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Albergue dos danados

Blog de maus e mal-dizer 

2006-02-01


Podem chamar o senhor Torquemada?, se faz favor. O funcionamento da décimasegunda comissão parlamentar, a comissão de Ética, já emprestou à evidência provas sobejas da sua desnecessidade. Daí que, perante o testemunho dos (ab)usos, ocasionalmente os senhores se sobressaltem, tentando emendar o desgraçado soneto. A propósito, segundo a edição de hoje do Público, começa assim um raciocínio da rapaziada do PSD: “violar a lei é grave, mas desrespeitar exigências éticas não é menos censurável”. E, vai daí, decorre o seguinte corolário: “a apreciação dos comportamentos dos titulares de cargos políticos não deve restringir-se ao respeito por aquilo que essas regras estabelecem, antes devendo alargar-se à avaliação do cumprimento estrito de regras de carácter ético”. Alcandorada neste juízo, segue-se a proposição de uma terapêutica desdita, que não assomaria sequer ao rés da lembrança do demónio, a criação de um conselho de ética e de conduta para avaliar e sancionar os comportamentos das senhores e dos senhores, a deputar ou a governar a pátria. Perante tal cenário, um liberal old fashion, no mínimo, eriça-se. A ética é função derivada da consciência moral de um sujeito. Na prática, a ética é o reduto dos motivos que fundam a auto-limitação dos actos de qualquer sujeito. Em Portugal, como é óbvio, isso não é alfobre de boas práticas. A maioria dos comportamentos não prima nem trambelho nem decência. Por isso existe a lei, para estabelecer limites ao impacto dos desatinos e das inconveniências. O problema é que por cá, na pátria, para além de não abundar o pudor, o Estado é um Estado de direito faz de conta. É isso o que é pior na intenção subjacente à proposta do PSD: os motivos por que é sugerida a criação de uma comissão de censura, um tribunal de vergonha. Pelo que, a ir por aí, por maus trilhos, preferível é, pois, que a arbitragem dos casos seja popular ou lapidar. Até porque, entre os gentios, é provável que a reserva de arremesso da primeira pedra não seja semelhante à da anedota evangélica. E, assim, talvez que o assunto se vá resolvendo a contento. Nicky Florentino.


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