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Albergue dos danados

Blog de maus e mal-dizer 

2003-08-30


O espesso Expresso tornou à vanguarda da estupidez, sob a certa batuta do senhor arq.º que nos editoriais escreve parágrafos de uma frase só. Na capa, o alerta, ai, ai, ui, ui, a rubicundo tom, "Metade das notas tem droga". É lá. Mas, adiante. Primeiro zoom para os pormenores, ainda na capa, a negro, "mais de 45% das notas que circulam em Lisboa apresentam vestígios de cocaína". É o quê?, quase metade?, em Lisboa?, bom... Segundo zoom para os pormenores, já na página treze, também a negro, "metade das notas que circulam na zona ribeirinha de Lisboa contém vestígios de cocaína. É o quê?, só na zona ribeirinha de Lisboa?, ã... Time out.
Seja lá o que for, a peça publicitada pelo espesso Expresso é uma autêntica merda. Como a dita, sem pés ou cabeça. Não sei como foi, mas imagino a sua concepção. Concerteza, uma rapaziada lá da redacção armou-se em inspector francisco esperto. Assoou-se, lavou as mãos - é o mínimo que a higiene e o rigor metodológico exigem -, calçou umas luvas de cirurgião, finas, e meteu-se ao sacrifício de cirandar por restaurantes, bares e discotecas in, por acaso junto à margem do Tejo, e por um supermercado do centro da cidade, algures entre a Almirante Reis e, sei lá, o Chiado ou o Colombo. Os missionários retiveram apenas espécimes de cinco e dez euros. Não nas algibeiras, mas em envelopes, o continente adequado ou quase para este tipo de matérias. Depois um laboratório da Europa, algures entre o Cabo da Roca - os Açores não entram nesta geografia - e os Urais, analisou a remessa. Quantas notas foram mandadas para análise?, isso é informação irrelevante. Umas quantas é quanto basta saber-se. A pesquisa foi apurada, certinha e direitinha. E o que é que se veio a saber? Que, como já foi referido, quase metade das notas recolhidas, mais de quarenta e cinco por cento, apresentavam vestígios de cocaína. Ou seja, ... Qualquer besta, no sentido ruminante do termo, percebe que isto não tem puto de fundamento ou coisa que lhe seja próxima. Mas lá que tem a aparência de ciência é verdade. Aliás, a aparência de ciência é tudo quanto a manipulada experiência tem de ciência. O resto são delírios. Ou alucinações. Ou lapsos metodológicos. Ou apenas tontice. Tão pura quanto a cocaína de melhor estirpe. E tão evidente quanto a manchete que o espesso Expresso, hoje, traz estampada na fronha. Nicky Florentino e Segismundo.


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