2009-04-30
conferência apache, xv. a Deolinda não é um caso perdido, é um poltergeist paroquial. leo david t.
2009-04-29
o sinédrio das abjurações, iii. uma mulher nua. o amor é uma personagem triste. é como o socialismo, disse ela, enquanto contemplava os hematomas impressos na carne. a nudez conferia-lhe mais do que presença, conferia-lhe evidência. antes de a tomar de costas para si e de a abraçar, o amante perguntou-lhe e o teu marido? ela cedeu à confiança das mão dele, sentiu os seus seios enconchados aí. emitiu um gemido, não se percebeu se de gozo ou se de dor. os hematomas timbrados no corpo. ele não aliviou as mãos, continuou a manipular-lhe o peito. ele nu também. o meu marido vai demorar, não te preocupes, sossegou-o ela. então ele desviou-lhe o cabelo da nuca, fazendo-o cair sobre o ombro mais distante da sua boca. cheirou-lhe o pescoço, bafejou-o, beijou-o, lambeu-o, deslizou a língua até alcançar e morder-lhe o lóbulo da orelha. após isto ela desarmou o abraço. dobrou-se sobre a cama do filho, assentou as palmas das mãos sobre a colcha e afastou ligeiramente as pernas. ele aproximou-se e, toma o meu punção de carne, encontrou-se com as nádegas dela e além. aguilhoa-me, rogou ela, possantemente. os ruídos lascivos estenderam-se do quarto ao apartamento, enchendo as três assoalhadas. no momento em que ele aliviou o compasso do arremesso dos quadris, ela aproveitou para furtar-se e sair do quarto. ele tentou detê-la. perseguiu-a, tocou-lhe num tornozelo, derrubou-a e desequilibrou-se sobre ela, caindo também no corredor. ela não o rejeitou, não tentou esquivar-se. riu e arrumou o corpo para o acolher dentro de si. tomou-o com os braços e as pernas, puxou-o, beijou-lhe a fronte. e ali mesmo, no chão, ele reiniciou o movimento de investidas e insistiu até sentir o desconforto da posição e largar um suspiro. depois ela levantou-se e, vem, apoiou as mãos na parede, deixando o torso curvado ligeiramente para diante, as pernas abertas e os joelhos flectidos. ele levantou-se e, toma, toma, tornou a infiltrar-se nela. dá-me, dá-me, correspondeu ela. o teu marido vai mesmo demorar?, procurou ele a tranquilidade durante a cópula. vai demorar a eternidade que lhe dei, soltou ela com sarcasmo, ao mesmo tempo que, voltando a cabeça para trás, o encarou sobre o ombro. facto que o entusiasmou mais, Cecília, és uma puta, levando-o a intensificar o ritmo dos embates. ela consentiu-lhe o arrojo, permitiu que ele continuasse a enfiar-se com assomos violentos na carne dela. mas não sou uma ilha sem soberania, disse ela. por causa do suor, uma das suas mãos deslizou na parede, no sentido ascendente, atenuando a inclinação do tronco. não obstante o esgar de esforço, ele não a largou. com a mão esquerda segurava-lhe a anca, com a outra mão agarrava-lhe um ombro. eu faço destinos, a tua eternidade também, acrescentou ela. O Marquês.
2009-04-28
Sacred trickster. Antes do passamento dele para zombie, o meu querido tinha a mania de, quando ouvia sinfonias de Mahler, encerrar-se no estúdio, deitado no chão, com os olhos fechados. À medida que o som fluía, ele, dizia, sentia o cérebro a ser evacuado até tanger a inconsciência. Chegava-lhe uma espécie de morte antes da morte. Depois, finda a audição da sinfonia que estivesse a ouvir - a terceira, a quinta, a sétima, a incompleta -, levantava-se e expiava o seu estado com artilharia eléctrica e vozes a gritar, avançando na linha da angústia. A viúva.
2009-04-27
2009-04-25
Página do livro dos googlemas. A liberdade é fodida e interrogativa. Prova? Há quem consulte o oráculo dos oráculos, mulheres fodem em Massamá?, e não dispense o ponto de interrogação. A viúva.
