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Albergue dos danados

Blog de maus e mal-dizer 

2007-01-31


O regime de todos os enganos. O senhor dr. Luís Marques Mendes entende que a pergunta do referendo do próximo dia onze de Fevereiro, cuja respectiva aprovação subsidou com o seu voto no plenário da Assembleia da República, é uma pergunta enganosa. É isto ou a puta da desfaçatez ou o máximo possível da cowboyada em política, uma criatura cuspir sobre si para não se enganar. Nicky Florentino.

Referência



Livro dos rogos, iii. Fode-me, mas não com a ternura de carpinteiro.. Segismundo.

Referência


Bons motivos pro «não», iv

Segismundo.

Referência



Corpo em jamais vu. A identidade é uma das condições de arremesso de alguém, seja contra si, seja contra outrem. Segismundo.

Referência



Acédia. Todos os dias ele assenta a mesma confissão, a culpa pertence-me, o tempo não. Todos os dias, não dia sim, dia não, não um dia qualquer ou um dia de vez em quando, não. Todos os dias, exactamente todos os dias, como se fosse uma obsessão, ele assenta a tal culpa. Todos os dias. Tantos que, agora, embora continue a assentar, o assento já não é confissão. É memória, confronto diário, reflexo, repetição, confirmação da demora, acusação de si a si. Culpa, apenas culpa. Segismundo.

Referência

2007-01-30


Ainda o regime bellum omnia omnes. Tanto Hobbes quanto Spinoza sustentaram que há uma diferença significativa entre demos e multitude. Por outras palavras, uma coisa é o povo constituído, sob juízo, em ordem e representado, outra coisa é o colégio de gentios, conjunto de exaltados, assanhados e empregues em si mesmos enquanto turba, largados na rua. Neste sentido, a «rua» é um mundo e, se é instituição, é uma instituição informe, dúctil, irresponsável, tudo e nada, uma instituição não institucional. Daí que contra a «rua», para a ultrapassar e controlar os seus efeitos potencial e provavelmente perversos, seja necessário constituir instituições duras, de segunda vontade, de segunda ordem, sine ira et studio. É um facto que a «rua» é autêntica e suscita atenção. Porém, a «rua» não é um corpo representado, são os corpos presentes, volantes. A «rua» sobretudo clama, reclama, transpira e uiva. Ou seja, a «rua» é popular, não é democrática. É por isso que há uma tensão entre a «rua» e as instituições duras e certas, cínicas, de gabinete. Na prática, de um lado os gentios soltos, do outro os senhores resguardados. Pelo que, seja na urgência, seja na paciência, ninguém nos vale. Nicky Florentino.

Referência



Livro dos rogos, ii. Fode-me, mas não com a tua alma, que é pequena. Segismundo.

Referência


Bons motivos pro «não», iii

Segismundo.

Referência



Página do livro dos espectros, ii. A tua mãe não te ensinou os silêncios, ensinou-te os seus momentos apenas. É esse o teu problema, encontrar os conteúdos certos com os respectivos tempos. Segismundo.

Referência



Way down in the hole. Ela perguntou-lhe como é que te chamas?, Deus? ou Freud? Ele não respondeu, apenas sondou o motivo da interrogação, porquê?, está a doer-te? O Marquês.

Referência

2007-01-29


Demo-alucinação. Portugal é muito uma república de senhores e mandarins. São eles, o senhor Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa feliz incluído, que decidem se se convocam referendos ou não. Ora, se assim é, por qual motivo é que os gentios hão-de participar em tais simulações de deliberação democrática? Para nada, excepto confirmar que, para além do desejo ou da ilusão, a democracia que existe tem mais a ver com poder do que com povo. Sempre teve. Nicky Florentino.

Referência



Livro dos rogos, i. Fode-me, mas não com a tua cataquese. Segismundo.

Referência


Bons motivos pro «não», ii

Segismundo.

Referência



A única condição que. Entre a fauna chamada humanidade, apenas há uma identidade pior do que a de sociólogo. A de socióloga. Segismundo.

Referência



O outro lado da paixão. Olhos nos olhos, os amores, ela dele, ele dela, manuseiam o respectivo punhal, esperando as costas, uma do outro, um da outra, até que, por ela ou por ele, a morte os separe. O Marquês.

Referência

2007-01-28


O Pangloss mais zangado do mundo, ii. A minha Clarice é a Lispector, não a do Hannibal Lecter. O resto que se foda. Segismundo.

Referência



Acácia, meu amor # xvii. Corro para a carne, é esse o meu motivo, o motivo da minha necessidade também. É a carne que conquistei na caça, esta carne, que te apresento agora. Guarda-a e guarda-me contigo, meu amor. Protege-nos da invídia das outras fomes e da avidez do chão. Estamos em ti, para ti, para eu ser sobre ti, sobre a tua soberania levantada, mais alto, até à convocação da minha próxima fome ou da minha próxima sede. Eliz B.

Referência

2007-01-27


Entretanto, no sítio do pokémon amarelo. Sem que alguém se tivesse apercebido, aos três éfes da custódia antiga, os de fado, Fátima e futebol, juntou-se um quarto éfe, o de foda-se. Segismundo.

Referência



Todos diferentes, todas iguais. Não, não. Há quem entenda que menina não engravida, emprenha. Segismundo.

Referência



Fado antigo. O seu maior desejo também era o seu maior sonho, viajar no tempo, ir a antanho e regressar, como quem vai ali e volta. Um dia, após muito malabarismo quântico, proporcionou-se essa viagem. E, marcha à ré, ele lá foi pelo tempo, exactamente até a um século antes. Aconteceu que, durante a estadia no passado, foi alvejado fortuitamente por um projéctil que, numa peleja de honra, havia sido oferecido a outro destino. Ferido pelo chumbo e com a alma melindrada, tornou pouco depois ao exacto momento em que partira. Morreu de tétano. O Marquês.

