Le Bataclan Asylum, # ii. Devido à falta de provas, o dossier da investigação permanecia aberto. Ora, segundo a superstição local, nenhum cadáver deveria calhar ao respectivo ataúde antes de as culpas estarem apuradas. Onde é que ele está? Através de uma janela percebeu que, atrás, no quintal, havia peças de lingerie agitadas no estendal da roupa. Pareciam espectros alados, sem corpo, animados pelo demónio, embora o demónio não tenha jurisdição sobre este tipo de paisagem bucólica. Ele já não é ele, é somente os seus vestígios. E os seus vestígios estão no quarto redondo, lá em baixo, na cave dos hóspedes. Desceu as escadas e entrou naquele círculo umbroso, rendez-vous de carne fétida. Não obstante as trevas, recusou a lanterna. De Prometeu não quero o fogo, quero o fígado. Sentia o corpo cansado, os ossos a latejar. As asas, apertadas sob o blazer, pesavam-lhe, como se tivesse sido derrubado sobre si o colégio de todas as suas culpas. Carregava o corpo opresso, como se posto num capítulo de sentença certa. Nenhuma esperança, nenhuma penitência. Apenas o ódio, o ódio aos sofridos e aos legisladores. Morte aos que cospem moral!, não a morte da espera, mas a morte dada, este pensamento sulcava em voz alta dentro da sua cabeça. Contemplou por instantes a agonia de um caranguejo que estava sobre a cómoda, no qual havia sido cravado um punção. Uma mancha líquida, muco das miudezas do crustáceo, alastrava e pingava sobre o chão. Que morram! Que morram os fiéis!, que morram os esperançosos!, que morram os caridosos! Apertou uma das pinças do caranguejo até sentir as cartilagens cederem. Esmagou aquela matéria na mão, cerrando brutalmente os dedos sobre ela. Lá para fora!, todos lá para fora! Afastou as criaturas de curiosidade necrófaga do quarto e começou a observar a cena, perscrutando entre as sombras indícios que lhe permitissem deslindar o caso. O Marquês.