e penteio. Três eram as aias, com dedos finos e longos, encarregues de velar pelos seus cabelos. Um dia, uma delas, enquanto entrançava os cabelos e, entre eles, dispunha um cordão de pérolas, para além de ter feito um arranjo inestético, magoou Elizabete. Como consequência, uma pequena dor, do aguda, entrou em si, por um fio capilar. Então, virou-se para a aia, olhou-a com inundada raiva e, como se possessa estivesse, cravou as suas tratadas unhas nas decobertas carnes da imprudente aia, face e mãos, rasgando-as e descobrindo-lhes o sangue. Poucas gotas de sangue caíram-lhe sobre uma das mãos e, por a terem rosado levemente, pareceu a Elizabete terem tonificado a sua pele. A partir desse instante começou a sangrar as jovens que a serviam. Consta que por estar obcecada com a sua beleza e pretender preservar a sua jovialidade da erosão que o correr do tempo transporta. Mas não foi tanto essa obsessão que a motivou. Foi sobretudo a alegria, o gozo de assistir ao martírio sangrento das vítimas. Isso, mais do que qualquer seiva essencial de virgem vertida em selhas de banho, era o bálsamo da sua epiderme. Foi também isso a sua desgraça. O Marquês.

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2004-12-06


Fácil era a reforma se. Pouco importa se a revisão do regime de constituição dos órgãos municipais seria um golpe porque feita nesta oportunidade, como sustenta o Daniel, ou seria um «golpe» porque sim, como defende o Filipe. O que importa, se importa, é que
alínea a, o regime vigente é uma aberração, por conceber a existência de um órgão executivo e de um órgão deliberativo constituídos por vias eleitorais distintas;
alínea b, não obstante isto, a defesa frenética da hipótese de os executivos municipais ditos politicamente homogéneos ser garantia suficiente de melhores condições de governabilidade autárquica apenas faz sentido se se entender o exercício de governo como acção impositiva e não como acção deliberativa;
alíena c, se o consociativismo é uma porta para o lodo político, as maiorias absolutas – sejam alcançadas eleitoralmente ou garantidas administrativamente –, tendentes à reprodução, não o são menos;
alínea d, a Assembleia Municipal, por efeito da lógica dos processos políticos locais, tende a ser um órgão dependente, quando não um órgão colonizado pelo senhor presidente da Câmara Municipal;
e alínea e, nenhuma proposta alguma vez ousou, de facto, dotar a Assembleia Municipal de competências suficientes que lhe permitissem o exercício consequente do controlo político sobre a Câmara Municipal – convém não iludir que, se um vereador dito da oposição já tem dificuldades de sobejo em acompanhar o que acontece na Câmara Municipal, não se percebe como é que um membro da Assembleia Municipal, órgão que reúne poucas vezes mais do que os dedos de uma mão, conseguirá isso com maior eficácia e eficiência. Nicky Florentino.

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Em pó. O BE, pretende o senhor Prof. Doutor João Teixeira Lopes, “é hoje uma força socialista de resposta imediata”, tipo instantânea. Porém, instantânea por instantânea, antes a mousse ou a gelatina. Nunca uma força socialista. Que, para além de amarga, é ração indigesta. Nicky Florentino.

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Exercício botânico. Imagine-se um malmequer. Imagine-se que uma das suas pétalas é o senhor dr. Santana Lopes. Que outra é o senhor eng.º José Sócrates. Que outra é o senhor dr. Paulo Portas. Que outra é o senhor Jerónimo de Sousa. Que outra é uma coroa de cabeças, as do senhor Prof. Doutor Francisco Louçã, do senhor Prof. Doutor Fernando Rosas e de mais umas quantas criaturas, coroa a fingir paritária. Que outra é o senhor dr. Jorge Sampaio. Que outra é o senhor dr. Mário Soares. Que outra é o senhor Prof. Doutor Cavaco Silva. E que as outras correspondem a personagens afins, como o senhor eng. António Guterres, o senhor Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, o senhor Prof. Doutor Freitas do Amaral, o senhor dr. Marco António ou qualquer outra criatura sinistra. Imagine-se, agora, que se arrancam as pétalas, uma a uma, dizendo ao mesmo tempo, alternadamente, mal me quer, mal que quer. Como surge óbvio, a brincadeira não tem piada porque admite apenas uma hipótese. O que significa que, qualquer que seja a última pétala arrancada, mal me quer, o jogo é sempre a perder. Nenhuma outra hipótese pode acontecer. Ou acontecerá. É para que não haja ilusões. Nicky Florentino.

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A hiena que ri. O Rodrigo leu a assanhada prosa da senhora Doutora Maria Filomena Mónica e riu-se. Riu-se três vezes. Compreende-se. A prosa era risível. Embora ele, o Rodrigo, pareça ter-se entregue ao riso por outro motivo. Por o motivo da prosa assanhada da senhora Doutora Maria Filomena Mónica ser o senhor Prof. Doutor Boaventura de Sousa Santos. É também para rir. É um motivo como qualquer outro. A puta da vida é assim mesma. Segismundo.