Referência

2007-01-26


Twist and shout. Democracia e corrupção não são antónimos. Também não são sinónimos. Encontram-se e coexistem. Na prática, a sua conjugação é a versão twist de um paquiderme solto num armazém de porcelanas finas. Com a diferença sobretudo no facto de, em democracia, os destroços resultantes, embora também cortantes como os do armazém, serem imediatamente invisíveis. Nicky Florentino.

Referência



O ónus da prova. Disse o senhor eng.º João Cravinho, em entrevista estampada na edição de hoje do Público, “o funcionário [público] tem com a sociedade uma relação de confiança tal que há medidas que lhe são aplicáveis”. Não, não é com a sociedade. É, se for, com o estado. Porém ninguém no seu perfeito juízo tem uma relação de confiança com uma besta. Nicky Florentino.

Referência


Bons motivos pro «não», i

Segismundo.

Referência



Página do livro das febres, iii. Talvez fosse uma falha, uma falha somente, o que lhe pareceu o limiar do arquivo dos demónios. Duas, três gravuras, excessivamente perfeitas, com cuidado até ao mais ínfimo pormenor. Traço preciso. Cores sóbrias. Estavam arrumadas num círculo aberto. Portanto, num círculo que não era círculo. Também não era um semicírculo, era mais do que isso. Aumentando a escala, no entanto, percebia-se que a linha era uma corda, disposta em curva, cujas pontas não se tocavam. Alguém havia cortado a corda. Quem? Para quê? Segismundo.

Referência



Uma missão para o frio. Subiu as escadas. Na mesma mão, a esquerda, havia Artaud e Fante. Na outra mão, a direita, havia uma maçã. Segismundo.

Referência

2007-01-25


A retórica da existência enquanto regime político. Admita-se por instantes que, como enunciada, a democracia existe. Qual é a diferença? Nicky Florentino.

Referência



No vácuo, a velocidade da estupidez é superior a trezentos mil quilómetros por segundo. Ainda a notícia sobre a suspensão de mandato de uma senhora vereadora da câmara municipal de Lisboa não tinha chegado à teelvisão e já alguém falava na necessidade de uma eleição intercalar para esse órgão. É isto a puta da sofreguidão. Nicky Florentino.

Referência



Freudonírica. Ela é tão boazinha, tão boazinha, tão boazinha que até em sonhos discute com ele e ele é que é o mau da fita. Segismundo.

Referência



Anjos em chamas. Por motivos ainda não apurados, aconteceu um sublevação das criaturas do inferno. Não são compreensíveis as suas movimentações, sequer as suas reivindicações. No motim clamam repetidamente uma única palavra de ordem, morte aos extintores! O Marquês.

Referência

2007-01-24


De zen a zoo. No que é, a democracia tem os seus impérios. Também tem as suas imposturas. Valha-nos o ioga, valha-nos o pilates. Nicky Florentino.

Referência



Cravinho ou canela? Em Portugal, é estupidez legislar contra a corrupção. Por motivos vários e sobejos. O mais óbvio reside no facto de, aqui, nesta pátria pop noir, não existir corrupção. Por conseguinte, legislar contra uma inexistência, pelo reconhecimento que implica, é conferir-lhe a possibilidade de existência. A partir daí vêm todas as complicações, todos os embaraços. O que, convenhamos, não é bonito. Para além de que vital é o combate contra a erosão da orla atlântica. Essa, o mar roubar-nos o chão, é que é a nossa maior miséria colectiva. Bem, essa e o buraco no ozono. Nicky Florentino.

Referência



A comunidade e os seus totens. Circular, circulando, sem incómodo, essa era a vontade dele. Mas a velha beata perseguiu-o e insistiu. Nhanhanhanhanha, o aborto é um assassínio. Nhanhanhanhanhanhanhanha, crime, nhanhanha, prisão, nhanha, elas merecem. Até aqui tudo bem, a paciência suportou. O pior aconteceu depois. Nhanhanhanhanhanhanhanhanhanhanhanha, e assim é e assim deve ser por disposição e vontade de deus, nosso senhor, que é mais do que tudo, não acha? Limite e retaliação. Desculpe, ó minha senhora, sabe o que é o caralho?, pois, olhe, ele não está aqui, vai ter que ir para outro lugar, para onde ele esteja.. Segismundo.

Referência



Something glourious is about to happen.* A modernidade é um processo de desdita. Ou seja, ser moderno é desdizer doridamente. O que foi foi enquanto foi, já não é. Paciência. Também pode acontecer que, ao invés do que anteriormente foi admitido, nunca tenha sido. Mas isso, agora, não tem qualquer relevo. Acrescente-se «e o caralho» à equação da desdita e, então, o mundo, pleno, condensa-se numa espécie de mistério mínimo, mistério dito, mistério para desdizer. É que, com efeito, «e o caralho» é quase tudo, uma sequência longa e omnicompreensiva que se estende até ao infinito. Porém, acontece que a paciência nunca é muita, nunca alguém pretende alcançar tão longe. Pelo que «e o caralho» é o máximo possível de modernidade e economia em qualquer expressão. Só isso. Se não for, que se foda. Siga para bingo. Segismundo.

* verso da canção «Positive tension», incluída no álbum Silent Alarm (Vice Records, 2005), do grupo britânico Bloc Party.

Referência

2007-01-23



O futuro será é pior do que a Susie Derkins, a miss Wormwood e a Rosalyn, todas juntas. O Público vai mudar. A prova consubstanciar-se-á no próximo dia doze de Fevereiro. Já hoje, porém, não havia Calvin & Hobbes na última página, preenchida com uma mancha de publicidade. Sem pudor, decência ou aviso prévio, a tira de Bill Watterson foi trasladada para a penúltima página. O fim começa assim. Segismundo.
imagem © Bill Watterson

Referência



Into the white zone. Os senhores priores podem dizer o que lhes aprouver sobre o aborto. Que o aborto é uma forma de homicídio, por exemplo. A propósito do mesmo tópico houve já quem tivesse dito que “um ovo não é igual a um pinto, um ovo não tem os mesmos direitos do que um frango”. Como não é difícil admitir, ninguém tem o monopólio da sensatez. Da estupidez também. Ainda bem. Segismundo.

