Captações, xxii. Em Los Siete Locos. “Quando se encolerizava, os seus rugidos sobressaltavam a canalha que o temia. Manobrava-a utilizando uma violência surda. Um perdulário fazia mais escândalo do que o tacitamente tolerado, e de repente o dono da taberna aproximava-se, o agitador já sabia que o outro lhe bateria, mas aguardava em silêncio, e então o gigante descarregava com o fio do punho terríveis golpes no crânio do culpado.
Um silêncio divertido acompanhava o castigo, o desgraçado era lançado à rua a pontapés, e as vozes renovavam-se injuriosas e ressonantes, despejando nuvens de fumo na direcção do envidraçado quadrilátero da porta. Por vezes entravam nesse antro músicos ambulantes, normalmente um bandoneão e uma guitarra.
Afinavam os instrumentos e um silêncio expectante encurralava cada fera no seu canto, enquanto uma tristeza movia a sua invisível ondulação naquela atmosfera de aquário.
O tango do cárcere erguia-se plangente e os miseráveis acompanhavam inconscientemente os seus rancores e as suas infelicidades. O silêncio parecia um monstro de muitas mãos que levantava uma cúpula de sons sobre as cabeças tombadas no mármore. Quem sabe o que pensariam! E essa cúpula terrível e alta, que invadia todos os peitos, multiplicava o langor da guitarra e do bandoneão, divinizando o sofrimento da puta e o horrível aborrecimento da prisão que belisca o coração quando se pensa nos amigos que estão fora, apostando até a própria vida.
Nessa altura, nas almas de latrina, nos focinhos mais porcos, explodia um tremor ignorado; depois, tudo passava e não havia uma mão que se estendesse para deixar cair uma moeda no chapéu dos músicos”. Segismundo.