Perguntou-se ele sobre o tipo de criatura a quem concederia crédito pelas respectivas palavras ou acções. Pensou pouco. Pensou lento. Talvez a quem carrega botijas de gás butano, foi o que pensou. Pensou um pouco mais, mas não tanto que deixasse de ser pouco o que pensou. Não há gente desta em Lisboa, pois não?, inquietou-se. Não. Então não pode ser, assim arrumou ele o pensamento, pensando para consigo. E continuou como antes, a suspeitar de todos. Pois do pouco que um dia ele pensou mais demoradamente fez-se-lhe juízo que a confiança é um engano que se deve evitar. Por defeito, entendem uns. Por virtude, entendem os que entendem. As coisas são simples. O que se sabe, sabe-se. Por aqui, por se saber, está dispensada a confiança. O que não se sabe, não se sabe. E, por aqui, pode confiar-se. Porém, é um risco confiar. Podem as coisas, sempre, não ser como são confiadas. E antes não há como saber se assim é. Apenas depois é que se sabe isso. E depois, quando é de não confiar antes, é sempre tarde. É o tempo em que já dói. E se há que doer, que doa aos outros. Ele, embora pouco, assim pensou. O Marquês e Segismundo.