Referência

2007-01-22


Filho do pai. A edição de hoje do Público abre com a entrevista do tipo «Diga lá, excelência». O entrevistado é o senhor eng.º Paulo Azevedo. Alguém recorda que outras entrevistas do tipo «Diga lá, excelência» foram publicadas nas páginas dois e três do Público? Segismundo.

Referência



Portugal continua a acabar. É uma boa notícia, o mar não enrola na areia apenas. Também derruba arribas e abrasa a linha da costa deste sítio do pokémon amarelo. Na prática, pela erosão, o mar está a empurrar-nos para a meseta central. Não tardará, os nossos pés serão obrigados a assentar sobre chão castelhano. Uma espécie de redenção sobre a condenação. Uma segunda oportunidade, como a concedida à fauna após a vaga diluviana. Segismundo.

Referência



Rock 'n' road. Saber de alguém implica perguntar mais pela sua velocidade do que pela sua posição. Segismundo.

Referência



O Pangloss mais zangado do mundo, i. As mulheres são perigosas. Os homens são um perigo. Segismundo.

Referência

2007-01-21


Acácia, meu amor # xvi. A carne demora e, por demorar, é mais justa. A regra é confirmar o instinto, não o impulso. Antes de correr é necessário escrutinar um motivo. Uma vez encontrado esse motivo, correr contra ele é fácil. Mas o que vale não é a corrida, é o encontro, porque o que se pretende não é a ultrapassagem do motivo, mas a sua queda, a sua falência. Capturar é isso, precipitar as garras e os dentes sobre o que se adianta e foge. Daí que, antes, aquando o escrutínio, seja necessário vigiar, sondar o cerco pacientemente. Convocam-se todos os sentidos para aferir distâncias e precisar os ângulos de aproximação ao motivo. Esta operação cumpre-se em vagar, contra o vento, contra o tempo, corpo rés ao chão. A regra é confirmar o instinto sobre o impulso, soltar o impulso se e quando o motivo está ao alcance. Não há coordenadas exactas para o último gesto. Pode errar-se. Às vezes, mais do que se deseja, erra-se. Mas cumprido o impulso, despoletada a máquina de corrida em que existo, depois, a carne é já o destino. E antes dela apenas é a velocidade contra a fuga. Eliz B.

Referência

2007-01-20


A última fábula que nos fazia vivos. Fiama, a única das palavras que. Segismundo.

Referência



L.H.O.O.Q. Não, não, a nossa senhora de Massamá é uma espécie de círio flamejante que arde sem se ver. Segismundo.

Referência

2007-01-19


Escrutínio e juízo dos bons ofícios. O senhor dr. Paulo Portas embirrou com uma intervenção da senhora dr.ª Maria José Morgado, excelsa senhora procuradora do ministério público, num evento qualquer patrocinado pela brigada parlamentar socialista a propósito do próximo referendo. É provável que o senhor dr. Paulo Portas tenha razão no caso e na embirração. O senhor dr. Paulo Portas aprecia as coisas como elas devem ser, explicadinhas e conforme os estatutos. Aliás, segundo consta, o senhor dr. Paulo Portas é cioso da ordem e ainda bem. Agradece-se penhoradamente o seu garbo no que concerne a tal matéria. Para além disso, mais caladinho do que um rato de porão sobre os alegados e famigerados voos manhosos que fizeram escala em chão pátrio aquando ostentava o orgulho magala de ser senhor ministro de Estado, da Defesa e dos Assuntos do Mar, quem é que raio, se não ele, haveria de ser escrutinador das conformidades?, não é? O papel de juiz dos bons ofícios assenta-lhe tão bem quão bem outrora ele se sentou num Jaguar. Nicky Florentino.

Referência



Calimelo. O senhor dr. Nuno Melo, cabecilha da turma parlamentar do CDS/PP, demitiu-se e, «ai!, coitadinho de mim», encenou a rapsódia da virgem inocente. Também lamentou que o senhor presidente do CDS/PP, o insólito senhor dr. Ribeiro e Castro, estivesse dedicado a fazer arroz de cabidela com sangue dos da seita, através da demissão do líder da trupe parlamentar. Provavelmente, saudoso da recente volta ao bilhar grande indiano, ao senhor dr. Nuno Melo apetecia qualquer coisa com caril. Nicky Florentino.

Referência



O estado enquanto cárcere de chão e os seus parênteses. Em Portugal, o estado, suposto dispositivo institucional de domínio sobre um determinado chão, alcança quase todo o território nacional. Quase todo porque há momentos em que não alcança a famigerada ribeira dos Milagres. Nesses momentos o estado é o que, coliforme ou diluído, corre no leito da referida ribeira. Nicky Florentino.

Referência



'Allo 'Allo! Sim, sim, conforme testemunho lúcido do senhor Prof. Doutor João César das Neves - estampado na edição de hoje do Diário de Notícias -, caso vingue o «sim» no próximo referendo, o aborto terá a normalidade de um telemóvel. Se será noveum, novetrês ou noveseis, isso, não se sabe. Segismundo.

Referência



Paternidade. Onde é que tens o teu pai?, no sangue? Segismundo.

Referência

2007-01-18


Babilónia? ou doom? Não há qualquer problema por a fé determinar o voto e o seu sentido. São tantas as formas desassisadas de abstenção ou participação eleitoral que não votar ou votar por motivo fideísta é uma dessas formas apenas. Nicky Florentino.

