Captações in A Majestade do Xingu*
.......“É um pó branco. A aparência é inocente, mas o pajé não tem dúvida: ali está concentrada uma tremenda energia, uma energia superior à de todas as suas plantas, todas as suas rezas, todas as suas fumigações. E como sabe disso? Por causa da brancura, aquela implacável brancura. O pajé é obrigado a admitir: nunca viu algo tão branco. A lua não é tão branca quanto esse pó, as nuvens não são tão brancas quanto esse pó. A carne de peixe (e de peixe o pajé gosta muito, pagam-lhe em peixe muitas curas, peixinhos pequenos no caso de doenças pouco graves, peixes grandes quando recupera moribundos, e há um enorme peixe, capaz até de engolir uma pessoa, reservado para o grande milagre que ainda fará, ressuscitando um morto) não é tão branca. Nem o homem branco é tão branco, porque os brancos na verdade não são brancos, uns são brancos, outros são mulatos, e Noel, a pele de Noel é rosada. O branco do olho talvez seja quase tão branco quanto esse pó - mas quem dá importância ao branco do olho? Para o pajé, o branco do olho nada diz, a não ser quando se tinge de amarelo, o que é mau sinal, sinal de doença grave”.
* Scliar, Moacyr (1997/2000), A Majestade do Xingu, Lisboa, Editorial Caminho, p. 136.