2009-04-24
Count of casualty. Nada disto é urgente. É apenas a queda que chama por ti. E tu adiantaste-te. A viúva.
errata d’helder, x. página quarenta e sete, linha quatro, onde se lê sniper deve ler-se spinner. Edgar da Virgínia.
2009-04-23
Página do livro dos googlemas. Isto, 2 mulheres - uma tem a língua fora, a outra lambe-a, é um jogo? A viúva.
conferência apache, xiv. em intenção, a Deolinda oscila entre o carteiro e o padeiro. quando a dúvida é maior, roga ao carteiro que, em vez de tocar duas vezes, lhe deixe os papo-secos na saca do pão, que é para ela, depois, poder sair de casa, levar a mala de senhora e fazer o discurso. leo david t.
2009-04-21
Um, dois, três, diga lá outra vez. Uma entrevista é uma entrevista, não é um show de «mostra tudo, tira a cuequinha também» ou um diálogo de confessionário. Não obstante, porque as entrevistas são um ritual importante do processo político, abunda a ilusão de que são um jogo de resultado incerto e, sobretudo, que o entrevistado está disponível para a verdade, a verdade apenas e nada menos, nada mais do que a verdade. Porém sucede que, em política, a verdade é performativa. Ou seja, a verdade não é o que corresponde ao verdadeiro, a verdade é o que, por operação e força simbólicas, se institui como verdadeiro. É por isto que, servindo mais um propósito de instituição do que de verificação, raras são as entrevistas reveladoras, que podem ser reveladoras. Hoje à noite, na rêtêpê um, foi o que aconteceu. O senhor primeiro-ministro patati patata e tudo como antes, incluindo aquela tirada sobre «jornalismo travestido». O problema do fulano é que, embora dispositivo de opacidade, uma entrevista televisiva acaba por mostrar e revelar sempre mais do que o entrevistado pretende. E, como os gentios necessitam de resolver a dissonância cognitiva que os assola lá em casa - agravada pela circunstância de, dizem, haver para aí uma crise económica com proporções do caraças -, não há como iludir que a carinha laroca do senhor eng.º José Pinto de Sousa já pareceu de rapaz menos crispado e, sendo ele um senhor, mais simpático, mais «cá dos nossos», como anseiam os gentios. Pelo que pode ser que a criatura se foda por não saber dançar. Nicky Florentino.
Aliança seguradora. Em termos domésticos e sexuais, elas são a central de aspiração, eles são a consola de jogos. A viúva.
2009-04-20
Reflexo condicionado. O senhor eng.º José Pinto de Sousa não gosta de ser escrutinado. Não obstante, parece, gostaria de ser adorado. Nicky Florentino.
Cenas do próximo capítulo. Em portugal, muito da política é coreografia burlesca. Até que um dia qualquer vem o senhor presidente da república dizer umas quantas banalidades - banalidades porque sentenças óbvias - e uma série de gentios e plumitivos da praça sobressalta-se, tanto que uns e outros começam a imaginar que a comédia, afinal, não é comédia, é coisa a sério. Era comédia antes e continua a ser comédia agora. Perante as peripécias de sempre, o que mudou foi a vontade de rir dos gentios. Agora já não há ou há muito menos vontade de rir. A crise na óptica do utilizador não tem piada. Por isso, não sendo, parece grave e novidade o que o senhor prof. doutor Aníbal Cavaco Silva disse recentemente sobre a política para as estatísticas e sobre o empreendedorismo para resultados garantidos pelo estado. Ó. Nicky Florentino.
Life’s a cunt. Foda-se, cuidadinho três vezes. Porque “o problema são aqueles emails (...) que nos obrigam de facto, também, no fundo, no fundo, a ir mais fundo, porque as pessoas também, às vezes, nos pedem para ir mais fundo”, disse o senhor prior ao amigo cibernauta. Foda-se. É mesmo isso. Foda-se. A viúva.