Referência



L’avenir n’est plus ce qu’il était. Entre os seus papéis, destaca-se um acumulado de folhas, tratado com algum desvelo patético. No princípio da primeira dessas folhas está escrita uma frase que ele já não recordava, “o fim deixou de ser final”. Segismundo.

Referência



Morte lenta. Vou matar-te! Pronunciou a sentença com uma placidez impressionante. Mas não o matou. Deixou-o viver para que sofresse. Haveria de morrer por si, no fim. Jamais se permitiu antecipar-lhe o termo do sofrimento. O Marquês.

Referência

2007-01-17


Desde o início. Em rigor, a santíssima, madre e casta igreja católica apostólica romana não é apenas pro «não» no referendo do próximo dia onze de Fevereiro. É contra o normativo jurídico que actualmente regula o aborto e que está em vigor. Assim como é contra qualquer método contraceptivo. Porque, dita a doutrina da causa, a vida é um dom divino. Apenas deus a dá, apenas deus a tira. Neste sentido, sem mediação extra-divina, trucatruca-se se e como deus quiser, com as consequências que ele bem entender. É isto que ainda é a civilização para o senhor cardeal patriarca de Lisboa. Segismundo.

Referência



Fascínios. Ele fascina-se com coisas menores sobretudo. Com maçãs, por exemplo. E também com espelhos e com nevoeiro. Com espelhos e nevoeiro porque, para si, constituem um desafio óptico. Diante um espelho, assim como perante uma massa de nevoeiro, ele tende a colocar a questão do limite, até onde é que?, como se tentasse o seu endereço. Também é a oportunidade em que, no seu corpo, sente a condição de ninguém confluir com a condição de alguém. A textura do anonimato encontra-o e confronta-o com uma hipótese que o confirma, um reflexo ou a presença no interior de uma opacidade. É por isso que, enquanto fascínio, as maçãs são-lhe mais exactas. E mais carne. Segismundo.

Referência

2007-01-16


Pátria valente e imortal. Portugal reconfigurou-se. Modernizou-se, diz-se. Como consequência da modernização, muitos lugares do mapa pátrio esvaziaram-se ou ficaram vazios. A vida é assim mesma. Uns quantos morreram, outros abalaram em prol de vida melhor. Em termos demográficos, a escala desses lugares diminuiu. Agora, começou a tornar-se evidente que uma parte significativa do território não tem uma cobertura eficaz de um conjunto de dispositivos. Provavelmente nunca teve. Acontece, porém, que alguns desses dispositivos estão associados à garantia de direitos fundamentais, direitos um.zero, não de direitos de inclinação, mania, orientação ou sensibilidade, direitos quatro.zero. Parte desse défice de cobertura deve-se ao facto de, para não ser assim, ser necessário assumir custos que têm que ser suportados por via do orçamento do estado. Mas o problema político mor em agenda não é esse. O grão problema é o défice orçamental. O que faz com que o modo como os gentios e o dinheiro (e)s(t)ão distribuídos pelo chão português seja fado. E não um problema político de coesão e de integridade da pátria. Ainda bem. Porque assim, em aparência, o caso é menos complicado. Se alguém morrer, abre-se um inquérito. Nicky Florentino.

Referência



De ashes to ashes a face to face. Não espanta que um dia, assentado o cocktail de espuma e pó em torno do caso, a senhora dr.ª Ana Gomes seja recordada não pelo seu jeito assanhado e exaltado, mas pelo seu contributo para a tentativa de esclarecimento do que raio se passou com não se sabe quantos voos que fizeram escala em chão pátrio, transportando, ao que consta, não réus, mas vítimas da paranóia securitária norte-americana. Se isso acontecer, mais uma vez perceber-se-ão os lodo e logro da política, incluindo a dita democrática. E reconhecer-se-ão algumas faces sem as máscaras de lama. Não serão, como já não são, faces bonitas. Os respectivos apelidos, esses, provavelmente serão sobejamente conhecidos. E insistirão que rimam com sentido de estado e interesse nacional. Com hombridade e pudor, isso, seria rogar demais. Nicky Florentino.

Referência



Página do livro das febres, ii. Este é o meu caminho. O teu caminho? Sim, este é o meu caminho. Pois parece que também é o teu rasto. Segismundo.

Referência



Ser e crescer o diabo que há dentro de nós


© Joel Coen, cena de O Brother, Where Art Thou?
Segismundo.

Referência

2007-01-15


Agora?, já? Procrastinação é tópico que interessa aos danados. Primeiro o Filipe e depois o José fizeram alusão ao trabalho de Piers Steel. O subtítulo do artigo é impressionante, a meta-analytic theoretical review of quintessential self-regulatory failure. Repita-se, quintessential self-regulatory failure. Insista-se, self-regulatory failure. A culpa, sempre a culpa, a mesma culpa. Segismundo.

Referência



Página do livro dos espectros, i. Quem não consegue enganar-se, em rigor, ainda não começou a ser digno de si. Segismundo.

Referência



All tomorrow’s parties. Sobre a ecúmena, o motivo soberano da prenhez não é a reprodução da espécie. É, sim, o sofrimento da mulher e, através desse padecimento, a dor do homem também, pois a mulher é um dispositivo revanchista. O Marquês.

Referência

2007-01-14


Salmo à flor do mar, ii. Portugal é o sítio do pokémon amarelo. Segismundo.

