lizardo
és lesto a chorar salinger porque morreu. no entanto, se nunca desejaste imitar caulfield, choras o quê?, a literatura ou a vida? és cobarde. o luto é sempre por ti, tu que sobreviveste sem ser, sem seres capaz de ser quem não idolatravas. fingido. escreveste medo, uma introdução - não escreveste mas faz de conta que sim - desconhecendo o que é o centeio autêntico, sem o disparar em direcção à mão de um amigo, sem sofreres o remorso disso e continuares como se nada tivesse acontecido. há muito tempo que se sabe que ao pequeno almoço preferes pão de forma sem côdea, marca bimbo, torrado e barrado com manteiga light sem sal - dizes é por causa do colesterol, fiz análises. bimbo, estás a ver a coincidência?, porém muitas vezes compras de outra marca porque a bimbo é mais cara. és pobre em todos os sentidos. comes peixe, comes banana, sem imaginares o que seja a perfect day for bananafish. choras salinger por acaso, porque viste a notícia na televisão. mas a verdade é que não choras, limitas-te a revolver a miséria que há afundada dentro de ti, num exercício patológico de afirmação de uma identidade que não é tua. és cobarde, fingido e ignorante. não sabes quem é salinger, julgas apenas que fica bem a demonstração de comoção porque os beatniks ainda estão a morrer. os beatniks?, vai-te foder, pá. és um merdas. continua para aí agarrado à tua sobrevivência de parasita encostado à mama, subvencionado por conta do estado providência e da administração pública. és um coitado, sabes perfeitamente a tua condição - és incapaz de te olhares ao espelho -, e choras agora para tentar a redenção de quão coitado és? vai-te foder, pá. morre também. ninguém irá chorar-te porque salinger morreu ou porque lennon foi assassinado. és quem és, um merdas. a tua morte corresponderá à descarga de um autoclismo. a água que te há-de levar não será a das lágrimas. Edgar da Virgínia.