Captações, xxvii. N’The Satanic Verses.
000“Quando chegam ao nível dos telhados Gibreel percebe que as ruas estão cheias de gente. Seres humanos tão densamente apinhados naqueles caminhos sinuosos que se fundiram já numa entidade maior, compósita, implacável, serpentiforme. O povo avança lentamente, a um ritmo regular, de becos em azinhagas, de azinhagas em travessas, de travessas em ladeiras, convergindo todo para a grande avenida de doze faixas de largura, ladeada de eucaliptos gigantes, que conduz às portas do palácio. A avenida está saturada de homens e mulheres; é o órgão central do novo ser de mil cabeças. Em fileiras de setenta ou mais pessoas lado a lado, o povo avança gravemente para os portões da Imperatriz. Diante dos quais os guardas do palácio estão à espera em três filas, deitados, de joelhos e em pé, com as metralhadoras a postos. O povo sobe a encosta em direcção às espingardas; setenta seres humanos de cada vez chegam ao alcance da linha de tiro; as armas matraqueiam e eles morrem, e depois os setenta seguintes passam por cima dos corpos dos mortos, as armas soltam nova gargalhada, e a colina dos mortos aumenta. Os que vêm de trás começas, por seu turno, a subi-la. Nas soleiras sombrias das casas da cidade, há mães de cabeças cobertas, impelindo os filhos queridos para a parada, vai, sê mártir, faz o que é preciso, morre. «Vê só como eles me amam», diz a voz incorpórea. «Não há tirania no mundo que possa resistir à força deste amor lento e em marcha»”. Segismundo.