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Olhar o mar. Ele estranhou, quem telefonava e a hora do telefonema, mas atendeu o telefone. Queres ir à praia?, perguntou uma inesperada voz do outro lado. Quero, respondeu ele. E foram. Segismundo.

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2004-12-05


Não à vontade dos outros. Jamais aceder a solicitação de arrumador de automóveis, adicto ou não, para lhe proporcionar oportunidade de conseguir mais moedas. Pois isso, aceder, é atitude que pode gerar prejuízo. Fala a experiência. Portanto, sentença, tous pour un et chaque un pour soi. Segismundo.

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Por que é que o cromo é repetido? Por alguns artigos seus, estampados na pátria imprensa, a senhora Doutora Maria Filomena Mónica parece uma criatura de tal modo destemperada que, como confessou ela outrora, chega a desesperar. Isto aconteceu-lhe. Após diversas diligências infrutíferas junto de um ror de burocratas, chegou ela a apelar a um senhor governante no sentido de lhe serem facultados uns quantos programas referentes a não sei que disciplinas do ensino secundário. A dita fulana lá teria a sua razão para interpelar o dito senhor do Governo, porquanto, parece, uns serviços subordinados não lhe teriam, a ela, facultado o que rogava. Mas sequer por um instante lhe assomou ao juízo que os ditos programas escolares estivessem disponíveis e acessíveis no postigo electrónico do ministério da Educação. Certamente porque isso da worldwideweb lhe parece mar cavado, onde a senhora não admite pôr o pé. Quanto mais a cabeça. Podia ficar despenteada, sabe-se lá. Ou, então, porque não está disponível para tocar num rato. Por isso, foi uma familiar, mais literada em arte de navegação e orientação na net, que lhe conseguiu o que ela não logrou conseguir. Por vezes, a família é também para isto, ajudar. Assim como o trambelho, para quem tem ou não família prestável, é sempre um auxiliar recomendável. Segismundo.

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Talvez Ler. É confrangedora a candura com que a senhora Doutora Maria Filomena Mónica confessa a própria ignorância, sem consciência seja da confissão, seja da ignorância. Portugal é um país “onde não existe uma única revista de livros”, escreveu ela, em artigo estampado no suplemento literário da edição de ontem do Público. Está tudo dito. Quem não sabe é como quem não vê. Cego. E não há pior cego do que aquele que não quer ver. Porque julga que já viu tudo. Segismundo.

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L’une et l’autre. “Não vale a pena criticar soldados quando temos à mão um general. Na luta, há que apontar à cabeça”. Foi com estas duas frases que a senhora Doutora Maria Filomena Mónica culminou um artigo estampado no suplemento Mil Folhas, da edição de ontem do Público, com o título «O sociólogo-poeta Boaventura de Sousa Santos». Tem razão a senhora Doutora Mónica. Mas a razão que lhe assiste no dito não substitui a pontaria no acto. Com efeito, embora a sua intenção fosse a de mandar-se, demolidora e definitiva, à obra do senhor Prof. Boaventura de Sousa Santos, mais parece que, como um bovino daltónico, acabou a evoluir contra sombras, todas parecendo-lhe agitados espectros de tom carmim ou escarlate. É óbvio que, em tese, o referido artigo até podia ser um ensaio pedagógico – ilustrado e elucidativo –, pois não são raros ou leves os motivos que justificam crítica contundente às posições que o senhor Prof. Doutor Boaventura de Sousa Santos afirma e defende. Mas não foi isso que aconteceu. A dita senhora Doutora Maria Filomena Mónica apenas revelou preconceito e graça. O que, não obstante todas as afirmadas ou subjacentes certezas, redundou num exercício simultaneamente hilariante e patético. Que matiza mais o estilo da criatura que autorizou a prosa do que as putativas ideias do fulano que a motivou. Enfim, estão bem uma para o outro. E vice-versa. Provavelmente haverá mesmo a oportunidade de confirmar isto na réplica que, suspeita-se, não tardará. Perceber-se-á, então, que, apesar dos mútuos e recíprocos esforços de lavandaria, nem as vestes de uma, a senhora Doutora Mónica, nem as vestes de outro, o senhor Prof. Doutor Santos, estão lavadas. E a culpa, seguro, é tão só do detergente ou do sabão usado. Não da água. Ou das mãos emprestadas à lavagem. Nicky Florentino.

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2004-12-04


Controlo da excitação. Garantiu o senhor presidente da República que, apesar de tudo, pretende manter o controlo emocional. O que significa que o fulano que chora não se comove perante a hipótese de dissolução da Assembleia da República. Ora aí está mais um indício que suscita estranheza. Nicky Florentino.

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Psitacismo. A conversa sobre a Europa não dever ser uma associação cultural e recreativa cristã, um clube cristão, não é nova. Ulrich Beck, nomeadamente, popularizou-a. E o senhor dr. Durão Barroso dela fez eco na entrevista que concedeu ao Expresso. Mas, como um autêntico papagaio de corrida, sem conferir crédito à fonte. Nicky Florentino.