Referência



Amadeo by night. Por motivos diversos, a cidade grande exerce um efeito de atracção significativo sobre muitas criaturas. Também é esse, uma densidade de gente excessiva e um défice de lugares de estacionamento para as cápsulas automóveis, um dos motivos do efeito de repulsa que gera. O que significa que, em termos de salubridade, Lisboa recomenda-se, mas não a todas as horas. Isto, porém, não tem qualquer interesse. O que interessa é que, por ler a página vinteecinco da edição de ontem do Público, ele ficou a saber que a exposição Amadeo de Souza-Cardoso. Diálogo de Vanguardas, patente na Fundação Calouste Gulbenkian, estaria aberta ao público, non stop, desde as dez horas am de ontem até às dez horas pm de hoje. Ele leu isto pouco depois das três da madrugada e sentiu o arrepio que usa sentir quando suspende o cérebro. Nada a fazer. Vestiu a condição de pêndulo, enrolou o cachecol ao pescoço, acelerou como um dromocrata, foi da cidade pequena à cidade grande. Lisboa num dos máximos possíveis do seu esplendor. Nas catacumbas da Gulbenkian quase ninguém. Largueza, silêncio ou sussurros vagos, tipo sopros breves sobre o silêncio. Amadeo entregue aos olhos, demoradamente, sem encostos, sem sombras dos outros. Ao mesmo tempo uma sensação de solidão e de soberania. Tudo visto e algo revisto, ele tornou à cidade pequena ainda sem sol. A mesma solidão, a mesma soberania, mais velocidade. A noite, onde os outros são menos, confere-nos um vagar estranho. É essa a nossa e a mesma diferença. O que nos encontra na condição afasta-nos no tempo e no espaço. Embora as horas e o chão sejam comuns. Segismundo.

Referência



Acácia, meu amor # xv. O corpo é a frente de um combate. Parto agora em desafio, contra a fome que me acordou. Vou para o chão, em salto, perseguido pela necessidade posta em mim. Tomo um destino único, a carne. Há no encontro daquela necessidade com este destino uma felicidade que somente os carnívoros sentem e compreendem. É para ela, a tal felicidade, que já corro, mas pela via do cuidado. Pois o sangue não nos acontece na boca sem espera. Eliz B.

Referência

2007-01-13


Página do livro das febres, i. Uma ideia!, uma ideia!, é uma ideia! Não, não pode ser, uma ideia?, é mesmo uma ideia?, tens a certeza que é uma ideia? Sim, é uma ideia. Olha, daqui, próximo, parece a superfície de um abismo. Segismundo.

Referência



Salmo à flor do mar, i. Portugal é uma pátria pop noir. Segismundo.

Referência

2007-01-12


Aporia. Em termos ideais, em qualquer acto eleitoral o voto em consciência é a solução. Mas é também o problema. Atente-se, por exemplo, no caso do agendado referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez, a expressão eufémica de aborto. No que tem merecido publicidade, a campanha tem sido bastante animada por hostes assanhadas e exaltadas tanto de uma quanto de outra tendência. Há quem clame com orgulho «na minha barriga ordeno eu!», quase como manifestasse I love the smell of abortion in the morning, arrolando, em sintonia, um conjunto de argumentos fundamentados, apostando nomeadamente na diferenciação entre o estatuto da mulher e o estatuto da fêmea. E, do outro lado - o piedoso -, há quem manifeste a convicção que o embrião é o mínimo orgânico da condição humana e, neste sentido, o direito à vida do nascituro prevalece sobre o arbítrio da hospedeira, a fêmea cativa da lotaria biológica, o que, por esta perspectiva, também tem fundamento. O que significa que, feita a ronda pelo argumentário de uma e outra banda, a solução e o problema permanecem. Descartes está morto. Nicky Florentino.

Referência



Jogar ao pau com os ursos, agora, é um desporto de inverno. Constou que, devido à temperatura amena intempestiva, em países do norte e do este da Europa os ursos ainda não hibernaram ou hibernaram mais tarde. Não se sabe qual é a opinião do João, que sabe tudo sobre climatologia e a tese do aquecimento global, sobre o assunto. Os ursos, parece, também não querem saber. Estão na deles, na sua natureza. Segismundo.

Referência



Acerto de bainha. A ivg é uma espécie de tlebs vaginal. Segismundo.

Referência

2007-01-11


Um... Qualquer referendo tende a ser um equívoco. Em Portugal, seguro, é no mínimo seis equívocos. Um é o seu motivo. Outro é a sua convocação. Os outros são as hipóteses possíveis de comportamento, a abstenção, o voto branco ou nulo, o voto «não» e o voto «sim». Nicky Florentino.

Referência



É o que há. Queres um princípio. Dão-te uma continuação, sendo que poderiam ter-te dado um fim. É isto a puta da vida. Segismundo.

Referência



A ironia como patamar. Raramente as pronúncias mais justas são assertivas e sob o alcance do advérbio «sempre». É por isso que, por exemplo, entre as sentenças «eu não acredito» e «eu acredito» ou entre as sentenças «eu não quero» e «eu quero», no mais das ocasiões a justiça implica o encontro com a dúvida e com a frequência «às vezes». Segismundo.

Referência

2007-01-10


Mas livrai-nos das fraude e evasão fiscais. Consta que o senhor director-geral da direcção-geral das contribuições e impostos encomendou uma missa de acção de graças pela missão tributária e pelos respectivos missionários, ele mesmo incluído, presume-se. Que, a todos, o senhor lhes pague. Nicky Florentino.

Referência



Paralaxe à Segismundo. Nem Ségolène Royal nem Slavoj Žižek nem Daniela Cicarelli no youtube, mas María Consuelo Araújo Castro, outrora senhora directora do jardim botânico José Celestino Mutis de Bogotá, agora senhora ministra dos negócios estrangeiros desse chão lá longe chamado Colombia. Nicky Florentino.

Referência



Tráfego noctâmbulo. Um sobressalto. Investigar o significado da referência a borboletas nos contos de Набо́ков. Segismundo.

Referência

2007-01-09

O Albergue feito pelos seus leitores.

