Voto obrigatório. No que concerne à tão propalada e breve contenda eleitoral presidencial, um dos senhores candidatos incomoda mais do que qualquer um dos outros. O que menos perturba é o facto de, pelas estimativas publicitadas, ele ser a criatura mais provável como futuro senhor presidente da República, ainda que com vantagem tangencial sobre um limiar fictício estabelecido para aceder a tal honra - o famigerado mais do que cinquenta porcento. A quem lhe suportou um consulado governamental de dez anos e sobreviveu não assusta conseguir paciência para mais dois lustros, seja isso manifestamente desagradável, para uns, ou motivo grato e de satisfação, para outros. Incómodo, na circunstância, isso sim, é não ser recomendável nem a abstenção nem o voto imaculado, por ser isso proveito exclusivo para o tal fulano e, por conseguinte, aumentar a probabilidade da sua vitória eleitoral. Do que resulta que, seja-se pro ou contra o senhor Prof. Doutor Aníbal Cavaco Silva, o voto é necessário - modo disfarçado de o afirmar compulsivo. Por omissão ou acção, todas as almas recenseadas para fins eleitorais, na sua individualidade, contam e serão cúmplices do resultado que vier a ser apurado e anunciado na noite do próximo domingo. A culpa inalienável e diluída, condição da (ir)responsabilidade expressa sob a forma de abstenção ou voto, é uma das poucas constantes políticas no jogo a que se chama democracia. Na prática, ninguém é culpado. Mas há sempre alguém que aproveita. Está mal. E ainda bem. Pois pior seria se, com a alienada inocência, ninguém ganhasse. O desperdício nunca foi acto bom ou bonito, concerteza. Mas ser-se obrigado a votar com cruz, para além de tácita e inapelavelmente vincular quem vota a um resultado eleitoral - qualquer que ele seja -, é uma violência. Se não é mesmo uma ofensa clamorosa aos direitos, liberdades e garantias que se julga ter. É isso o que mais chateia. E, claro, dana. Nicky Florentino.