2009-04-17
Problemas de herança. Há uns tempos, enquanto herdeira do meu zombie querido, calhou-me na rifa um exercício de curiosidade em português com açúcar sobre a frase quinta da página cento e sessenta e um do livro que estivesse mais próximo de mim na circunstância. Como livro com páginas tantas raramente está próximo de mim, hoje, sem exemplo, correspondo à curiosidade alheia. O que significa que algures abaixo está a tal frase. É contar. Não respeito a cláusula sete do contrato da curiosidade. Nunca fui respeitadora que se possa dizer grande. Aprendi esta mania com o meu zombie querido. A viúva.
“[arrui]nado, mantinha aquele passatempo de espreitar, como uma velha, com receio e acinte. Graças à solidão, desenvolvera uma certa agudeza de animal e pôde ver o mulherio no escuro como outro olhar nenhum teria visto.
Não se veio a saber se foi por medo de que estivessem a fugir sem ele, se porque um tal mistério o seduzisse, que Manuel Firmino, o Sapas, as seguiu. Guardou distância mesmo quando elas se internaram pela mata, até que em certo ponto do percurso se sentiu sufocado pelas ramadas que lhe pareceram frias, de cetim. E, imaginando grandes flores carnívoras, desatou a gritar que o socorressem, com um choro de criança caída em lodaçal.
A uns duzentos metros de distância, as mulheres detiveram-se, agarradas, mas o grito, passando nos ouvidos, logo se transmudou aos corações, sendo, como era, tão ameninado. Contrariando Berta, que teimava em ser aquilo o som de cria predadora, logo as outras tornaram para trás, com chamamentos, com consolações. Quando deram com o Sapas, que gemia, riram-se e abanaram-no. Estavam envergonhadas pelo ludíbrio e, no entanto, agradecidas ao destino que assim lhes punha um homem no caminho, ainda que fosse um homem, ao que tudo indicava, pronto para renegar os artigos de fé logo ao primeiro bofetão do inimigo”.*
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* Hélia Correia, Insânia, Lisboa, Relógio d’Água Editores, 1996, p. 161.
melancolia zündapp
# xxvii. antes era diferente. agora morre-se por causa da e na repetição. Edgar da Virgínia.
2009-04-16
conferência apache, xiii. o shrek não vai à bola com a Deolinda e o buzz lightyear também não, mas ela vai à mesma, para poder discursar. leo david t.
2009-04-15
Cannibal resource. Bato na carne. Golpe contundente. Porrada, mesmo. Forte. Para magoar, para doer. No entanto nenhum eco é devolvido. Como a presença, a carne é fraca. Em vez de ressoar e servir o sonar das intenções, manifesta-se apenas através da nódoa negra que aparece. Todo o resto permanece como antes do toque. Ausente, cenário de ausência. Algo assim. A viúva.
2009-04-14
Cabrito expiatório com batatinhas assado no forno. O problema é que no caso meia ressurreição seria já um milagre. Para além de que, por via de ressurreição de dose inteira ou de dose meia, zombie que é zombie não ressuscita no dia do sinhor, por causa do raio das confusões. A viúva.
A crise na óptica do utilizador, ii. A simpatia paga-se caro. Daí a arrecadação escassa que consigo. Aliás, sendo o que sou e como sou, nunca tive tempos áureos. Até o meu querido, com as suas trombas, conseguia mais do que eu. E certo é que ele passou-se entretanto para zombie, que é uma espécie de vegetal ambulante que requer mais atenção e dá mais trabalho do que vale a afeição que lhe tenho. Como referi, a simpatia paga-se caro. A viúva.
2009-04-13
Pré conceito. Eu conheço um zombie que é meu amigo e muito. Aliás, já era meu amigo e muito, até mais do que isso, antes de ser zombie. Não é facto de que me orgulhe, é o que é. Sou esquisita. A viúva.
2009-04-12
do capítulo das cenas brancas, este é o cálice da menina Jesus
© Alfred Hitchcock, Psycho, 1960.
2009-04-10
melancolia zündapp
# xxvi. paixão, não vais fugir de mim, um refrão pascoal para um final feliz. Edgar da Virgínia.
2009-04-09
conferência apache, xii. às vezes a Deolinda voa como um estorninho e dá muitas cabeças nas paredes e nas vitrines, mas nunca larga a mala de senhora. leo david t.