Pessoalmente, estou decidido a contribuir para que os portugueses acabem. Estou convicto que o seu fim é o melhor para nós e para Portugal. Isto não significa que me guarde quieto ou murcho. Saiba-se que vou aos treinos, mas não pretendo prole. Vou e é mesmo só para o que é, descompressão da libido. Às vezes também vai à mão. Herdeiros é que não, dispenso. Por isso, vejo com mau olhado que as tributações que sou compelido a pagar - concederam-me eufemisticamente a condição de contribuinte, porém a mim não enganam - sirvam para financiar a saúde ou a educação dos outros e dos filhos dos outros. O valor referente às minhas tributações deveria ser exclusivamente investido no tgv, no novel aeroporto da Ota ou em auto-estradas. Enquanto, portugueses, por cá andarmos, seremos beneficiários de tais equipamentos. Depois, os colonos que eventualmente venham, que tomem conta da paisagem e façam a manutenção das instalações. (Anísio Alma)

Referência



Salmo à flor do mal, i. Um dia perguntar-te-ão Famke Janssen? ou Bridget Moynahan? e essa será a tua guerra. Segismundo.

Referência

2007-01-08


Do parasitismo político. No âmbito do processo de parasitismo político chamado cooperação estratégica, a condição de senhor presidente da República permitirá ao senhor Prof. Doutor Aníbal Cavaco Silva gozar dos eventuais proventos da governação. De igual modo, tal condição permitir-lhe-á não ser solidário na partilha das misérias decorrentes dessa mesma governação. É por isso que a cooperação do fulano com o governo é estratégica. Nicky Florentino.

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Estou a ver-te. O senhor eng.º José Pinto de Sousa é o expressor narcísico do senhor Prof. Doutor Aníbal Cavaco Silva. Em grande medida, aquele parece ser o que este agora gostaria de ser, mas não pode ser. É que, pelo que se constata, um e outro gostam de mandar, ordenar, exercer a arrogância como convicção e autoridade. Nicky Florentino.

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Página do livro dos googlemas. Lindo, voodu o que devo falar na hora de deixar o boneco?, quem sabe? Segismundo.

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You and me and the devil makes three *. A gravidez pode acontecer involuntária ou contra a vontade. Não obstante todos os cuidados, desde a ingestão da pílula em dobro - como outrora fez a senhora Doutora Maria Filomena Mónica -, não vá uma das drageias estar avariada ou ter sido afectada por alguma gota de água benta, até à camuflagem do pirilau com uma manga de latex impermeável à semente jorrada pelo entusiasmo do macho, a coisa pode dar-se. Ora, caso a coisa se dê, ao contrário do que é tão apregoado por algumas tendências, não é aí que começa a humanidade, porque, assim, estritamente físico e químico, tal começo é semelhante, por exemplo, ao dos cães. Onde começa a humanidade é no controlo sobre as consequências do encontro sexual. Por outras palavras, uma coisa é a reprodução animal da espécie, a hidráulica e a biologia associadas ao acto de trucatruca. Outra coisa é a reprodução controlada e consentida da espécie, sob um princípio de juízo - chame-se-lhe consciência, se se preferir. E outra coisa ainda é um gajo e uma gaja trucatruca apenas pelo trucatruca, don’t need no other, lovin’ baby *, sem qualquer propósito de estenderem a raça e, portanto, previamente precavidos contra essa hipótese. É por isso que não faz sentido apregoar a gravidez obrigatória, assemelhando a condição da mulher à condição das fêmeas de qualquer outra espécie. Segismundo.

* versos da canção «Didn’t leave nobody, but the baby», um dos cânones do bluegrass.

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Aos sessenta. She began to wail jealousies scream *. Segismundo.

* verso da canção «Scary monsters (and super creeps)», incluída no álbum Scary Monsters (and Super Creeps) (RCA Records, 1980).

imagem © Anton Corbijn

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2007-01-07


Onde é que estavas quando era necessário vencer uma equipa da segunda bê? Tarde, demasiado tarde, alguém perceberá que mister Jesualdo Ferreira rima excessivamente com senhor Luís Filipe Vieira. Nicky Florentino.

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You shall see... a cow... on the roof of a cotton house *. O processo de recolha de assinaturas à saída da missa com vista à constituição de movimentos a favor do «não» no referendo convocado para onze de Fevereiro próximo é o que hoje há mais equivalente aos vendedores de Bíblias de outrora. O que tem de démodé é o que o processo tem menos de sinistro. Segismundo.

* palavras de uma personagem do filme O Brother, Where Art Thou?, realizado por Joel Coen.

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Acácia, meu amor # xiv. Não me impressiono com as distâncias ou com os silêncios. Vejo e oiço para além desses limites, num tempo que demoro tranquilo e sem lamento no meu corpo. Severo é o instinto, a fome e a necessidade que por ele perspassam. Severo é o atraso da noite, mesmo para mim que não tenho horas. O que me inquieta é o que rouba a minha indolência, a tarde breve e os seus acidentes. Guardo-me em ti, meu amor, porque, é esse o teu mistério, és quem melhor afasta de mim todos esses acidentes. Eliz B.

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2007-01-06


A ecografia como epifania. Já na potência somos essência? Segismundo.

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2007-01-05


O direito ao bitaite. O quadro institucional político português detém um conjunto de mecanismos de dissuasão gentia. O direito de petição é um deles. Iludidos, os gentios lavram ou subscrevem petições à Assembleia da República. Julgam que é um direito seu. Mas não é. É um equívoco, um engano. Pois, em termos sistémicos, destina-se mais a suportar a ilusão da hipótese de participação cívica do que a suportar essa mesma participação cívica. Basta atentar no modo como as criaturas em deputação tratam, a granel, a esmo e intempestivamente, as petições que os gentios alacremente lhes remeteram. Até os borregos têm mais estima pelo pasto que lhe dão. Nicky Florentino.

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Pode ser que não. Gentes pro «não» no próximo referendo estimaram numa porrada de milhões de euros, vinte ou trinta, o que o estado teria de pagar se as mulheres decidissem abortar por conta de uma cláusula qualquer do serviço nacional de saúde. Admita-se que assim será. Porém, se tais gentes clamam «não» pela vida porque só deus a pode dar e tirar, porque a dignidade da vida humana começa com a consequência imediata da investida dos espermatozóides sobre o óvulo ou porque não sei quê, como manifestaria o Segismundo, concedam-me o obséquio, não me fodam com contas de mercearia, fodam-me com motivos. Nicky Florentino.

