In famiglia. Chegar atrasado a um almoço de família é algo que se tolera a quem seja diva ou ovelha negra. Seja como for, quem se atrasa merece sempre aquele olhar de soslaio reprovador e nunca falta uma voz que lhe sopra só agora?, pergunta que visa não tanto resposta quanto recriminar. Foi por expectar isto que, para garantir que se sentiria superior no momento da provável recriminação que sobre si iria pender - caso comparecesse ao conclave familiar agendado -, ele provou um quarto da tarte de maçã que descobriu na cozinha na madrugada anterior. O expediente resultou. A recriminação foi enfática e até reforçada por libelo maternal público. Todos ficaram a saber que a senhora sua mãezinha não levou o seu prometido contributo para a sobremesa porque o filho e a gula a que empresta o corpo lhe haviam consumido, sem qualquer autorização ou concessão prévia, parte de uma iguaria por ela confeccionada. Os outros, curiosos, quiseram saber o que não iriam comer. Ele, lesto, satisfez à sua curiosidade. E sentiu-lhes a inveja, dupla inveja. Ele não só já tinha comido parte da tarte de maçã como, depois, iria comer mais ainda. Portanto, ganho dobrado. Quando se é a diva ou a ovelha negra da família, não basta a má fama. É também necessário corresponder, amén, às expectativas de quem outorga tal fama. Segismundo.