2009-04-08
Laughing with a mouth of blood. Bastava-me ser ridícula, rir de mim, sozinha. Continua a bastar-me, com a tpm e a báscula de humores que lhe está associada e de que padeço. Não necessito de citar poetas. As coisas são o que são. Sei que o mais que podemos fazer é inventar e atribuir-lhes nomes. A viúva.
sinédrio das abjurações, ii. tu, eu. isto é demasiado mana a mano, não é um casting de bocas. por isso não abras os lábios, não os descerres. não quero saber como respiras ou como beijas. também não quero saber o que dizes ou como pronuncias yoknapatawpha. não quero saber se tens dentes careados ou se há estrelas no céu da tua boca. há vozes e lugares que me fazem sono. prefiro a artilharia pesada, o sangue solto. agora prefiro tudo o que é solto. não demoro demasiado no que é autêntico, não sou dessas, dessas do meridiano. não posso ser dessas. embora o sangue nas mãos me denuncie. O Marquês.
2009-04-07
O moral está em alta ainda. E o mister Jesualdo Ferreira, em timbre de deslumbrado - não é para menos, quando se joga com Sapunaru e empata em old trafford -, falou em brilhantismo. Não foi demais, foi o suficiente. Compreende-se o entusiasmo do homem. Por momentos senti vontade de o beijar na boca. Às vezes o moral indiferencia-nos os desejos. Já passou. Intendente G. Vico da Costa.
A dois. “O moral está em alta”, disse Cristiano Ronaldo ontem (vide Público, n.º 6944, 7.Abril.2009, p. 22). Intendente G. Vico da Costa.
Casa das máquinas, iv. Se longe, sine ira et studio. Se próximo, caralho, caralhinho. A distância faz bem a qualquer pessoa. A viúva.
2009-04-06
A crise na óptica do utilizador, i. Viver com o que se tem pode ser decente e suficiente. Mas viver com o que se não tem é muito melhor até ter-se de ter o que não se tem. A viúva.
2009-04-03
Casa das máquinas, iii. Em mim nem ars oblivionis nem ars memoriæ, apenas o que acontece, o instante telúrico - hábito e propriedade que comungo com o meu querido desde antes o passamento dele para zombie. A viúva.
2009-04-02
Um regime temporal. A encenação democrática hodierna projecta uma espécie de infinito dentro de si que ilude parte significativa das suas consequências e do efeito das suas consequências. Como se não fosse possível a democracia acabar ou acabar com a democracia. Nicky Florentino.
conferência apache, xi. a Deolinda é uma besta no sentido ruminante do termo. leo david t.
2009-04-01
Os monstros são nossos amigos. Em Monsters vs. Aliens, o Jack Bauer faz de general. Está mal, gesticula furiosamente o sinal disso o meu zombie querido. Que anda há não sei quantos dias a babar-se e a admirar isto. A viúva.
estrada nacional cento e vinte e dois. estacionei o carro na berma da estrada, carro que foi muitas vezes o altar da nossa paixão e da sua consumação. mudei-me para o banco de trás, para ficar ao teu lado. despertei-te, sacudindo-te o corpo. era já manhã. outros veículos, ligeiros e pesados, circulavam a velocidade alta e faziam-nos estremecer. tu mal acordada, quase despida, eu diante de ti. fiz-te a pergunta porquê? sem querer, menos ainda desejar, a resposta. eu já sabia porquê, não necessitava da tua confirmação. eu tinha visto tudo, eu tinha-te visto. porquê? serviu de pretexto. na verdade, quanto fiz a pergunta já sentia a cartilagem da tua traqueia a falir sob a pressão dos meus polegares. sabia que, como a culpa, a resposta não podia sair de ti. mas, mesmo assim, algo em mim sentiu necessidade de a exigir. as palavras costumavam aproximar-nos, fazer-nos íntimos. talvez tenha sido isto que me fez perguntar-te porquê?, a pergunta simultaneamente da acusação e da sentença. O Marquês.
2003/2024 - danados (personagens compostas e sofridas por © Sérgio Faria).