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Couto dos santos. A gente de uma extensa lista de raças, de romancistas ou poetas a professores universitários ou cronistas, o suplemento «Mil-Folhas» do Público tratou de auscultar as edições preferidas e referentes ao ano civil recentemente finado. Ouviu trintaeoito almas. Quatro eram de mulheres. Para quê tantas?, pergunta-se. Segismundo.

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Ars gratia artis. James Bond, agora, é espadas sobretudo e não o baralho todo. Já não se fazem zerozerosetes como antigamente. Segismundo.

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Mistério. Hoje o dia não começou orgiástico, mas com um acaso. György Kurtág, Kafka-Fragmente. Segismundo.

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Psique strip. Não sei, mas houve um motivo certamente. Sei lá qual, um motivo qualquer. Talvez tenha sido por causa do tempo. Ou por causa da face dela e dos seus cabelos negros e lisos suspensos sobre os ombros. Ou por causa de algo que deus tenha escrito na sebenta dos destinos. Sinceramente, não sei. Não recordo. Não consigo recordar. O que sei é que foi à noite, isso eu sei. Lembro-me da lua, impressa no fundo celeste tenebroso. Recordo as sombras que se desenhavam na face dela. Recordo também o brilho dos seus cabelos. Depois começou a soar uma composição de György Kurtág sobre um fragmento avulso de Kafka. Leoparden brechen in den Tempel ein und saufen die Opferkrüge leer. Fiquei excitado, não sei porquê. As minhas mãos foram tomadas por um frenesi. Como que lhes assomou a loucura. Soltei-as. Não queriam sentir-se presas. Dei-lhes a liberdade que exigiam. Elas queriam ser livres, ficaram livres. das wiederholt sich immer wieder. Desconheço, depois, o que tenha acontecido. Sim, o meu corpo estava lá, mas eu ausentei-me. Não fui eu que lá fiquei. Foi uma parte minha. Não sei como é que aconteceu. Essa separação nunca me tinha acontecido antes, tal como nunca me aconteceu depois. Dizem que foram as minhas mãos, as minhas mãos. Estas, olha, estas. As minhas mãos. Não fui eu, foram as minhas mãos. schließlich kann man es vorausberechnen, und es wird ein Teil der Zeremonie. Se não fui eu, onde é que eu errei? Deveria ter sido eu?, é isso? Não posso confessar o que não é confessável, não é? Espera. Sei lá. Talvez tenha sido por causa de uma conjugação estranha dos astros. Há quem admita isso, zodíacos, signos. Talvez o sofrimento dela estivesse inscrito nas estrelas e nas órbitas dos planetas. Talvez ela tivesse mesmo que sofrer, que ser supliciada e sacrificada. É o que acontece aos carneiros. Ela era carneiro. Eu não sou anjo. As minhas mãos não são mãos de anjo da guarda. Eu não tenho asas. Não sei voar. Se não fui eu, qual é a minha culpa?, a culpa das minhas mãos? Não. Ouve, ouve-me. Não, já disse, não sei. Como é que eu me chamo? Sim, sei qual é o meu nome, mas o meu nome é necessário para quê? Foram as minhas mãos, as minhas mãos. Nunca as baptizei. Será que foi por causa disso? Também pode ter sido por causa da solidão, das solidões dela e minha. As minhas mãos não estão acostumadas a outras mãos. Não distinguem as carnes. O Marquês.

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2007-01-04


Na cabeça dele, na quê? O senhor dr. Jorge Sampaio é um daqueles mistérios com que temos que conviver. Se reservei a memória e a interpretação correcta da entrevista ao fulano acontecida esta noite na teelvisão, ele justificou a não demissão do anterior senhor procurador-geral da República com o seguinte argumento, “o mandato de um procurador-geral da República é uma coisa muito séria”. Sim, compreende-se. O mandato de um primeiro-ministro ou o mandato do colégio de deputados da Assembleia da República é que, vira-milho, são uma brincadeira. Nicky Florentino.

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Pode ser que sim. Num acesso de tontaria, o senhor Prof. Doutor João Teixeira Lopes, senhor insigne do BE, ficou incomodado por o senhor dr. Rui Rio ter sido convidado para integrar um movimento e fazer campanha pro «sim» no próximo referendo. Receoso, o tal insigne vigilante das boaventura e honra políticas acusou que, com a sua integração no movimento «Voto Sim», o senhor dr. Rio poderia “branquear o seu comportamento” e “utilizar o próprio movimento para ganhar notoriedade e tentar recuperar a sua imagem junto de um certo eleitorado”. É nestes pequenos pormenores que um liberal old fashion leva vantagem. Não esquece que todos somos muitas condições em simultâneo. Mas também não esquece que muitas dessas muitas condições são distintas – portanto, não exclusivas – e que não é por alguém ser xis que não pode também ser ípsilon ou zê ou o raio que o parta. A diferenciação é uma condição do exercício da liberdade. E a paranóia moralista, tal como expressa pelo senhor Prof. Doutor João Teixeira Lopes, apenas é o que é, uma cilha de castidade rançosa, não uma expressão de hombridade. Ou será que a aludida criatura bloquista pretende que só a fauna fandanga do BE e outras de semelhante coturno é que, com a campanha referendária, podem ganhar notoriedade e simpatia junto dos gentios eleitores? O senhor Prof. Doutor João Teixeira Lopes, porém, lançado, de indicador em riste, não se ficou por aqui. Com fundamentos seguramente documentados e domiciliados nas catacumbas do seu juízo, sentenciou que o senhor dr. Rio “não vai trazer mais votos a favor da despenalização da interrupção voluntária da gravidez até às dez semanas”. Até pode ser que seja assim. Mas por ora, desconhecendo-se a informação empírica que lhe forneceu base e motivo, tal sentença não parece ser mais do que um achamento. Pelo que, se o outro senhor poderá ter a intenção de braquear o seu comportamento - ou apenas a vontade de confirmar a posição expressa por si, enquanto deputado, aquando o outro referendo sobre o mesmo tópico -, este senhor do BE parece preferir comportar-se como inspector de eventualidades, agitando um lençol, à fantasminha. Nicky Florentino.