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Diferenciação. Afirmou o senhor dr. Santana Lopes que, neste momento, a convocação de um congresso do PSD seria imoral. Imoral... Pode ser um acto estúpido. Insensato. Extraordinário. Destrambelhado. Mas imoral é que não é. Pois a política é uma ordem. E a moral é outra. Cada uma com o seu código. Que o malogrado Luhmann disse serem estruturalmente avessos e insolúveis um no outro. Ou seja, política é política, moral é moral. Nicky Florentino.

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Diga trinta e três. Conta a lenda que um tal Pedro que tinha andado à pesca com Cristo negou, negou três vezes antes de o galo cantar, conhecê-lo. Ao senhor dr. Pedro Santana Lopes aconteceu ouvir, diz ele, o senhor presidente da República a garantir, garantir três vezes, que não tinha intenção de ordenar a dissolução do parlamento. Há nisto um qualquer padrão. A desgraça. Por isso, a expectativa, agora, é saber quem é que será cravado no cepo crucífero. Nicky Florentino.

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2004-12-03


Melindres de manso. O senhor dr. Mota Amaral sentiu-se magoado por não ter sido previamente informado pelo senhor dr. Sampaio da sua intenção de mandar a dissolução da Assembleia da República. É compreensível. Assim como é compreensível que, depois de ter conversado com o senhor presidente da República, o senhor dr. presidente da Assembleia da República tenha dito que compreendia que às vezes fulanos há que se esquecem do que é suposto não se esquecerem. Como soe dizer-se, shit happens. Porém, a mansidão, mesmo beata, nunca foi virtude. E o fingimento também não. Nicky Florentino.

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Captações, xxi. Em Los Siete Locos. “Ele já não tinha qualquer esperança, e o seu medo de viver tornava-se mais poderoso quando pensava que jamais teria ilusões, quando obstinadamente fixos os olhos num recanto do quarto, reconhecia que lhe era indiferente lavar pratos num restaurante ou ser criado num prostíbulo.
Que lhe importava! A angústia arrastou-o para o seio de uma multidão de homens terríveis que durante o dia arrastam a sua miséria vendendo artefactos ou bíblias, percorrendo ao anoitecer os urinóis onde exibem os seus órgãos genitais aos rapazinhos que entram nos mictórios espicaçados por outras ansiedades semelhantes”. Segismundo.

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Vida é. Jantar, comer bife, com o Zé Vitório nos Bons Amigos, ambiente bas fond. Já depois das três da madrugada. Segismundo.

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Carícias malícias. Ele deu-lhe, a ela, música, como quem semeia a inveja. Segismundo.

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Rock n’crawl. A rainha do rock n’crawl chama-se, confirmado, Mão Morta. Segismundo.

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2004-12-02


Lapsus republicano. Por lapso, o senhor presidente da República esqueceu-se de informar o senhor presidente da Assembleia da República que pretendia ordenar a dissolução do parlamento. O esquecimento nunca foi acto cortês. É por isso que o respeito é lembrar. Nicky Florentino.

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Abuso. O José quando se entusiasma tende a exorbitar, chegando mesmo a implicar tudo e todos em ondas, vagas de fundo, de apelo de boa vontade ao senhor Prof. Doutor Cavaco Silva. Tudo é muita coisa. Assim como todos é muita gente. E, entre todos, há seguramente nomes que não se devem invocar em vão. Seja como for, na lotaria dos cadáveres políticos putativamente salvíficos, pode acontecer que o calhado venha a ser, de facto, o senhor Prof. Doutor Cavaco Silva. As desgraças acontecem. Porém, mesmo que assim seja, a nova vez em que tal fulano assomar a senhor primeiro-ministro é a vez da farsa. Pois a vez da tragédia, a vez autêntica, essa, já foi. Antes. Nicky Florentino.

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Quando deus falha. Está tudo pior. E não há um deus capaz, possante e temível, como o do Levítico, que nos valha. E isso é que era necessário. Segismundo.

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Sono divino. Se deus não dorme, suspeita-se, o sétimo dia está ainda para acontecer. Puta demiurgia. Segismundo.

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Da inveja à posse. Ele, sabes?, às vezes invejo-te. Ela, nisso estás melhor do que eu, pois eu quero-te. Segismundo.

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2004-12-01


Tudo como antes. O senhor presidente da República pode dar voltas e voltas ao juízo ou ao baralho, mas não conseguirá detectar ou discernir agora qualquer motivo para justificar a decisão de dissolver o parlamento que, há uns quantos meses atrás, não pudesse detectar ou discernir já. Antes, por vaidade, ganância ou o raio que o parta – pela pátria é que não foi! –, demitiu-se o primeiro-ministro. Anteontem demitiu-se um mero ministro cujo nome faz lembrar as Chaves do Areeiro. É essa, desde então, a única novidade politicamente relevante. Nicky Florentino.

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Agenda. Um de Dezembro, Kimmo Pohjonen, Teatro Académico Gil Vicente. Dois de Dezembro, Mão Morta, Santiago Alquimista. Segismundo.

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Feriado. Ela dorme. Ele não. Não foi por isto a restauração. Segismundo.

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Elizabete. ... O Marquês.

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