Programa de gestos para uma dor tangível. Abre as mãos. Estende-as. Entrega-as à sua frente. Com elas sonda o vazio. Apalpa a sensação estranha de nada. E nelas, nas mãos, decide acolher o inefável que paira. Acolhe as dores, as dores que passam à sua frente. São as dores dos outros. As únicas para as quais as mãos, se estendidas e abertas, guardam sensibilidade suficiente. Depois cerra as mãos. E nelas transcorre um fulgor que jamais se deseja largar. Às vezes esse fulgor cresce. Cresce para sempre, para ser vício e costume. Cresce tanto que nele se descobre o sangue. O sangue de uma aliança, de um cálice, de um vaso. E dos outros, apenas deles, é o sacrifício de onde promana esse sangue, forma líquida da dor. O Marquês.