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A minha pátria por um pokémon. Foi anunciado. O senhor dr. Pedro Santana Lopes irá fazer uma intervenção numa sessão de uma entidade chamada Clube de Pensadores. Consta que conferenciará sobre política e memória. Andar por aí é isto. Pensar, pensar. Nicky Florentino.

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Chamar pai a outro. Deus fez-nos, é o pai nosso et cætera, mas a paternidade é atribuída ao inocente que nos adoptou e, antes, adoptou a nossa mãezinha. Segismundo.

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Dueto com final doloroso. Ela, está frio lá fora, sabes? Ele, sei, é por isso que estou aqui, dentro de casa. Ela, vou sair. Ele, não vás, fica comigo, está frio lá fora. Ela, não, vou sair. Ele, voltas? Ela, enquanto estiver frio lá fora, não. Ele, vou chorar. Ela, chorar?, por que motivo? Ele, porque vais deixar-me aqui, sozinho. Ela, isso não é motivo para chorares, motivo para chorares é isto. Ele, isto?, o quê? Ela, isto. O Marquês.

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2007-01-03


La vache qui rit, ii. Há obviamente um problema de concepção estrutural quando alguém admite que um direito, qualquer que seja, tem preço. É que um direito, qualquer que seja, se é direito, não tem preço, embora tenha custo. Nicky Florentino.

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La vache qui rit, i. Um dos problemas políticos actuais é que, agora, está a entender-se como regalias e privilégios o que antes se entendia como direitos. Na prática, o que se julgava ser uma vaca é um par de cornos apenas. Que é o que sempre foi. Mas agora, em consciência tão dorida quão falida, paga-se por isso. No futuro pagar-se-á ainda mais. Nicky Florentino.

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Tempo máquina. Há o testamento. Há a poesia. Há o ferro. Há o croupier. Há a perspectiva. Há a corda. Há a mesa. Há a sombra. Há o cuidado. Há o troco. Há a mecânica. Há o café. Há o chocolate. Há o jogo. Há a fome. Há a sede. Há o corpo. Há o atraso. Há a tocata. Há a fuga. Há a publicidade. Há a propaganda. Morre-se por tudo isto, embora pareça que não. Segismundo.

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Nas vésperas da epifania. Pelo que se sabe da natureza, o mistério da encarnação foi mais encarnação do que mistério. Segismundo.

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2007-01-02


A cooperativa portuguesa. Segundo a pronúncia oracular do senhor presidente da República, “os portugueses exigem realizações concretas”. Assim mesmo. Ou seja, os portugueses não se limitam a exigir realizações. Não senhor. Os portugueses exigem realizações concretas, não realizações apenas ou realizações inconcretas sequer. Os portugueses exigem realizações concretas, daquelas mesmo concretas, realizadas concretamente. E o senhor presidente da República, claro, português, insatisfeito como os portugueses, acompanha-os. Somente na exigência, porém. Que o resto é cooperação estratégica ou dois coices no telhado. Nicky Florentino.

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Gravidez obrigatória. Vivemos, no sentido parido do termo. Mas antes, como pronunciou a senhora presidente da Federação Portuguesa pela Vida, já somos “uma vida humana a funcionar”. Tipo, tuc, tuc, tractor. Segismundo.

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O saco de todas as violências. Parece que, segundo o senhor Bento XIV e o senhor cardeal-patriarca de Lisboa, a franquia para a morte não acaba no enforcamento, mas começa no aborto. Ou seja, há atentados e ofensas mortais “contra as crianças, mesmo antes de nascerem”, assim como há guerra, terrorismo e maçãs reinetas que caem no chão. Segismundo.

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A pátria que pisamos. Uma frase da página dezasseis da edição de hoje do Público, sobre o réveillon. “Em Viseu, uma jovem de vinteetrês anos foi atingida por uma bala perdida, quando pela meia-noite assistia ao fogo-de-artifício num recinto público”. Segismundo.

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Das (l)atitudes. Um gajo diz uma palavra muitas vezes. Repete e repete. Há um momento em que a palavra é apenas palavra, destilada, sem referência e sem referente. É nesse momento que o gajo e a palavra conseguem a sua exactidão. O silêncio não é tão exacto. Segismundo.

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Coordenadas. Imagine-se alguém, qualquer alguém, cuja posição em relação ao mundo não defina mais do que um ângulo agudo. Por outras palavras, admita-se alguém, simplesmente alguém. Agora sonde-se. Onde é que existe mais mundo?, no arco diante ou no arco atrás desse alguém? Segismundo.

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2007-01-01


Morte lenta. Um gajo confronta-se com a respectiva frouxidão e com a miséria do seu ritmo quando, em trânsito numa auto-estrada, é ultrapassado por um Smart. Segismundo.

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Whonity, ii. Em relação à reprodução da espécie são mais as contingências associadas à fricção do pirilau do que a vontade divina, que, no que é, apenas é conforme a disposição do dito pirilau. O resto é natureza. Segismundo.

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Whonity, i. Em qualquer gravidez cruzam-se demasiados casos, nenhum deles divino. O que significa que a gravidez é o produto de uma profanação, como concebida por Agamben. É aí, não no estado decorrente mas no acto generativo, que reside a humanidade da espécie. Segismundo.

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Oração a Jano


© Ingmar Bergman, cena de Smultronstället
Segismundo.

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2003/2024 - danados (personagens compostas e sofridas por © Sérgio Faria).