Le Bataclan Asylum, # iii. A dona do lupanar nunca consentiu a electrificação do estabelecimento. Argumentava que a iluminação eléctrica era fria e destoava da decoração carmim bas-fond. As meninas rimam melhor sob a luz das velas. O tom das chamas trémulas permitia que, ali, as almas se disfarçassem com maior facilidade e irradiassem encanto. A essa luz os homens são mais cegos, libertam a imaginação, vêem o que desejam ver. Uma das putas tinha uma cicatriz na face, mas a providência dos círios fazia-lhe uma beleza inverosímil, do que resultava ser uma das mais disputadas pelos clientes de primeira instância. Eles vêem o que desejam ver, não o que se vê, o que está diante dos olhos. Entretanto, lá em baixo, à porta do quarto redondo, estacionou-se uma sombra larga. Então?, já chegou a alguma conclusão? O detective quase ignorou essa presença estranha, embora o corpo que a fazia exalasse uma fragrância de lavanda forte. O espectáculo do apodrecimento da carne do cadáver havia soltado em si uma majestade de abutre. Que belo... Arrebatado, susteve a respiração. Também baixou os olhos, tentando livrar-se da sensação estranha que o dominava. Ao mesmo tempo que sentia a volúpia da carne pútrida, sentia uma felicidade infame a instalar-se-lhe no corpo. O que observava exercia um fascínio magnético sobre si. E era isso, mais do que o imperativo de tranquilidade ou de expiação da culpa, que o fazia desejar ficar só. Afaste-se!, não incomode!, necessito de solidão para desenvolver a investigação. Estava preenchido por um efeito simultâneo de exaltação e de penitência e não conseguia harmonizar-se consigo. Havia uma fraternidade interdita nos seus sentimentos que lhe exigia a entrega da alma, como se fosse ditada por um édito perpétuo e sem apelo. Por que é que não me responde? O cheiro intenso da decomposição do cadáver parecia-lhe mais doce do que fétido. Talvez por isso crescia-lhe e confirmava-se-lhe a necessidade de estar ali sem qualquer companhia, a absorver todo o quadro lúgubre que o envolvia. O Marquês.