Le Bataclan Asylum, # i. Sabes?, conhecia-o desde antes ele ser cadáver. As putas estavam no recobro. Lá fora, o vento revolvia as poucas folhas de nespereira caídas no chão. Era o prenúncio do outono. A luz já mais baça. O sol tépido, indolente. A monotonia das voltas e do ritmo dos corpo. Setembro é assim. E então ele não era melhor do que é hoje. Apenas por esse pormenor, e porque morto, o digo saudoso. Soavam murmúrios. Talvez fosse o ruído dos insectos em torno da carne, o festim da putrefacção. Talvez. Vencia a penumbra. O soalho rangia sob os passos. Notava-se uma película de pó a cobrir a cómoda. Passara algum tempo. Sim, talvez. Mas isso, agora, pouco importa. Quanto tempo?, muito?, pouco?, dias?, semanas?, meses? O carácter nunca foi propriedade que o tivesse abonado. Voltara o regime da cidade. Para além disso, a necessidade permanente de coordenadas obrigava a precisar o momento da ocorrência. Se havia caso, era fundamental encontrar resposta para a interrogação quando? Quando é que aconteceu?, quando é que aconteceu exactameente? Isso é um mistério. Por conveniência, ignorância ou temor, nenhuma das putas se constituiu testemunha capaz de esclarecer o que havia acontecido. A dúvida tornou-se administrativa. Morreu. O requiem, a oração de todas as mágoas por finados, demorou. E, enquanto demorou, repetiram-se lágrimas e lamentos, das putas e das outras, as carpideiras venturosas. Sim, morreu, mas temos que esperar a certificação do seu óbito. O Marquês.